O marketing à beira do precipício

  • Duarte Avillez Durão
  • 11:29

Os que jogam à defesa podem sofrer menos golos, mas certamente também os marcam menos. Marketing exige ambição e representa sempre um investimento na criação de valor futuro.

Vivemos num contexto global altamente complexo e instável. Até há quem o apelide de Polycrisis – um momento de grande confusão causado por muitos problemas diferentes a acontecer ao mesmo tempo, que em conjunto, têm um efeito ainda maior.

A escalada das guerras da Ucrânia e do médio Oriente, e as respetivas implicações geoestratégicas, uma União Europeia em crise de crescimento e de afirmação mundial e o desfecho ainda incerto das eleições americanas, deixam o mundo em suspenso. Enfrentamos uma crise de valores e direitos que sempre orientaram a ordem mundial, tal qual a conhecemos (da perspetiva ocidental).

A juntar a isto, temos as alterações climáticas, os movimentos demográficos e a aceleração tecnológica, com a inteligência artificial a liderar, na inovação e na preocupação.

Assisti recentemente a uma interessante conversa entre Ricardo Costa e Sérgio Sousa Pinto (a convite da Nova Expressão e da Global) sob o tema “Os Riscos para Portugal e para a Europa na nova (des)ordem mundial” e vim de lá quase derrotado pela dimensão do problema face à minha pequena realidade. Depois pensei, o que posso eu fazer na minha esfera de influência, como pessoa, como pai, como publicitário e como responsável de uma empresa?

Aqui, neste artigo, vou poupar-vos às minhas questões mais existenciais e aos dramas da adolescência, focando-me no que podem as agências, as marcas e os marketeers fazer. Um desafio do tamanho do problema, e inversamente proporcional às curtas linhas que tenho, mas espero contribuir com algum pensamento que nos possa ajudar na nossa ação coletiva.

Começo por dizer que as marcas devem ter um orçamento otimista para 2025. Portugal está com boas contas e não comecemos logo a planear no medo. Os que jogam à defesa podem sofrer menos golos, mas certamente também os marcam menos. Marketing exige ambição e representa sempre um investimento na criação de valor futuro.

Neste contexto de alta instabilidade, os criativos e as marcas devem ser inspiradoras do melhor que existe na natureza humana. Sem demagogia, ou excesso de poesia, procuremos criar ideias com impacto social que envolvam as pessoas e as levem a aspirar com um mundo melhor, um mundo com valores humanistas e menos polarizado.

Segundo um estudo da Scopen (Tracking de Marcas na Responsabilidade Social 2023) 72% dos portugueses considera ser muito relevante as marcas terem um papel ativo no apoio a causas sociais. As marcas ocupam o espaço mediático e têm uma voz, podem moldar culturas, pois identificam e levantam tensões sociais que nem sempre sabemos existirem, e podem, como tal, assumir posições de acordo com o propósito e impacto que ambicionam ter na sociedade. Sem uma sociedade democrática a funcionar, dificilmente teremos marcas e negócios.

Na atual cultura de cancelamento, por vezes confunde-se o politicamente correto com a ausência de personalidade e caráter, e com isso ficamos todos mais insonsos, nós e as marcas que trabalhamos.

Na perspetiva ambiental, penso que todas as empresas devem acelerar projetos de transição energética, de regeneração e sustentabilidade em geral. Se não for pela sua consciência, que seja pela preferência dos consumidores pela sua marca.

Do lado demográfico, e vivendo num Portugal cada vez mais diverso e cosmopolita, devemos fomentar uma cultura de aceitação do outro promovendo a integração. E mais uma vez as marcas podem ter um papel de educação e formação de opinião através das suas campanhas. E numa perspetiva mais prática procurar castings representativos das diferentes etnias e credos que hoje convivem em Portugal.

Para terminar, defendo que sejamos generosos, sabendo valorizar o tempo uns dos outros, o bem mais precioso de todos. Afinal é isso que pedimos às pessoas (audiências) com as nossas campanhas, damos um estímulo criativo em troca da sua atenção, pedindo mais tempo para nos ouvirem melhor. Para isso temos obrigação de ser interessantes, dando algo em troca, podemos somente entreter, provocar uma emoção, despertar um desejo, gerar um sentimento, uma reflexão ou uma ideia nova para pensar.

Dar para receber. Parece-me uma ideia simples para este mundo complexo.

  • Duarte Avillez Durão
  • Founder & managing partner da Nossa

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