Sustentabilidade empurra valor e poder de atração das marcas
Se as empresas e as marcas não permitirem que as pessoas façam escolhas mais sustentáveis, mas também mais acessíveis, uma parte dos consumidores afastar-se-á das marcas e das categorias.
Um interessante relatório apresentado recentemente pela Kantar sobre Transformação Sustentável, levanta a questão de saber se as marcas estão ou não a corresponder às expectativas dos seus consumidores e dos seus públicos em matéria de sustentabilidade.
Hoje estamos, sem dúvida, num momento de mudança transformacional. Os desafios ambientais são problemas que definem a nossa era e, em todo o mundo, estão a tornar-se não apenas societários, mas também pessoais.
Quase nove em cada dez entrevistados no mais recente inquérito global da Kantar concordam que “há uma necessidade de ação urgente para lidar com as mudanças climáticas” e mais de 70% concordam com a afirmação de que: “elas próprias precisam fazer tudo o que puderem para combater as alterações climáticas”.
Apesar de outras fortes preocupações como as relacionadas com a guerra, a insegurança ou a inflação, o número de pessoas que cita o clima e o meio ambiente como uma das suas três preocupações mais importantes aumentou 50% durante 2022, após uma série de emergências relacionadas com eventos climatéricos e os seus impactos.
As pessoas reconhecem a sua própria responsabilidade na resolução de questões ambientais, mas não aceitam que a responsabilidade seja somente sua e sentem que não podem agir sem os meios para fazê-lo, a nível de conhecimento, de infraestrutura ou de opções. E consideram que todos têm um papel a desempenhar, incluindo, obviamente, as empresas e as marcas.
De facto, há a consciência de que área do clima e do meio ambiente é mesmo aquela em as empresas e as marcas terão maior responsabilidade na solução do problema e apenas 14% dos entrevistados indica que as empresas são suficientemente ambiciosas neste campo, ao invés de quase 40% que consideram que as empresas têm uma atuação negativa em matéria ambiental. E adicionam as questões sociais, com mais de 50% dos entrevistados a indicar que “as marcas têm um papel importante a desempenhar na intervenção social sobre dossiers como igualdade de género e raça ou relações com imigrantes”.
Estudos de mercado avaliaram os produtos mais frequentemente comprados por consumidores preocupados com a sustentabilidade em quatro grandes mercados europeus e observa-se que eles são vendidos com um prémio significativo em relação às médias da categoria.
Por exemplo, esse prémio é de mais 97% em Espanha e de mais 73% em Portugal. E quase 70% dos entrevistados não tem dúvidas que os produtos que são melhores para o ambiente ou para a sociedade, são geralmente mais caros.
Uma parte substancial dos consumidores não pode ou não quer pagar esse tipo de prémio, especialmente agora, quando sente fortemente a quebra do seu poder de compra. Assim, o desejo das pessoas de comprar produtos sustentáveis é, de certa forma, frustrado. E setenta por cento concorda que: “embora eu não possa comprar produtos que sejam melhores para o meio ambiente e a sociedade, isso não significa que estou menos preocupado com essas questões”.
Se as empresas e as marcas não permitirem que as pessoas façam escolhas mais sustentáveis, mas também mais acessíveis, uma parte dos consumidores afastar-se-á das marcas e das categorias, o mercado pode perder uma grande oportunidade relativamente a uma enorme fatia dos clientes e todos ficarão a perder.
É claro que haverá sempre ofertas premium pelas quais os consumidores estão disponíveis a pagar e no setor de luxo, por exemplo, há vários casos de comportamentos de liderança a nível de sustentabilidade. Mas os negócios sustentáveis não se podem confinar ao luxo, sob pena de nunca se tornarem um mercado massificado, quando, como demonstram os estudos, há um público de muito alargado para esses produtos e mensagens.
Estes estudos têm demonstrado que muitos consumidores estão disponíveis para pagar um pouco mais por bens sustentáveis, mas não prémios tão elevados como são praticados em muitos produtos, marcas e categorias, pelo que há que pensar também de forma algo diferente a nível de estruturas de custos.
Em alguns casos, os agravamentos gerados parecem não ser tão elevados como projeções anteriores referiam. Quem está mais familiarizado com curvas de inovação e modelos de custeio, perceberá facilmente que os custos se reduzem de forma previsível, mas também de forma acelerada, à medida que os volumes aumentam. Obviamente, há encargos adicionais a suportar, mas as estruturas de custos devem ser examinadas com cuidado. Os custos iniciais podem, de facto, ser maiores, mas serão reduzidos com o tempo, com o conhecimento e com a experiência.
Por razões óbvias, os pioneiros nestas áreas visaram especialmente o público mais interessado em sustentabilidade, mais propenso a pagar por atributos sustentáveis, muitas vezes com um mais elevado poder aquisitivo. Esse público representará menos de 30% da população nos mercados mais relevantes. Mas o interesse, hoje, vai muito além desse segmento, mesmo que o acesso e a compra ainda não se tenham concretizado para os restantes.
Na verdade, uma grande maioria dos consumidores não é exclusivamente movida pela sustentabilidade, apesar de lhe ser fortemente permeável. As suas compras estão relacionadas com a satisfação das suas necessidades e, hoje, há um desejo cada vez maior de que essas necessidades sejam atendidas da maneira mais sustentável possível, através de conceitos como saúde, qualidade, proveniência, eficácia, naturalidade, paladar, livre de; conceitos que podem reforçar-se mutuamente, tornando o produto e a marca mais atraentes e mais relevantes.
É fácil antecipar que o aumento da regulamentação prepara o cenário para mais mudanças (veja-se o que se está a verificar ao nível dos plásticos e das embalagens) e a pressão sobre as marcas surge de vários quadrantes. Essa pressão vem também, por exemplo, do lado do retalho, quer pressionando os fornecedores nos seus produtos e marcas, quer adotando aspetos comunicados como sustentáveis nas suas marcas próprias.
Isto significa a necessidade das empresas introduzirem uma racionalidade de inovação sustentável, incorporando princípios sustentáveis em todo o processo de inovação, desde a circularidade de materiais e recursos até as mudanças de comportamento que devem ser incentivadas, bem como a avaliação de novos modelos de negócios e novas formas de chegar ao mercado.
As boas marcas têm muitos benefícios e entregam valor de muitas maneiras diferentes. Para os seus detentores, elas impulsionam a procura, sustentam o preço, atraem talento, tornam as empresas como um parceiro desejável e facilitam a rentabilidade.
Fazem-no, como sempre o fizeram, atendendo às necessidades, gerando valor para o utilizador final.
Se essas necessidades eram, originalmente, bastante simples, a dada altura elas evoluíram para as áreas emocionais, sociais ou de identificação. Agora essas necessidades abraçam a sustentabilidade, mas ainda não estão a ter uma resposta na escala e na profundidade necessárias.
A sustentabilidade tenderá, pois, a refinar e sofisticar as propriedades das marcas, mas em simultâneo, a gerar procura, preço, talento, parcerias e financiamento. Para além de oferecer outras formas de valor, no presente, a montante e a jusante na cadeia de aprovisionamento, mas também no futuro.
A procura por maneiras mais sustentáveis de viver e produtos e serviços mais sustentáveis para comprar é enorme e é uma grande oportunidade para as marcas que lhe conseguirem dar resposta.
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