A marca de cada um

  • Vitor Cunha
  • 5 Abril 2024

A quem interessa realmente a tinta que se gasta, a energia perdida, a discussão acalorada? Este episódio revela, uma vez mais, a distância enorme que persiste entre o povo e algumas elites.

Esta discussão em curso sobre a imagem do governo é mais estéril que a Cabeça da Velha (Serra da Estrela).

Factos:

  • O governo anterior decidiu alterar o logo do governo e resolveu estendê-lo à República;
  • Na altura houve uma reação forte nas redes sociais e críticas ao preço;
  • O líder da oposição prometeu reverter a decisão quando fosse governo;
  • O novo primeiro-ministro cumpriu a palavra do líder da oposição e mudou o dito logo;
  • Agora há, de novo, uma forte reação nas redes e entre comentadores contra a decisão.

O cálculo do valor das marcas é exercício interessante, mas, convenhamos, a marca Portugal não é refrigerante ou smartphone. Acredito que a simbologia tradicional agora recuperada seja mais reconhecida pela maioria dos portugueses e mais identitária, ao mesmo tempo que deverá ser mais facilmente identificada por não-nacionais. Esta suposição empírica não prejudica o exercício oposto: a solução revertida, a fonte exclusiva, passam uma ideia de mudança conservadora. E como em todas as mudanças nas marcas exige tempo para absorção.

Dito isto: a quem interessa realmente a tinta que se gasta, a energia perdida, a discussão acalorada?

Sei a quem não interessa.

Este episódio revela, uma vez mais, a distância enorme que persiste entre o povo e algumas elites.

A AT comunicou nesta semana que, em 2022, 5.807.704 agregados familiares entregaram declaração de IRS. Destes, apenas 5409 obtiveram um total de rendimento bruto superior a 250 mil euros. A imprensa mal editada pareceu chocada com a revelação extraordinária: mais pobres do que revela o seu IRS.

Para 42,4% dos agregados familiares não foi apurado qualquer valor. Ou seja, são indigentes, muito indigentes.

Eu não gosto de pagar impostos, como não gosto de fazer anos. Mas pagar muitos impostos e continuar a fazer anos são ótimos sinais. Mau, mesmo mau, é pertencer ao grupo dos 42,4% de portugueses que não pagam porque não ganham. Aposto que, destes, a sua maioria ainda não se apercebeu da discussão sobre o marketing governamental e sobre a sofisticação da não-mudança, sobre o valor simbólico da alternativa.

A pobreza sempre gerou pobreza e a pobreza de espírito também.

  • Vitor Cunha
  • CEO da JLM & Associados

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