À Mariana, ao Diogo e ao Nuno, a perspetiva de um cliente

  • Catarina Barradas
  • 28 Novembro 2023

Marcas como a EDP seriam “chacinadas” na praça pública se fizessem ajustes diretos. A única saída para nós e, imagino que para todos os clientes com alguma dimensão, são os concursos.

Escolher uma agência não é tarefa fácil.
Começo por colocar o dedo na ferida – quando feito de uma forma séria, abrir um concurso para seleção de uma agência criativa de cada vez que queremos lançar um projeto relevante é um processo complexo, moroso e que envolve esforço e recursos do lado do cliente. É por isso que, por vezes, existe a tentação de optar pela permanência, pela “inércia” de enfrentar o processo dos concursos. Portanto, defender o fim dos concursos seria o caminho mais fácil para os clientes: olhava-se para a lista de agências com trabalho idealmente premiado, alguém da equipa conhecia um criativo de lá que diz que o ambiente é ótimo e que têm ideias fabulosas, fazia-se um telefonema e a agência estava escolhida.

O concurso garante idoneidade no processo de seleção.
Num mercado da dimensão de Portugal, marcas como a EDP seriam “chacinadas” na praça pública se fizessem ajustes diretos. O compliance não nos permite e nós também achamos que não é a forma ética de gerir estes processos. Portanto, Diogo, a única saída para nós e, imagino que para todos os clientes com alguma dimensão, são os concursos.

Concursos que, se para as agências são um martírio pela necessidade de alocação de recursos para um final que pode ser nada, para as equipas de marketing são um processo igualmente desgastante.
Primeiro, a construção de um briefing requer uma estratégia de marca, do produto ou do serviço bem definida, uma análise exaustiva do setor e do negócio. Um briefing bem feito exige do cliente muitas horas das equipas. Investe-se em dar a maior quantidade de informação possível, o melhor enquadramento, em partilhar os desafios, as dúvidas e as mensagens-chave. É um momento intenso. Acumula-se o trabalho diário e pára-se obrigatoriamente para se olhar para dentro e para o futuro.

Um bom concurso exige critérios de avaliação bem definidos, a ponderação sobre o que é verdadeiramente importante para termos o melhor produto final.

Depois, segue-se a análise das agências. Chegam as propostas e inicia-se todo um trabalho exaustivo de análise das propostas e auscultação das pessoas envolvidas. A escolha nunca é simples, porque determinada agência acertou na análise estratégica, mas falhou na resposta criativa, outra terá acertado em alguma da criatividade, mas falhou num outro critério fundamental. Começa o debate interno.

Escolher a agência nunca é fácil. Exige respeito.
A fragilidade dos concursos é esta. É difícil uma agência acertar quando mal conhece o cliente, mas aqui entra ou deveria entrar a maturidade do cliente: entender as fragilidades e escolher a agência que se empenhou em conhecer o setor, o mercado, e que apresenta uma equipa motivada e com flexibilidade para aceitar que o que apresenta é só uma possibilidade para uma parceria futura. O início de uma relação é assim, muita química inicial e esperança que o alinhamento aconteça.

Depois, é necessária ética por parte do cliente. As ideias são o maior ativo das agências e não são para ser tratadas levianamente. Primeiro, jamais escolher uma agência e exigir a adaptação da proposta a uma ideia de outra agência. Eu sigo ainda outro critério: o orçamento não deveria nunca ser eliminatório à partida. Se há algo diferenciador na proposta, então negoceie-se.

Os concursos, eu diria, são a forma mais justa de se escolher uma agência.
A escolha direta de uma agência afunila o mercado e tira a oportunidade a agências emergentes, com pouco portfólio de trabalhos, qualquer hipótese de se mostrarem e vingarem. Eu entendo a frustração de quem concorre, dedica todo o tempo e recursos, e no final perde. Entendo, mas não vejo outro caminho a não ser concursos.

Gostava de ver concursos mais sérios.
Seriedade no briefing, na escolha das agências seja em quantidade (entre três e/ou quatro, conforme o tipo de concurso) seja em adequação ao briefing. Seriedade nos critérios de avaliação e, conforme o grau de exigência e faturação envolvida, a introdução de um fee de rejeição.

Afinal, é o momento inicial de uma relação que se quer de cumplicidade, entendimento e crescimento. O sucesso de uma marca faz-se na relação construtiva entre o cliente e agência, idealmente sem os egos à mistura nem agendas pessoais. O primeiro impacto marca para sempre. Ou seja, concursos sim, mas com respeito por aqueles que sem os quais, nós os clientes, não teríamos as marcas que temos.

  • Catarina Barradas
  • Diretora global de marca da EDP

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