Lembram-se do José Manuel Garcia Marques Severino?

  • Nuno Antunes
  • 11:40

Confesso que isto é entusiasmante e já ia para aqui embalado para vos falar da chamada Agentic AI. Tinha era que meter mais doçaria ao barulho.

Lembram-se do José Manuel Garcia Marques Severino?

Não estão a ver quem é, pois não? E se vos disser que era pasteleiro, já ajuda? Talvez não e até entendo. E com a famosa frase proferida pelo dito “…eu é mais bolos, não é…”, já chegaram a alguma conclusão? Para os que ainda não, é melhor acabar já com o sofrimento e assim remato ao dizer que é umas das personagens mais emblemáticas criadas pelo Herman.

Tanta letra só para dizer que, enquanto torro na toalha e oiço os homens das bolas de berlim em périplo constante, lembrei-me de escrever uma coisa levezinha, com bolos, lá está. Mistura na Bimby, o fenómeno digital e a Sociedade da Informação em que vivemos, dominada agora pelas conversas sobre a inteligência artificial (IA), e a sua relação com a forma como comunicamos. Sei que já leram sobre isto vezes sem conta, mas como vamos ter pastelaria aqui pelo meio, pode ser que vos abra o apetite.

Correndo o risco de ser muito simplista, aqui vai o meu olhar para esta evolução:

Fase 1: “A Cereja no topo do bolo”, em linguagem publicitária “Nice to Have”

Aqui, o bolo era um qualquer e as capacidades digitais estavam lá só para dar aquele toque, um ornamento, portanto. Como se fosse uma decoração bonita no doce, no entanto, inútil.

Na altura, marketing era sobre lançar anúncios na TV e debitar informação sem pensar em como ela se conectava com o resto do mundo. Depois, era só declinar (se soubessem o que gosto desta palavra) a ideia para os canais digitais.

E a IA? Na altura, e para o comum dos Lusitanos, significava Imposto Automóvel ou outra coisa qualquer. Nem sequer sonhávamos com ela no Marketing. Nem nós, nem ninguém em qualquer outra geografia, apesar de já não ser coisa nova. Já vinha da cabeça brilhante do Alan Turing, no final dos anos 40, vejam lá bem. Depois, o John McCarthy “y sus muchachos”, no âmbito do The Dartmouth Summer Research Project on Artificial Intelligence, que decorreu entre 18 de junho e 17 Agosto de 1956, deram novos passos sobre, designadamente:

  • A ideia fundamental: estabeleceram os conceitos-chave em IA, enfatizando que cada aspeto da aprendizagem ou qualquer outra característica da inteligência pode, em princípio, ser descrito com tanta precisão que uma máquina pode ser capaz de simulá-lo;
  • A abordagem interdisciplinar: destacaram a importância da colaboração entre diversas áreas, como ciência da computação, ciência cognitiva, psicologia e matemática, para o avanço da pesquisa em IA;
  • As direções da pesquisa: propuseram múltiplas vias para a pesquisa em IA, incluindo aprendizado de máquina, resolução de problemas e o desenvolvimento de algoritmos que pudessem imitar o raciocínio humano.

Mas também temos pensadores à altura que, olhando para tudo isto, preconizavam uma nova era, um contemporâneo ponto de inflexão, muito mais do que apenas uma simples tendência. O nosso Professor Agostinho da Silva, mais recentemente, há 35 anos, numa das suas Conversas Vadias, disse: “E como hoje, a cada passo, estamos inventando máquinas para fazer o trabalho que nós habitualmente fazíamos, é isso que vai obrigar o mundo a mudar, é a quantidade de milhões de meninos que neste momento estão nascendo neste mundo, já reformados, que não terão trabalho nenhum para fazer. Então a Sociedade vai mudar eu suponho.”

Concordam, não? A sociedade está a mudar e nós que trabalhamos com marcas também o estamos. Mas então deixem-me continuar para o bolo seguinte.

Fase 2. “Bolo Xadrez” ou, no tal jargão publicitário, “Must Have”

Chegou depois a era da segmentação e, com ela, as gavetas. Todo o marketer arrumava o seu pensamento distribuindo-o por cada uma delas: ou era o Above vs o Below ou eram as Ativações e o Marketing Relacional ou a Mass Media e por aí fora ou o Digital, que já ganhava importância para fazer parte do bolo. Em vez de imaginarem um armário com estas gavetas, pensem num bolo xadrez que tem perfeitamente identificado cada um dos seus elementos: o pão de ló, o chocolate, tudo estruturado e arrumado.

