Apoios ao setor dos media: avaliar antes de agir

  • Pedro Loureiro
  • 8 Julho 2024

As empresas de media são negócios, mas desempenham um papel de serviço público, que é informar. Mas os apoios não se podem transformar numa subsidiação discricionária.

Como destaca o Instituto +Liberdade (o conteúdo é do início deste ano), “o negócio da imprensa escrita tem sofrido grandes alterações (novos hábitos de consumo, menos receitas de publicidade, menos compradores de jornais, etc.), que colocam em causa modelos de negócio que funcionaram durante décadas”.

Se é notório que os meios que se atrasaram a chegar ao digital são os “passam por maiores dificuldades”, não é menos verdade que o digital, em si, é também um desafio mesmo para os que fizeram uma transição tecnológica mais acelerada, porque os leitores, também eles, adotaram novos hábitos no consumo de notícias e de informação. Esta não é, na minha opinião, uma situação que vá mudar no curto prazo, ou seja, sem os incentivos corretos e adequados será muito difícil que os cidadãos passem, de um momento para o outro, a voltar a comprar jornais (ainda que digitais) “como antigamente”.

De acordo com o +M, o Jornal de Notícias, O Jogo e a TSF devem mudar de mãos já neste mês de julho, o que em princípio constitui uma boa notícia para o futuro destes títulos, uma vez que houve um interesse empresarial em desenvolver estas marcas de referência da imprensa nacional. Também no Jornal Eco pudemos ler, recentemente, que a Trust in News (TIN), dona das revistas Visão e Exame, “apresentou um pedido de acesso ao PER, um regime para proteger dos credores e evitar a falência”. Não será difícil antecipar o interesse por alguns dos títulos que compõem o portefólio da TIN, que têm um valor de marca relevante, pela sua notoriedade e histórico. Competirá a empresários com visão de negócio – assim existam e apareçam num país que tem um défice crónico de capital e de apetite para o risco – apresentarem propostas no âmbito do PER e negociarem uma nova vida para alguns, ou todos, os títulos do portefólio.

A comunicação social deu mostras de vigor, não na imprensa escrita, mas no segmento de televisão, quando há dias viu nascer o novo canal de informação que dá pelo nome de News Now, pertencente à Medialivre (antiga Cofina), e que já levou a que a CNN Portugal e a SIC notícias tenham feito alterações de programação e de grelhas para acomodar a entrada em cena de um novo concorrente. Se a entrada de um novo protagonista desafia os meios já existentes a inovarem e a procurarem melhorias isto significa que o mercado está a funcionar e isso é uma boa notícia para os meios, mas também para os espetadores e consumidores de informação. E, já agora, para a sociedade, porque significa que o jornalismo cumpre mais eficazmente o seu papel.

E, aqui chegado, devo dizer que concordo com João Günther Amaral, administrador executivo da Sonae, empresa que em 1990 lançou o jornal Público, que defende que “mais do que um negócio, a imprensa livre e de qualidade é indispensável à cidadania, à literacia democrática e aos valores da liberdade, da livre iniciativa e da responsabilidade social”, e que, “por isso, a imprensa deve ser apoiada”. Onde podemos divergir – e onde acho que é imperativo um debate alargado, que envolva os jornalistas, os proprietários dos meios, as agências de publicidade, de meios, de comunicação, e obviamente os decisores públicos – é sobre os apoios a atribuir. Porque para saber que apoios, ou que incentivos, devem ser atribuídos, é primeiro preciso fazer um diagnóstico mais amplo sobre os problemas concretos que o setor enfrenta quer do ponto de vista do modelo de negócio, quer, sobretudo, do impacto da importância, relevância e centralidade da existência de uma imprensa livre e plural na nossa sociedade.

As empresas de media são negócios, mas desempenham um papel de serviço público, que é informar. Mas os apoios não se podem transformar numa subsidiação discricionária, que vise proteger negócios e criar uma atividade económica rentista ou inteiramente dependente de dinheiros ou de incentivos públicos. Olho com respeito e interesse para muitas das medidas apresentadas pelos “patrões” dos media, que parecem afastar apoios públicos diretos (o que é bom), mas propõem várias medidas (que carecem de avaliação). Ou seja, se por princípio acompanho a ideia de que a sociedade ganha e beneficia com apoios ao setor dos media, tais ganhos e benefícios devem suplantar os custos, financeiros e outros, de deixar o mercado funcionar, morrendo as empresas e os negócios não viáveis, perseverando e crescendo as empresas e os negócios viáveis.

As políticas públicas para o setor dos media, os eventuais apoios e incentivos a criar (na mesma linha, por princípio, considero uma boa ideia a proposta de Miguel Poiares Maduro de atribuir, pelo Governo, vouchers aos cidadãos para assinaturas de jornais) devem ser precedidos de análises de custo e benefício para assegurarmos que os dinheiros públicos que estão a ser investidos (ou de que se estão a prescindir) geram resultados efetivos e positivos para a sociedade. Esse é um custo que tenho gosto, como contribuinte, em suportar. O Governo e o Parlamento têm recursos para encomendar avaliações independente. Essas avaliações fazem falta e são importantes para o futuro da comunicação social. Nessas avaliações, que são urgentes, é imprescindível que se inclua também a racionalidade e relevância da existência e manutenção do Grupo RTP na esfera pública.

  • Pedro Loureiro
  • Founding partner da MediaGate

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