E que tal discutir o modelo de negócio dos media?

  • Mário São Vicente
  • 7 Fevereiro 2024

A culpa, com todas as letras, é nossa. Os jornalistas e a liberdade de imprensa defendem-nos dos regimes autoritários. E não é o Estado que os deve suportar e ajudar a manter. Somos nós. Todos.

A forma como tem sido feita a discussão sobre a crise nos media não deixa de me espantar. Fala-se no drama da falta de leitores, nas dificuldades de subsistência dos jornalistas, devido quer à precariedade quer aos baixos salários, da falta de independência, da falta de recursos para investigação, da falta de tempo, do excesso de trabalho, etc, etc. Tudo isto é verdade, mas parece que os problemas se esgotam dentro da redação e na relação entre a redação e os leitores/espectadores/ouvintes. E não esgota.

Alimentado pela dramática gestão da Global Media e pela amplificação dada pelo Congresso dos Jornalistas, o tema saltou dos corredores dos jornais e passou para a praça pública. Depois de tanta discussão é impossível que exista algum português vivo que não tenha percebido que temos um problema. Um problema grave, que pode afetar a forma como vivemos e mudar até o regime democrático. Ninguém no seu juízo perfeito pode achar que poderemos ter democracia e liberdade sem jornalistas e sem a independência dos mesmos. Não podemos. E o problema não é dos jornais e dos jornalistas. É nosso. Da sociedade. É um erro que nos vai sair caro, tão caro que será impossível de pagar.

O que me choca, é a total ausência de discussão sobre o modelo de negócio dos media e o papel das marcas e investidores publicitários, das agências de publicidade e de comunicação, das agências de compra de espaço e de planeamento de media na sua resolução, ou pelo menos na sua definição.

Esta crise não começou agora. Começou no final dos anos 90 com a redução do valor percebido dos profissionais de comunicação. E a culpa, com todas as letras, é nossa. Nossa, dos investidores publicitários que, numa lógica pura de rentabilização de investimento deixaram de fazer, também, escolhas qualitativas. Nossa, dos profissionais das agências de publicidade, que nos anos 80 do século passado cobravam por uma hora de trabalho mais do que qualquer consultora de negócios e que hoje cobram 20 x menos. Nossa, dos planeadores de media e grandes conglomerados de compra de espaço, que foram matando, dia após dia a sua galinha dos ovos de ouro, passando todo o poder, e sem espernear muito, para as tecnológicas, que nunca remuneraram de forma decente e justa o valor criado pelos conteúdos produzidos pelos grupos de comunicação social.

Os jornalistas e a liberdade de imprensa defendem-nos dos regimes autoritários. E não é o Estado que os deve suportar e ajudar a manter. Somos nós. Todos.

  • Mário São Vicente
  • diretor de Relações Institucionais e Responsabilidade Social da Fidelidade

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