Comunicação

Campanha sai à rua: depois dos debates, as arruadas

Carla Borges Ferreira,

Nas próximas dias semanas os candidatos deixam o horário nobre das televisões e confrontam-se com os eleitores. A conquista dos indecisos vai ser prioridade dos dois líderes.

Debate Legislativas 2024 - Pedro Nuno Santos vs Luís Montenegro - 19FEV24
Debate Legislativas 2024 – Pedro Nuno Santos vs Luís MontenegroHugo Amaral/ECO

No dia 19, mais de 2,65 milhões de telespectadores assistiram ao frente-a-frente entre Pedro Nuno Santos e Luís Montenegro, transmitido pelos três canais generalistas e também pelos três canais de informação. Agora, findas as duas semanas de debates e com as campanhas a sair para a estrada, de acordo com os politólogos ouvidos pelo ECO o secretário-geral do PS e o líder da Aliança Democrática estão empatados.

Entre profissionais de comunicação, contudo, Luís Montenegro marcou pontos nas últimas semanas, eventualmente também porque as expectativas eram mais baixas. Aliás, Montenegro foi o líder que conseguiu juntar a maior audiência nas duas semanas de debates que marcaram a agenda política no pré arranque da campanha. De acordo com a análise elaborada pela Dentsu/Carat para o +M, o candidato a primeiro-ministro pelo PSD, CDS e PPM teve uma audiência acumulada de 8,2 milhões de espectadores, mais 168,3 mil do que o secretário-geral do PS. Os debates de Luís Montenegro foram também os que tiveram o maior número de transmissões: 21 versus as 20 de Pedro Nuno Santos.

Para o CEO da JLM&A, as semanas de debates trouxeram duas surpresas, uma positiva e outra negativa. A positiva é Luís Montenegro e a negativa o secretário-geral do PS. “Havia a expectativa, com base em dados porventura subjetivos, de que Pedro Nuno Santos seria uma pessoa com um conjunto de características que o colocavam em vantagem”, explica Vítor Cunha, referindo-se ao carisma, à capacidade de liderança e conhecimento dos temas, “que não se revelaram suficientes”. Luís Montenegro, apesar de “partir de uma situação mais débil e ser menos carismático” revelou, acredita o responsável, “maior estabilidade emocional e segurança nos temas”. E, prossegue, “apesar das dificuldades, como o ‘terramoto’ na Madeira, manteve a serenidade necessária para dar a volta”.

No mesmo sentido, dando notas à prestação nos debates, Bruno Batista, chairman do GCI Media Group, daria um 14 a Luís Montenegro e um 13 a Pedro Nuno. “O primeiro fez um percurso notável ao nível da empatia, da forma como comunica e como mostra preocupação em dar respostas às necessidades dos portugueses. Evolui bastante desde o Montenegro líder da oposição de Costa, até a como nos debates deixou de lado as tricas, os piropos, e mostrou sempre uma certa postura de estadista”, refere, apontado como excepção o debate precisamente frente a Pedro Nuno Santos, “onde Montenegro derrapou”.

É fundamental saírem da bolha que é Lisboa e Porto e conhecerem a realidade do país, o pensamento do eleitor, o ouvir das queixas/dos problemas do Portugal real.

Bruno Batista

Chairman do GCI Media Group

Pelo contrário, o secretário-geral do PS “mostrou-se igual a si próprio e um pouco oco”. “Foi tão mais grave quando no debate com o líder da IL questionou o que estava mal no país. A imagem que passou foi a de um candidato que não vive(rá) no mesmo país que os eleitores do próximo dia 10 de março”, diz Bruno Batista, que fez a recente campanha de José Manuel Bolieiro, no Açores.

O dono do GCI Media Group começa, na estratégia do PS, por criticar o slogan “Mais ação.” “Ao colocar o ponto final, deixa-me a pensar se, caso forme governo, os seus ministros, que deverão ser algumas das figuras que o acompanharam ao longo dos últimos anos, irão agora tomar suplementos energéticos”, comenta.

Com a campanha na rua, o foco nas próximas duas semanas estará nos indecisos e a sugestão é que os candidatos cheguem ao país real. “É fundamental saírem da bolha que é Lisboa e Porto e conhecerem a realidade do país, o pensamento do eleitor, o ouvir das queixas/dos problemas do Portugal real, dos portugueses cujos filhos tiveram de emigrar, dos portugueses que têm de andar kms para uma consulta ou exame médico. O Portugal profundo que ainda não se decidiu a quem irá dar o seu voto. Além disso, as arruadas permitem aos eleitores conhecerem mais de perto os candidatos a deputados”, defende Bruno Batista, para quem estes momentos de campanha ainda “fazem todo o sentido”.