Foram tempos inglórios em que falávamos por canais, metendo a carroça à frente dos bois: primeiro os ditos e depois é que discutíamos a estratégia. Parecia que o marketing era mais uma “gestão de gavetas” do que uma verdadeira experiência integrada e convergente.

Lembro-me de uma famosa frase do Patrick Collister que, cansado disto tudo, até dizia “we are channeled”.

E a IA? Bom, estava ali na periferia, como uma ferramenta, fundamentalmente, para organizar dados e conversar, mas que não era assim tão aproveitada no processo criativo. Era coisa chata, trabalhada por tipos igualmente aperreantes, uma fauna que não era do mesmo grupinho da malta fixe do marketing. De qualquer forma, começou a revelar-se determinante em áreas como:

  • A análise dos dados dos públicos das marcas, com o intuito de saber mais sobre o seu comportamento, preferências e interesses, através de, por exemplo:
  1. Das atividades de navegação na web;
  2. Do histórico de compras;
  3. Das informações baseadas em dados demográficos.
  • A análise preditiva do comportamento de clientes, permitindo que as marcas ajustem suas estratégias de marketing, visando a satisfação do cliente e, por conseguinte, a sua lealdade.
  • A personalização de campanhas de marketing e ofertas em que a IA permitia analisar dados do consumidor, incluindo padrões de pesquisa, histórico de compras e comportamento de navegação (referido anteriormente) para:
  1. Otimizar campanhas para obter o ROI máximo;
  2. Fornecer experiências individualizadas.
  • A melhoria da experiência do cliente, através de, por exemplo, ferramentas como chatbots e assistentes virtuais, que ajudam a compreender e responder às dúvidas dos clientes, 24 horas por dia, 7 dias por semana.
  • A melhoria da produtividade, autonomizando e economizando tempo e recursos em tarefas que podem ser repetitivas, ao mesmo tempo que melhora seu desempenho/produtividade geral, como é o caso de:
  1. Criação de leads;
  2. Segmentação de clientes;
  3. E-mail marketing;
  4. Publicações em redes sociais.

Fase 3. “Petit Gâteau”, em dialecto publicitário “Have it blended and spread it”

Vivemos momentos muito mais interessantes em que a estratégia, as ideias, os conteúdos, a narrativa, a media e a tecnologia andam de mãos dadas logo desde o início de cada desafio. Misturam-se! É como um Petit Gâteau quando chega quente à mesa. Abrimo-lo com uma colher e não se conseguem identificar os ingredientes porque foram agregados desde o início. Foram integrados de forma convergente na receita para nos criar aquela boa sensação nos sentidos.

A beleza de tudo isto é que, tal como num Petit Gâteau, quando o chocolate se espalha, no Marketing acontece o mesmo. A conectividade, leia-se a internet e as plataformas, fomentam um efeito de partilha e as mensagens também se espalham, dando a possibilidade a cada um de nós para criar e disseminar o que lhe vai na alma. Temos uma participação ativa na vida das marcas e somos, para o bem e para o mal, os seus principais mensageiros.

E agora? Em que a IA, a generativa, nos chega como um verdadeiro canivete suíço, daqueles grandes que dá para tudo:

  • Analisar;
  • Sistematizar;
  • Estruturar;
  • Sintetizar;
  • Concluir;
  • Recomendar;
  • Idealizar;
  • Produzir;
  • Entregar.

O seu papel, não está apenas na otimização de processos, mas no apoio na integração em todos os níveis, desde a estratégia, à criação e a distribuição.

Tal como nos diz Fei-Fei Le, professora na universidade de Standford,“A IA não substitui a inteligência humana; é uma ferramenta para ampliar a criatividade e a engenhosidade humanas. O mais importante para mim não é apenas avançar na IA, mas também democratizá-la.”

No fundo, o marketing é hoje um jogo colaborativo entre humanos, ferramentas e algoritmos, para simplificar. Estamos todos na mesma cozinha, a misturar os ingredientes e, claro, a partilhar as criações com o mundo.

E se estávamos numa Era da Informação hoje, com a IA Generativa e com todo o apoio que nos dá, estaremos já numa nova fase em que podemos, eventualmente, apelidar de Era da Inteligência. E se antes Blended Marketing associava-se a uma mistura entre o físico e o digital, hoje refere-se a uma fusão entre a criatividade (humana) e as capacidades transformadoras da IA.

Confesso que isto é entusiasmante e já ia para aqui embalado para vos falar da chamada Agentic AI. Tinha era que meter mais doçaria ao barulho. Mas como tudo o que é demais faz mal ao corpo, fica para um próximo texto.

  • Nuno Antunes
  • business partner da Milford e professor ISCTE Executive Education

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