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Media Capital propôs à Digi compromisso de comprar publicidade na TVI

Flávio Nunes,

A dona da TVI revela que propôs à Digi o compromisso de esta investir em publicidade na TVI no lançamento, visto que a nova operadora alegava não ter capacidade de pagar o exigido pelos canais.

A Media Capital propôs à Digi que canalizasse para a TVI parte do seu investimento inicial em publicidade durante o lançamento da operadora em Portugal. Segundo o grupo de media, a proposta foi feita numa fase inicial das negociações para integrar os seus canais na grelha de televisão da Digi, tendo sido proposta como contrapartida após a Digi alegar que não tinha capacidade de pagar o preço exigido pelo licenciamento dos canais.

As duas empresas acabaram por entrar em rutura, levando a Digi a apresentar contra a Media Capital uma queixa na Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), no dia 26 de fevereiro de 2024, conforme noticiou o ECO esta semana. Nela, acusa a dona da TVI de adotar um “comportamento abusivo” e de exigir a “subordinação da celebração do contrato de distribuição televisiva” a “uma prestação suplementar não relacionada com o objeto do contrato”.

O ECO tentou apurar o teor dessa “prestação suplementar” junto da Digi e da Media Capital. “Na fase inicial das negociações, a Digi alegou não ter capacidade financeira para pagar os custos de licenciamento pedidos pela TVI. Sabendo que a Digi teria que fazer publicidade à sua marca para lançar os seus serviços, a TVI reagiu propondo que a Digi se comprometesse a canalizar para a TVI parte desse seu investimento inicial na marca”, esclareceu fonte oficial do grupo que também é responsável pela CNN Portugal.

Segundo a deliberação da ERC, as duas empresas negociaram a distribuição dos canais entre 7 de novembro de 2022 e 29 de janeiro de 2024, dia em que “os contactos formais” cessaram após “uma viva e infrutífera troca de argumentos, por via eletrónica”. Uma audiência conciliatória realizada no dia 9 de abril de 2024 nas instalações da ERC também não permitiu, com a mediação do regulador, resolver o diferendo.

Até onde foi possível averiguar, as negociações com a Media Capital não terão sido retomadas e a Digi também ainda não conseguiu assegurar na sua futura grelha televisiva os canais do grupo Impresa, incluindo a SIC e SIC Notícias, depois de as negociações terem ficado retidas na fase contratual, de acordo com uma fonte familiarizada com o assunto.

Outra fonte disse que ainda não existe contrato assinado com a RTP e o ECO também sabe que não existirá nenhum contrato assinado com a Medialivre, que detém a CMTV, um dos canais mais vistos da grelha de televisão paga em Portugal. Existirá, contudo, um acordo com pelo menos uma empresa que tem canais no cabo.

Contactada, a Impresa respondeu que as negociações entre as partes só a elas dizem respeito, sem avançar mais detalhes. A RTP e a Medialivre não quiseram fazer comentários.

Na fase inicial das negociações, a Digi alegou não ter capacidade financeira para pagar os custos de licenciamento pedidos pela TVI. Sabendo que a Digi teria que fazer publicidade à sua marca para lançar os seus serviços, a TVI reagiu propondo que a Digi se comprometesse a canalizar para a TVI parte desse seu investimento inicial na marca.

Fonte oficial da Media Capital

Digi em “negociações” para “maximizar os benefícios para os consumidores”

Já a Digi alegou não poder responder às perguntas do ECO, “devido à sua especificidade”. Mas fonte oficial enviou uma declaração onde confirma “negociações estratégicas” em “benefício” dos consumidores.

“Na Digi, estamos empenhados em oferecer a melhor e mais completa gama de serviços ao mercado, em linha com os restantes operadores, e para isso estamos a desenvolver todos os esforços possíveis. As nossas iniciativas passam por negociações estratégicas, conduzidas através dos canais adequados, sempre com o objetivo de maximizar os benefícios para os consumidores portugueses. A nossa missão é disponibilizar uma oferta vantajosa e competitiva, respondendo às necessidades do mercado de forma eficaz e eficiente”, disse fonte oficial da Digi Portugal.

