Sustentabilidade para as empresas: Diabo ou Anjo?
O desafio atual é transformar a comunicação de sustentabilidade de um "diabo" que pode corroer a confiança, num "anjo" que fortalece a reputação e agrega valor.
Imaginemos este cenário, acordo de manhã, vou lavar os dentes e uso um copo em vez de deixar a agua a correr: faço um post a dizer que estou a lavar os dentes usando um copo – de seguida vou à cozinha e bebo um sumo de laranja colocando a embalagem no caixote amarelo: coloco um post a dizer que fiz reciclagem – visto-me com um vestido de algodão orgânico: post com o acontecimento – sigo para o trabalho num carro elétrico: post do sucedido – chego e subo as escadas em vez de usar o elevador: mais um post… Podia continuar mas penso que é suficiente para passar a ideia de que um fluxo de comunicação como este seria arrasador para a reputação de qualquer pessoa. No entanto, a maior parte da comunicação de sustentabilidade das empresas é isto mesmo – irrelevante e, convenhamos, em alguns casos contraproducente.
Todos sabemos que, nos últimos anos, a sustentabilidade emergiu como uma palavra de ordem para marcas e empresas em todo o mundo. A busca por práticas empresariais mais responsáveis e amigas do ambiente tem sido uma resposta não apenas às crescentes preocupações com as mudanças climáticas, mas também a uma exigência cada vez maior por parte dos consumidores que procuram alinhar as suas escolhas de consumo com os seus valores pessoais. No entanto, à medida que essa tendência ganha força, surge um dilema significativo: até que ponto é a sustentabilidade mesmo importante para as organizações – como diferenciar uma empresa que encara o tema com seriedade e numa perspetiva completamente transformacional vs a que está apenas a surfar a onda?
Um recente estudo do Chartered Institute of Marketing (CIM) lança luz sobre a complexidade desse desafio. Surpreendentemente, quase metade dos profissionais de gestão (49%) mostraram-se hesitantes em relação a projetos de sustentabilidade, temendo serem acusados de “greenwashing” – a prática de afirmar falsos compromissos sustentáveis para obter uma imagem positiva. A era da informação trouxe consigo consumidores mais informados e críticos, capazes de identificar a diferença entre ações autênticas e promessas vazias. Essa desconfiança é, portanto, uma chamada de alerta para as marcas: e empresas: a sustentabilidade tem de ser mais do que uma simples estratégia de marketing.
Por outro lado, essa desconfiança não invalida a crescente procura dos consumidores por informações claras sobre práticas sustentáveis. O estudo revela que dois terços dos consumidores (63%) esperam que as empresas comuniquem mais sobre seus produtos e serviços sustentáveis. Aqui reside o potencial benéfico da comunicação de sustentabilidade. Quando feita de maneira autêntica, transparente e apoiada por ações concretas, pode ser um “anjo” para as marcas, impulsionando a confiança do consumidor e a sua reputação.
No entanto, os desafios persistem. Os profissionais de marketing enfrentam uma pressão considerável (45%) para comunicar a sustentabilidade, mas apenas uma minoria (40%) afirma que suas empresas têm objetivos sustentáveis bem definidos. Isto revela uma desconexão preocupante entre a procura de sustentabilidade e a implementação real de práticas verdes.
E aqui entra o Sustainability Gap Index Report da Brand Finance. O relatório destaca que algumas marcas portuguesas, como a EDP, o Millennium BCP e a Caixa Geral de Depósitos, têm uma oportunidade significativa de valorização por meio de uma comunicação mais eficaz sobre sustentabilidade. Isso indica um cenário no qual os consumidores percebem essas marcas como mais sustentáveis do que realmente são. Isso é tanto uma oportunidade quanto um lembrete da importância de alinhar a perceção pública com as ações reais.
Além disso, o índice revelou que muitas das maiores marcas globais estão em risco financeiro se as perceções de sustentabilidade não se alinharem com o desempenho real de ESG. Esse dado salienta a relevância de ações ESG genuínas e de uma comunicação sólida, já que milhões de dólares de valor financeiro estão em questão.
O desafio atual é transformar a comunicação de sustentabilidade de um “diabo” que pode corroer a confiança, num “anjo” que fortalece a reputação e agrega valor. Para isso, as empresas devem trilhar o caminho da autenticidade, garantindo que as suas práticas sustentáveis são sólidas e a sua comunicação transparente. Desta forma, a comunicação de sustentabilidade pode ser a força motriz de uma mudança real e positiva, tanto para as marcas quanto para o planeta.
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