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“A ideia de que vamos consumir experiências e coisas que nos fazem felizes está claramente desafiada neste momento”, diz Sérgio Ferreira da EY

Rafael Ascensão,

O cenário macroeconómico fez aumentar a importância do preço enquanto fator de decisão de compra, bem como a aposta dos consumidores em marcas próprias e na diminuição do consumo de bens em geral.

A ideia de que vamos consumir experiências e coisas que nos fazem felizes está claramente desafiada neste momento“, diz Sérgio Ferreira, partner, consumer products and retail leader da EY Portugal, ao +M a propósito da quarta edição do EY Future Consumer Index.

Segundo Sérgio Ferreira, as tendências de consumo em Portugal estão a ser impactadas pelo cenário macroeconómico global, notando-se uma clara repercussão nas prioridades de compra entre os portugueses sobre gastar menos em bens que não são essenciais, uma mudança que “obviamente se está a acentuar”.

Há claramente uma disrupção continuada ao longo dos últimos anos que está a levar os consumidores a introduzirem aquilo que eu poderia chamar mudanças dramáticas de curto prazo no seu estilo de vida“, considera, em análise ao inquérito elaborado pela EY Portugal.

Segundo o consumer products and retail leader da EY Portugal, estudo que conta com 525 inquiridos, existe atualmente um cenário “que não é propriamente o mais promissor” e “enquanto não tivermos outro cenário macroeconómico, diria que é difícil que se altere esta ideia de que as pessoas tenham um comportamento muito mais cauteloso e consciente relativamente àquilo que é viverem dentro dos seus orçamentos”.

Sérgio Ferreira, partner, consumer products and retail leader da EY Portugal.

Nos dias atuais existe assim claramente uma “preocupação muito acentuada” dos consumidores relativamente ao aumento do custo de vida, com 80% das pessoas inquiridas demonstrarem essa preocupação e 63% a admitirem que o aumento dos produtos e serviços está a limitar o seu poder de compra.

Além disso, 81% dos consumidores estão a planear comprar menos bens em geral, em todas as categorias de produto, para poderem economizar, e 41% anteciparam que iam gastar menos na temporada festiva que passou.

O preço é o que mais pesa na decisão de compra atualmente, com 85% dos consumidores a preocuparem-se com a acessibilidade dos bens essenciais. Na mesma linha preocupam-se com o aumento de outros custos, como os cuidados de saúde (59%) o que, segundo Sérgio Ferreira, “vai limitar o que vão gastar noutras coisas que não são essenciais”.

A importância do fator preço enquanto critério de compra sempre teve a maior percentagem em Portugal, mas esta acentuou-se nos últimos anos. Enquanto em 2021 representava 65%, em 2022 e 2023 fixou-se em 76%.

Entre os três principais critérios analisados no estudo da EY – preço, saudável e sustentável – a maior variação, no entanto, ocorreu entre o critério saudável. Em 2021, 54% das pessoas diziam que este era um fator de decisão, número que desceu em 2022 para 40% e em 2023 para 35%.

Já a sustentabilidade também diminuiu em termos de importância, com 45% dos consumidores a colocarem esta critério como fator de decisão em 2021, mas apenas 33% a fazê-lo tanto em 2022 como 2023.

Em 2023, estabelece-se assim uma “diferença enorme” entre os três critérios – preço (76%), saudável (35%) e sustentável (33%) – numa comparação que é mais ou menos transversal a outras geografias, como nos Estados Unidos da América onde “o preço também se tem tornado o fator, destacadamente, como o mais importante na decisão de compra“, diz Sérgio Ferreira.

No que toca a diferenças entre o panorama português e global o partner e consumer products and retail Leader da EY Portugal revela que não são encontradas diferenças “muito significativas”. “Como é evidente, há países que são mais desenvolvidos e ricos do que outros, mas as diferenças são relativamente baixas. Por isso, cada vez mais, sentimos que existe uma normalização de comportamentos. Esta acontece quer seja a nível local quer global”, explica.

Em termos de produtos, Sérgio Ferreira destaca que 45% dos portugueses estão a comprar menos roupa, calçado e acessórios, enquanto 30% compram menos bebidas alcoólicas do que normalmente faziam.

“As marcas próprias estão a sair claramente beneficiadas desta situação de elevadas taxas de juro com impacto naquilo que é uma menor disponibilidade financeira dos consumidores”.

