Papa Super Pop

  • António Fuzeta da Ponte
  • 28 Julho 2023

"Espero que façam barulho”. Não é uma frase dos Coldplay em início de concerto. É do Papa, aos jovens. “Façam barulho...quero que saiam pelas estradas”. (...) Walk the talk, senhores marketeers.

O que é o que o Papa tem? Estamos a poucos dias de receber mais de um milhão de pessoas em Lisboa, já tudo ou quase tudo foi dito, escrito, aventado, sobre o palco, o custo, o turismo, o sol abrasador, a estátua tapada, a falta de preparação, a óptima preparação, os custos que isto terá, os euros gastos por dia, os autocarros estacionados no eixo norte sul… Ainda assim, há uma coisa que não tem discussão: vem aí mais de um milhão de pessoas para ver o Papa.

Este Papa, que já visitou todos os continentes, vem a Lisboa sem ainda ter visitado (oficialmente) a sua terra natal. E já moveu multidões em palcos como Cuba, Sarajevo, Palestina, Israel, Tirana e até Iraque, naquela que foi considerada uma das suas viagens mais arriscadas.

O que é que este Papa tem? Algo terá. Este Papa moveu 3,5 milhões de pessoas a vê-lo na praia de Copacabana e uns incríveis 6 milhões nas Filipinas. 6 milhões! Em Lisboa não serão tantos, mas serão jovens, muitos jovens.

Em Ascot, debaixo dos chapéus, estão todos os anos cerca de 220 mil pessoas. Em Indianápolis, talvez o evento desportivo mais concorrido num só local e momento, estão 350 mil. Jean Michel Jarre e Rod Stewart tiveram perto disso na praia do Rio de Janeiro. Eu tenho um amigo que pode morrer feliz, viu Frank Sinatra, no Maracanã, com mais 100 mil pessoas, naquele que foi na altura o maior concerto do mundo de um só artista. Foi mágico. Já vi a fotografia dele, lá no meio, várias vezes. Os olhos brilham sempre que me mostra.

Mas não há comparação nos números. Não conheço fenómeno popular, de arte, de entretenimento ou outra coisa, que mova tanta gente, tantos jovens. É a fé, dirão. Sem dúvida. Mas este Papa fala com os mesmos crentes que os outros Papas falaram e os números não eram estes. E também não estou aqui para discutir temas de fé, que é algo que não domino nem o pretendo.

E parece-me que isto dos grandes números está nas palavras. É a palavra que move.

Ora vejam: “Espero que façam barulho”. Não é uma frase dos Coldplay em início de concerto. É do Papa, aos jovens. “Façam barulho…quero que saiam pelas estradas”, disse-lhes ele.

Se o “I did it my way” é quase universal, aos jovens o Papa diz “não olhem a vida da varanda”. E para o poder de ilusão de um “sky full of stars” Franciso inspira com frases como “sonhai grandes coisas, sonhai que convosco o mundo pode ser diferente”. E remata com “queremos jovens fortes”… “é preciso ir contracorrente!”.

Recordemos, é um Papa que não só vai ao Iraque e à Palestina como diz “é preciso ir contracorrente”. Walk the talk, senhores marketeers.

Lá está, não é só fé. É a palavra, é a mensagem que move milhões. E por isso mesmo escrevo eu hoje. Porque como profissional de marketing, em que as palavras estão ao serviço das marcas, este é mais um alerta às marcas e às empresas. E já agora também aos políticos. Não importa o tamanho do palco, não importa o nível de pós-produção do anúncio de tv, não importam os milhões gastos em campanhas eleitorais pelas terrinhas de interior. Nada importa se o mensageiro não trouxer a mensagem certa. E que lhe seja legítima. Francisco domina isso muito bem, por isso tem as suas multidões.

Que fique a lição: mensagem inspiradora, mas cumprida em exemplos. Sem ser legítima será só populismo nuns casos, green wash noutras, ou falsas promessas que terão um ricochete de grave perda futura de consumidores ou eleitores. E já agora, às marcas, aproveito o desafio de Francisco: às vezes, “é preciso ir contracorrente!”

  • António Fuzeta da Ponte
  • Diretor de marca e comunicação da Nos

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