As afirmações da Digi Portugal são particularmente relevantes. Depois de um comentário publicado no ECO a 9 de maio de 2022, esta foi a segunda declaração de fonte oficial da nova operadora no mercado português.

As nossas iniciativas passam por negociações estratégicas, conduzidas através dos canais adequados, sempre com o objetivo de maximizar os benefícios para os consumidores portugueses.

Fonte oficial da Digi Portugal

Media Capital “levará até às últimas instâncias” diferendo com Digi

Voltando à Media Capital — controlada pelo empresário Mário Ferreira, que também é acionista do ECO –, a dona da TVI e da CNN Portugal acusa a Digi de ter pretendido, nas negociações, “impor as condições de entrega dos canais da TVI”. Salienta também que “levará até às últimas instâncias judiciais a discussão sobre em que condições deverá entregar os seus canais à Digi”.

Em causa está a existência, ou não, de uma obrigação de as televisões entregarem os seus canais às operadoras, a troco de uma “remuneração adequada”, como refere a Lei da Televisão. A ERC não deu provimento à queixa da Digi contra a Media Capital, considerando que “não se encontram especificados quaisquer serviços de programas televisivos sujeitos a obrigações de transporte ou de entrega em redes de comunicações eletrónicas”, e remeteu o assunto para a Autoridade da Concorrência. Contactada, fonte oficial deste regulador ainda não respondeu.

Já a Media Capital disse, no âmbito do processo que decorreu na ERC, que não tem “a obrigação de entrega do sinal do canal TVI (e muito menos de qualquer outro canal do grupo)”. Porém, em abril de 2023, numa consulta pública promovida pela Anacom sobre o prolongamento da licença da Televisão Digital Terrestre (TDT) à Meo, queixou-se de que existe uma obrigação de entrega do sinal da TVI, “por estar na TDT”, que lhe retira poder negocial com as operadoras.

“A TVI, por estar na TDT, é sujeita à obrigação de must-deliver [entrega]; não é difícil de entender que o facto de ter essa obrigação sobre si limita significativamente a TVI na sua capacidade negocial com as plataformas de TV paga, na medida em que estas se fazem valer da obrigação de entrega do sinal que impende sobre a TVI para baixar significativamente o valor pago por esse sinal”, lê-se na pronúncia da Media Capital enviada à Anacom no dia 13 de abril de 2023.

“Essa circunstância é comprovada pelo facto de essas plataformas pagarem ao Grupo Media Capital mais pelo sinal da CNN do que pelo sinal da TVI, quando esta última tem cinco vezes mais audiência do que aquela”, apontou ainda a empresa.

Questionada sobre estas declarações, fonte oficial da Media Capital admitiu ao ECO que a Lei da Televisão determina uma obrigação de entrega dos canais “aos distribuidores de televisão paga”, mas diz que a considera “anacrónica”, pois a TDT serve “menos de 1% dos lares em Portugal”.

“Os operadores de canais televisivos não têm alternativa, para distribuir os seus canais, a entregar o seu sinal aos distribuidores de televisão paga, a única questão que se põe é o preço a que o entregam”, reconhece a dona da TVI.

“Desde então, nas muitas reuniões tidas com dois presidentes da Anacom, dois presidentes da ERC, dois ministros das Infraestruturas e um ministro da Cultura, a TVI, juntamente com a SIC e com a RTP, justificou a necessidade de eliminação desta obrigação. Todos os responsáveis concordaram com a justificação, mas apontaram as dificuldades de uma revisão da Lei da Televisão, mais ainda depois do fim da maioria absoluta no Parlamento”, acrescenta fonte oficial.

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