Marcas eclipse

  • Rui Borges
  • 20 Fevereiro 2024

Outra forma de olhar para esta questão é pensar em “marcas eclipse”, marcas que aparecem quando ligamos a luz do investimento em media mas que desaparecem assim que a desligamos.

O problema do excessivo investimento em marketing de performance é muito bem resumido por António Fuzeta da Ponte, o diretor de marca e comunicação da Worten, neste artigo do +M.

De forma muito resumida, porque o melhor é mesmo ler o artigo original, Fuzeta da Ponte refere que apenas 10 a 15% do investimento em publicidade digital é construção de marca, sendo os restantes 85 a 90% investimento em marketing de performance. Esta tendência arrisca criar “marcas pré-fabricadas”, sem pilares sólidos e que podem facilmente ruir em tempos mais desafiantes.

Mas qual é o problema de investir quase todo o nosso budget em marketing de performance, com uma comunicação altamente segmentada, racional e focada nos atributos e benefícios imediatos dos produtos? Afinal de contas não teremos mais sucesso se apostarmos em vender a quem está mais interessado em comprar?

A resposta é um rotundo não. E por vários motivos.

O primeiro é que a publicidade deve trazer vendas incrementais, ou seja, vendas que não teriam acontecido caso não houvesse publicidade. E a verdade é que uma grande parte das vendas resultantes do marketing de performance não são vendas incrementais. São vendas a pessoas que já iam comprar a marca de qualquer forma. Para isso, não precisamos de gastar dinheiro em publicidade. Se uma marca tem 30% de quota de mercado e existem 100 pessoas prontas para comprar, é natural que 30 vão comprar a marca em questão. O desafio da publicidade é vender às outras 70 pessoas que, em princípio, escolheriam outra marca.

Mas o segundo motivo para não investir demasiado em marketing de performance é ainda mais importante. É que este tipo de marketing só funciona com pessoas que estão no mercado prontas para comprar. E essas pessoas, além de serem muito poucas, quando entram em modo comprador já têm a decisão tomada.

Vamos por partes. Primeiro o facto de serem poucas. Vai comprar um forno hoje? E um carro? Vai comprar shampoo amanhã? E abrir conta num banco? Provavelmente, não. John Dawes, do Ehrenberg Bass Institute, é o autor da regra 95/5 que diz que, em média, 95% dos nossos potenciais compradores não estão nem vão estar tão cedo no mercado. É apenas uma média, mas dá ideia da dimensão. Num estudo alargado que fizemos na Plot sobre abertura de contas bancárias em Portugal, percebemos que, num determinado mês, apenas 1,5% do mercado potencial estava realmente “comprador” de uma conta bancária. Os outros 98,5% não estavam nem aí.

Mas as coisas complicam-se. Mesmo os 1,5% que estão à procura de abrir conta já vêm com preferências muito bem definidas. No mesmo estudo, ficámos a saber que o set de consideração para abertura de conta em Portugal são dois bancos. E que 72% das pessoas não fazem qualquer pesquisa. Leu bem: 72% das pessoas abrem conta num dos dois primeiros bancos que lhes vem à cabeça. E mesmo os 28% que vão pesquisar e avaliar, pesquisam e avaliam em primeiro lugar os dois bancos que lhes vieram à cabeça. Ou seja, a probabilidade de escolherem um banco que não esteja já no set de consideração inicial é extremamente baixa.

O que nos leva à construção de marca, o que permite que a sua marca seja recordada numa situação de compra. Para isso acontecer, precisamos de fazer algumas coisas de forma diferente:

  • Investir em meios que nos permitam contar uma história, como a TV e formatos de vídeo online. Porque é através de histórias que aprendemos a processar e dar significado à informação;
  • Apostar na emoção. Não porque esteja na moda ou porque queiramos comunicar o nosso propósito (seja lá o que isso for), mas porque a emoção é o único processo de formação de memórias que não conseguimos filtrar. E emoção não é fazer chorar. É sabido que fazer rir traz resultados melhores. Isto porque além de facilitar o processamento da informação também aumenta o alcance via partilhas;
  • Fugir da excessiva segmentação de meios que nos mete a falar com quem já comprou ou com quem ia comprar de qualquer forma. Pelo contrário, investir em canais de alto alcance que chegam a muitas pessoas. Especialmente aos não clientes.

Até lá, estamos a criar, como diz António Fuzeta da Ponte “marcas pré-fabricadas” sem fundações sólidas. Outra forma de olhar para esta questão é pensar em “marcas eclipse”, marcas que aparecem quando ligamos a luz do investimento em media mas que desaparecem assim que a desligamos.

  • Rui Borges
  • CEO da Plot

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