Ainda acredita que a fidelização é uma estratégia de crescimento?
Em teoria, há duas formas de fazer crescer o número de clientes. A primeira é angariar novos. A segunda é diminuir a velocidade a que perdemos os atuais.
Todos os anos são gastos milhões de euros em Portugal em programas de fidelização que têm como objetivo fazer crescer os resultados. Geralmente sem resultados. Infelizmente, a fidelização de clientes é um caminho pouco eficaz para o crescimento.
Para aumentarem os resultados, as marcas precisam de crescer. E, para crescer, precisam de mais clientes. Em teoria, há duas formas de fazer crescer o número de clientes. A primeira é angariar novos. A segunda é diminuir a velocidade a que perdemos os atuais. Se a segunda for mais barata do que a primeira, então isso terá impacto nas decisões estratégicas a tomar.
Uma ideia fantasiosa e perigosa…
Qualquer pesquisa na internet nos diz que reter clientes é mais barato do que angariar novos. Para ser mais preciso, a teoria comum é que é cinco a sete vezes mais barato reter um cliente do que encontrar um novo. O único senão é que isto é uma fantasia perigosa, que não tem nada a ver com factos. Na realidade, não existe nenhum estudo – que apresente dados – que chegue à conclusão de que é mais barato reter do que angariar clientes.
Byron Sharp, no livro “How brands grow”, refere que este mito nasceu a partir de um artigo na Harvard Business Review, de 1990. Apesar de se ter tornado mundialmente famoso, o artigo – “Zero defections: quality comes to services” – é uma pura fantasia. Não tem quaisquer dados que comprovem a teoria que defende, é enganador e tem erros grosseiros de aritmética básica. A principal conclusão do artigo é que as empresas podem aumentar os lucros em 100% se diminuírem a taxa de abandono em 5%. Mas os 5% são, na realidade, uma queda de cinco pontos percentuais – de 10% para 5%, ou seja, de 50%. Como um artigo tão enganador e com erros tão gritantes se tornou parte da cultura popular do marketing é um mistério.
… que os dados desmentem
Na realidade, a evidência diz que a taxa de abandono de clientes é uma função (inversa) do tamanho das marcas. Quanto maior for a marca, menor será a percentagem de abandono. É uma espécie de lei da gravidade do marketing, que dificilmente pode ser contornada e que se repete em todos os mercados e com todas as marcas.
O outro fator que afeta esta taxa é o setor a que as marcas pertencem, já que as taxas de abandono costumam ser semelhantes em cada indústria. Ou seja todos os bancos perdem clientes mais ou menos ao mesmo ritmo, da mesma forma que todas as operadoras telefónicas também perdem clientes com mais ou menos mesma cadência.
Mas, mesmo que fosse possível alterar esta espécie de lei da gravidade, será que os ganhos com retenção seriam assim tão melhores do que os ganhos com a aquisição dos novos clientes?
Byron Sharp dá-nos a resposta com dados reais para o mercado automóvel no Reino Unido.
Podemos verificar que as taxas de perda de clientes não são radicalmente diferentes da média do setor – 49% – e que, como esperado, as marcas maiores têm taxas de perda de clientes inferiores. A Ford, que é a maior marca, com 27% de penetração, é também, sem surpresas, a marca com a menor taxa de perda de clientes (31%). Mas aqui é muito importante perceber que a Ford é marca com menor taxa (percentual) de perda de clientes porque é a maior marca e não o contrário.
Mas vamos a contas. O que os dados nos dizem é que, no mercado britânico, as marcas fazem cerca de metade das suas vendas a clientes atuais e a outra metade a clientes novos.
Se a Toyota diminuísse a taxa de perda de clientes para zero (ou subisse a taxa de retenção para 100%), então ganhava mais 50% em vendas, o que equivale a 1% de quota de mercado.
Com uma estratégia de 100% de retenção, o máximo que a Toyota consegue ganhar é 1% de quota de mercado. Mas, todos os anos, há 50% do mercado para ganhar. Ou seja, 50% de quota de mercado é o máximo que a Toyota pode ganhar através de melhorias na aquisição de novos clientes. Resumindo, a estratégia de aquisição tem 50 vezes mais potencial do que a retenção.
Acreditar que se consegue reduzir a taxa de perda de clientes para zero é tão delirante como crer que se vai conquistar todo o mercado que muda de marca num ano. Mas, se é para sonhar, ao menos que sonhemos com o cenário de aquisição, que é 50 vezes melhor.
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