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Trabalhadores da dona da Visão param de trabalhar sexta-feira caso não recebam ordenado

Rafael Ascensão,

O aviso de greve abrange todos os trabalhadores, que apenas admitem voltar a trabalhar caso haja um pagamento integral dos montantes em falta. O Sindicato dos Jornalistas já mostrou o seu apoio.

Os trabalhadores da Trust in News, dona de meios como a Visão, Exame ou Caras, podem deixar de trabalhar esta sexta-feira, caso os pagamentos em falta, nos quais se inclui o ordenado de maio, não sejam liquidados. A paralisação está marcada para as 00h00 do dia 20 de junho e abrange todos os trabalhadores.

Reunidos em plenário, a 30 de maio, os trabalhadores já tinham aprovado recorrer à greve, caso não recebessem o salário e subsídio de refeição de maio e os 20% que ainda não tinham recebido referentes ao mês de abril. Embora os 20% do vencimento de abril já tenham sido liquidados, acresce agora em dívida o vencimento de maio e o subsídio de férias.

“Os restantes 20% do salário de abril foram entretanto pagos a 13 de junho, mas em relação ao salário de maio, ao respetivo subsídio de refeição e aos subsídios de férias já em atraso, os trabalhadores não receberam uma informação clara sobre o momento em que essas remunerações seriam liquidadas“, apontam os trabalhadores, que optaram pela marcação de uma greve por tempo indeterminado a partir desta sexta-feira.

Os trabalhadores avançam para greve por entenderem que “esta é a melhor forma de lutarem pelo pagamento dos salários e subsídios em atraso, de preservarem a sua dignidade profissional e de chamarem a atenção, uma vez mais, para uma situação que, desde há um ano e meio, ameaça a sobrevivência de mais de uma dezena e meia de títulos da imprensa portuguesa”, lê-se em comunicado.

A decisão foi aprovada por 47 dos 59 presentes no plenário, pelo que estiveram cerca de dois terços dos trabalhadores da TiN, que tem atualmente 93 pessoas. Este número espelha a saída de cerca de metade dos 200 trabalhadores que integravam os seus quadros há cerca de um ano.

“Com salários em atraso, impostos por liquidar e prestações da dívida ao Estado a terem de ser pagas já a partir do final do mês de junho, os trabalhadores da Trust in News temem pelo futuro dos seus títulos históricos e continuam a duvidar da existência de condições para viabilizar o plano de recuperação da empresa”, refere ainda a comunicação dos trabalhadores. As licenças dos programas de grafismo e fotografia utilizadas no grupo também já terão sido suspensas por falta de pagamento.

Caso os montantes em atraso sejam eventualmente liquidados, na totalidade, os trabalhadores admitem desconvocar a greve. “Só o pagamento integral do salário de maio e dos subsídios em atraso poderá fazer com que admitam continuar a trabalhar“, lê-se no comunicado. Tal só deverá ser possível com a injeção de capital por parte do acionista único da empresa, Luís Delgado.

Sindicato dos Jornalistas solidário

Esta terça-feira, o Sindicato dos Jornalistas (SJ) já demonstrou a sua solidariedade para com os trabalhadores, apontando que os jornalistas da TiN “não podem continuar a suportar meses de salários em atraso, subsídios por pagar e um futuro hipotecado porque Luís Delgado não cumpriu a promessa de injetar 1,5 milhões de euros para viabilizar a sobrevivência dos 17 títulos do grupo.

“Sem o dinheiro prometido pelo sócio único da TiN, não é possível travar o processo de insolvência que vem do ano passado. Durante todo este tempo, os jornalistas e demais trabalhadores foram os únicos que não falharam nas obrigações e é pelo seu esforço que os títulos continuam em banca, gerando receitas”, acrescenta em comunicado.

No entanto, “há limites à capacidade humana de suportar o intolerável, de viver com atrasos permanentes, com o presente condicionado e o futuro incerto”, afirma o Sindicato dos Jornalistas, pelo que o mesmo “apoia a opção dos trabalhadores“, de avançarem para greve esta sexta-feira.

O SJ apela ainda a todos os jornalistas e a toda a sociedade que se “coloquem ao lado” dos 92 trabalhadores que “lutam por condições mínimas de trabalho e pela sua dignidade”. “Lutemos a seu lado! Pela TiN e pelo jornalismo, que vai vivendo em Portugal tempos dramáticos sem que os poderes entendam que os populistas se têm alimentado muito da fragilidade de um pilar essencial de um Estado de direito e que sem jornalismo não há democracia”, acrescenta o sindicato.

O plano de recuperação

O plano de recuperação da empresa, apresentado por Luís Delgado e aprovado por 77% dos credores em maio, prevê a injeção de até 1,5 milhões de euros pelo acionista único. Segundo o documento, a TiN propôs aos credores um “compromisso de aporte de até 1,5 milhões de euros, faseadamente, e em função das necessidades da empresa para reforçar a tesouraria”, por parte do acionista único. Até agora, terão sido injetados cerca de 180 mil euros.

O plano mantém ainda a intenção de suspender, licenciar ou vender publicações deficitárias como TV Mais, Telenovelas, Caras Decoração, Prima, Visão Saúde, Visão Surf e This is Portugal, sendo que, “com exceção da Telenovelas, todas as outras publicações já estão suspensas”. Prevê ainda um ajuste na periodicidade, se necessário, de algumas revistas, mantendo apenas as mais rentáveis, além da redução de 70% do espaço físico (50% já foi reduzido) e o encerramento da delegação no Porto.

Será ainda reduzido “o quadro de funcionários, proporcional à suspensão de publicações, com reestruturação interna”. Quanto ao pagamento das dívidas proposto, será faseado, no caso da AT e ISS em 150 prestações, além de um “plano de pagamento de 12 a 15 anos para credores comuns e garantidos” e da “possibilidade de permuta de publicidade para pagamento de parte das dívidas”.

Para aumentar receitas, o plano prevê o “aumento de assinaturas digitais e melhoria da plataforma de e-commerce, parcerias estratégicas com outros grupos editoriais”, a “exploração de novos formatos de conteúdo, como podcasts e vídeos”, e o “licenciamento de marcas para gerar receita adicional”.

Quanto ao impacto desta reestruturação, a empresa aponta uma “melhoria gradual da rentabilidade, com um retorno a resultados positivos esperado a médio prazo”, evitando a liquidação da empresa e “preservando postos de trabalho e ativos”. Ficará, segundo o plano, ajustado “o modelo de negócio para um formato mais sustentável, alinhado às tendências digitais”, garantindo ainda o “pagamento aos credores, comparativamente a um cenário de liquidação, onde muitos não receberiam os seus créditos”.

O plano prevê também a “criação imediata de uma task force com dois diretores editoriais, diretora comercial, diretora financeira e diretor de recursos humanos, com a tarefa de reanalisar todos os custos e contratos passíveis de serem renegociados ou cessados, sem qualquer penalização para a empresa, e apresentar medidas e sugestões para aumentar as receitas, tendo em conta os recursos existentes” e os melhores exemplos nacionais e internacionais. As sugestões deste órgão “serão implementadas após aprovação da gerência e do administrador da insolvência”.

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