Sérgio Ferreira

Partner, consumer products and retail leader da EY Portugal

Além disso, 48% dos consumidores nacionais estão a comprar alternativas mais baratas de produtos para cuidar da casa, 46% estão a comprar alternativas mais baratas de produtos alimentares básicos e 39% estão a comprar alternativas mais baratas de comida fresca embalada.

Outra tendência que tem pautado os últimos meses, mas que “foi fortemente reforçada na época festiva”, é a da aposta dos consumidores em marcas próprias, refere Sérgio Ferreira, adiantando que 82% dos portugueses concorda que a mudança para marcas próprias está a ajudar a poupar dinheiro. Metade (50%) dos portugueses estão mesmo a comprar mais produtos de marca própria, naquela que é uma tendência “em crescimento” tanto a nível local como global.

“Há algumas variações [em relação ao global] mas é generalizado que a compra de produtos de marca própria é a que está a ter, em todas as geografias, o aumento maior. A forma como os consumidores estão a tentar encontrar maneiras de poupar é precisamente em migrarem para as marcas próprias“, explica Sérgio Ferreira, exemplificando também com o caso dos Estados Unidos, onde 67% dos consumidores concordam que os produtos de marca própria os estão a ajudar a poupar dinheiro.

Esta é assim uma “tendência incontornável, naquilo que é o comportamento de compra. As marcas próprias estão a sair claramente beneficiadas desta situação de elevadas taxas de juro com impacto naquilo que é uma menor disponibilidade financeira dos consumidores“, afirma.

Já no que diz respeito a diferenças de consumo entre as diferentes gerações, Sérgio Ferreira explica que estas foram mais evidentes na participação em eventos de vendas – como a Black Friday e a Ciber Monday – onde 75% dos consumidores da geração Z (idades inferiores a 26 anos) disse que ia participar ativamente, número que diminui para 59% entre a geração X (45 aos 60 anos) e 57% nos baby bommers (nascidos em 1946-1964).

As pessoas mais velhas estão claramente muito mais conservadoras relativamente à situação económica e ao seu comportamento de compra relativamente aos mais jovens, que estão mais otimistas.

Sérgio Ferreira

Partner, consumer products and retail leader da EY Portugal

Por outro lado, enquanto 54% dos baby bommers disseram que iam gastar mais ou menos o mesmo do que nos anos anteriores e 29% que iam gastar menos, entre a geração Z só 6% afirmaram que iam comprar menos, com 44% a dizer que iam gastar mais e 40% mais ou menos o mesmo.

As pessoas mais velhas estão claramente muito mais conservadoras relativamente à situação económica e ao seu comportamento de compra relativamente aos mais jovens que estão mais otimistas“, diz Sérgio Ferreira.

Quanto ao método de compra, 48% dos inquiridos compram igualmente no online e em loja, dados que “apoiam claramente a necessidade de os retalhistas criarem sistemas omnicanal e cada vez mais orientados e liderados por dados“, segundo o consumer products and retail leader da EY Portugal.

“O que sentimos é que o estudo sinaliza claramente que os consumidores estão focados em comprar as melhores ofertas, por isso em vez de priorizarem experiências – ligados à marca ou conveniência – claramente estão à procura dos melhores negócios. E daí esta situação do omnicanal e do online estar a ganhar muita importância. Muitas vezes não é só fazer a compra no online é também poder fazer pesquisa e encontrar a melhor oferta disponível”, diz Sérgio Ferreira.

Na verdade, Portugal “denota claramente uma adoção da tecnologia no estilo de vida dos consumidores muito elevada“, a qual é feita em especial através das apps de smartphone, adianta o partner da EY Portugal.

Os consumidores estão de forma crescente a suportar-se na tecnologia sempre que esta facilita a sua vida, lhes poupa dinheiro e tempo, e porque lhes permite comprar e trabalhar a partir de casa. E depois ainda existem alguns consumidores que apontam a vantagem de diminuir a sua pegada ambiental, embora num número mais reduzido”, adianta.

Segundo Sérgio Ferreira, uma grande maioria dos consumidores portugueses afirma utilizar estas tecnologias, em especial as wallets, para gerir o orçamento familiar. Encontrar sugestões de séries, filmes e música e procurar marcas alternativas de alguns produtos são outros dos principais usos dados pelos portugueses à tecnologia no que diz respeito ao consumo, assim como utilizam cada vez mais aparelhos como smartwatches para monitorizar a sua saúde.

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