Mon(s)tras e Companhia

Seja nos saldos, seja para vender luxo ou acessibilidade, a montra precisa de contar uma história. Porque, no final, pode ser porta para experiências incríveis – ou para sustos difíceis de esquecer.

Quantas vezes já disse a alguém (ou já lhe disseram) “vamos ver as montras”? Esta expressão tão portuguesa diz muito sobre o papel simbólico e emocional destes espaços de uma loja. Não é “vamos comprar”, é “vamos ver”. Elas criam desejo antes de qualquer transação, convidando os consumidores a imaginar um estilo de vida ou uma necessidade que talvez nem soubessem que tinham.

Sejam físicas ou digitais, as montras são, muitas vezes, o primeiro contacto visual entre marca e consumidor, criando uma perceção que é mais forte do que a realidade. No filme da Disney “Monstros e Companhia”, a crença inicial era que só o medo criava energia, ditando o comportamento de todos, mas a realidade revelou que o riso tinha mais poder. No retalho, as marcas devem ter a consciência que a perceção molda as decisões de compra, e que, a longo prazo, precisam de entregar valor real para sustentar a relação com o consumidor.

As montras são um gatilho sensorial que ativa emoções e cria ligações imediatas. Funcionam como portais para um universo que a marca quer entregar — seja ele de luxo aspiracional, como os edifícios da Louis Vuitton ou da Cartier na 5ª avenida de Nova Iorque, ou de criatividade e diversão, como as lojas da Flying Tiger no shopping mais próximo. E podem cumprir diferentes objetivos em simultâneo, como os tanques dourados que refrigeram a cerveja — os beerdrives de cobre — da Super Bock –, visíveis das ruas, que evocam frescura e qualidade cervejeira, consolidando o posicionamento da marca e impulsionando, ao mesmo tempo, o consumo imediato.

No entanto, tal como no filme, também no marketing existem “monstras” — montras mal desenhadas ou campanhas desajustadas — que deixam os consumidores a gritar, mas de frustração: a H&M enfrentou contestação global quando expôs uma criança negra com uma sweatshirt onde se lia “Coolest Monkey in the Jungle”. A perceção negativa de insensibilidade racial ofuscou completamente o produto, independentemente da real posição da marca sobre questões raciais.

Também a Zara sentiu o peso de uma montra mal concebida, com uma camisola com riscas e uma estrela amarela, vista como uma referência insensível ao Holocausto.

A forma como os produtos são apresentados, enquadrados e promovidos, seja numa loja física ou num feed digital, é uma ferramenta das marcas para criar perceção, gerar desejo e conduzir à compra. O conceito de “montra” vai além do vidro e da rua, estendendo-se ao universo online como uma plataforma de impacto visual e emocional.

A Amazon, com as suas recomendações personalizadas e ações relâmpago, cria uma sensação de urgência e exclusividade, impulsionando compras por impulso e reforçando a imagem de eficiência e conveniência.

E, no mesmo mundo digital, os influenciadores juntam-se às plataformas como novas montras de impacto imediato. O TikTok tem tido um impacto significativo nas vendas de livros, especialmente entre os jovens. O fenómeno conhecido como “BookTok” tem impulsionado a venda de obras literárias, com recomendações que se tornam virais e influenciam diretamente as escolhas dos leitores – onde a perceção vale mais do que o valor real de cada obra literária.

Seja nos saldos ou no resto de 2025, seja para vender luxo ou acessibilidade, a montra precisa de contar uma história. Porque, no final, as montras podem ser portas para experiências incríveis — ou para sustos difíceis de esquecer.

  • Head of marketing Wells Ótica, Audiologia e Seguros

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