Não consigo medir a importância ao final do dia [das arruadas]. Não sei se faz mover no ponteiro dos indecisos ou confirmar os crentes. Mas ser confrontados com os dramas e não viver em mundos abstratos é um bom exercício.

Vítor Cunha

CEO da JLM&A

Para o CEO da JLM&A, estas têm um grande mérito: “Indo aos locais, os candidatos são forçados a responder quando interpelados. Na rua, e já que essas perguntas não têm resposta nos debates, vão ter que responder como fazem para correr bem e dizer porque é que correu mal”, antecipa, lembrando que todos os passos vão ser cobertos pela comunicação social e que todos os momentos são pensados para aparecer na televisão. “Não consigo medir a importância ao final do dia [das arruadas]. Não sei se faz mover no ponteiro dos indecisos ou confirmar os crentes. Mas ser confrontados com os dramas e não viver em mundos abstratos é um bom exercício”, aponta, lembrando que “quando temos a saúde como temos, a educação, a habitação… o clima, o tema da demografia ou a sustentabilidade da segurança social deviam ser temas mais importantes do que a cor da gravata. Mas a política é o que é”, constata.

As opções que temos neste momento são Montenegro e Pedro Nuno Santos. Como seria se a discussão fosse entre Centeno e Montenegro?”, interroga Vítor Cunha, atribuindo a “uma certa impreparação, fruto do acelerado da agenda”, os erros a que se vai assistindo em termos de comunicação. “É uma campanha fora de tempo, ninguém estava à espera. Por essa razão, também não tenha tido a preparação que nos tempos normais teria”, resume.

“A ERC deveria estar atenta a todos os meios, tradicionais e digitais, e exigir maior transparência nas sondagens”

Ao contrário das últimas legislativas, nas quais António Costa trabalhou com o consultor Luís Paixão Martins, e até das eleições internas do partido, nas quais Pedro Nuno Santos contou com o publicitário e consultor de comunicação João Gomes de Almeida, para as legislativas o PS optou pela máquina interna, não oficializando a contratação de nenhuma agência ou consultor de comunicação.

Do outro lado está António Cunha Vaz, fundador da CV&A, agora H/Advisors CV&A. “Estou a trabalhar com o PSD, integrado na campanha da AD. A campanha tem várias áreas de competência. As de estratégia de design e merchandising (imagem gráfica e suas aplicações), por exemplo, não estão nas nossas competências. Outras, como o research, preparação de dados, aconselhamento em comunicação e seguimento dos debates, sim”, concretiza.

Para António Cunha Vaz, que não fala de questões estratégicas, táticas ou até do principal opositor – pelo menos diretamente – o candidato para o qual trabalha “tem larga experiência política e nenhum ónus de decisões precipitadas ou de ziguezagues conforme as ocasiões. Tem o que gostamos: seriedade, constância, ambição de construir um país mais justo, com uma economia distributiva, com respeito por todos, com política de atração de imigração com dignidade mas controlada e que respeite a nossa cultura, uma política de educação, de saúde e de habitação claras e sem complexos ideológicos, preocupação com a cultura, transição digital, a igualdade de género e, por último, mas não menos importante, uma clara exclusão de extremismos fáceis, homofóbicos, racistas ou xenófobos”, descreve quando questionado sobre os desafios acrescidos do PSD nestas eleições, na quais, tal como o PS, tem um candidato estreante neste papel.

A escalada da desinformação, e as sondagens – que impactam o sentido de voto – são uma preocupação para António Cunha Vaz. “A ERC deveria estar atenta a todos os meios, tradicionais e digitais. Devia exigir maior transparência nas sondagens e obrigar a que estas empresas divulgassem quem são os donos. Tal como as agências de comunicação deveriam ser escrutinadas e certos partidos políticos como o Chega deveriam ser responsabilizados pela difusão de informações falsas”, defende António Cunha Vaz.

“Por exemplo, comparar sondagens por telemóvel com presenciais, amostras de 2500 pessoas com outras de 400 e apresentar tudo como se a mesma realidade retratasse é enganar os portugueses. Para não falar das sondagens falsas que circulam nas redes sociais”, atira o fundador da CV&A.

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