A metamorfose do consumidor que está no comando

  • Marlene Gaspar
  • 8 Fevereiro 2024

Aliar a tecnologia à emoção vai permitir resolver os receios que a IA está a despoletar e vermos que esta nova “invenção da roda” vai-nos permitir fazer melhor o nosso trabalho.

“Imagina um mundo onde todos os clientes são maravilhosos, onde poderíamos produzir o que quiséssemos sem restrições, onde todos tínhamos liberdade para realizar todas as nossas fantasias sem sermos impedidos por clientes tediosos.” O que faríamos?

Esta é a provocação que Paul Arden faz no seu livro “It’s not how good you are, it’s how good you want to be”. Concluímos que provavelmente faríamos um trabalho menos interessante, porque o desafio e a frustração são ingredientes que potenciam a criatividade e nesse cenário hipotético não fariam parte.

Nós, os profissionais de marketing e de comunicação, procuramos incessantemente conhecer as necessidades do consumidor, saber o que quer, que temas lhe interessam e como nos podemos conectar com ele e, por esse motivo, iniciamos o ano com uma análise de tendências. A sensação que nos dá é que estamos muitas vezes um passo atrás embora tenhamos o propósito de estar três passos à frente, antecipando-nos. Este novo consumidor, reinventa-se permanentemente e consegue sempre surpreender.

Então onde se encontra o consumidor em 2024? Mais do que nunca, está no comando. Está a repensar os seus próprios valores, as suas formas de consumir e de escolher, a explorar novas opções e formatos que satisfaçam o seu novo estilo de vida. A tecnologia avança a uma velocidade avassaladora e simultaneamente, o consumidor apela por um estilo de vida mais calmo, onde o bem-estar, o desconectar para conectar, o (re)carregar energias e a saúde mental são palavras de ordem. Não é uma metamorfose Kafkiana, mas o ritmo da transformação é mais acelerado que nunca.

No Forecast Marketing 2024 da LLYC destacamos infinitas possibilidades que a tecnologia nos proporciona, sendo cautelosos para não deixarmos de ser humanos, emocionais, envolvidos e comprometidos. A maior das mudanças que sentimos é que é definitivamente o consumidor que está a comandar as hostes.

E quais são as principais preocupações do consumidor atual? Em relação à sustentabilidade, bandeira que encabeçou as preocupações dos últimos anos, os consumidores começam a manifestar um sentimento de impotência perante os problemas ambientais e com as narrativas pessimistas e catastróficas sobre o meio ambiente, podem levar ao que se denomina a “fadiga do apocalipse”. Há uma oportunidade para as marcas poderem abordar estas questões de forma mais conectada com a realidade das pessoas, evitando discursos apocalípticos e oferecendo ferramentas práticas para que sintam que podem fazer a diferença nas suas vidas. O desafio é encontrar formas de se conectar com as pessoas no seu dia-a-dia, capacitando-as a realizar ações tangíveis e que tenham impacto real.

Uma outra bandeira que exige a nossa atenção como marketers é a diversidade, equidade e inclusão que cada vez mais deve atuar de dentro para fora. De acordo com a ONU, 67% da população mundial tem acesso à Internet e passamos mais de uma quarta parte do dia a navegar nela. As marcas devem usar as mesmas regras de inclusão do mundo físico, no mundo digital, garantindo que o mundo virtual reflita a diversidade do mundo físico, transferindo o seu compromisso para estes ambientes.

A exigência da geração mais jovem faz com que as marcas tenham de abraçar vários compromissos e exigem-lhe este papel pedagógico. A geração Z, a primeira geração nativa digital, é também conhecida pelo seu compromisso com a causa social e o ambiente, e pelo seu desejo de ter um impacto positivo no mundo. As marcas devem ter em conta o contexto em que esta geração cresceu nos anos de uma crise permanente da qual ainda não saímos. Isto teve um impacto direto na forma como veem a vida e, também, na forma como usam o seu dinheiro. 75% da geração Z acredita que as compras sustentáveis são mais importantes do que as marcas, sendo a percentagem mais elevada das diferentes gerações, de acordo com um estudo realizado pelo First Insight e Baker Retailing Center da Wharton School da Universidade da Pensilvânia.

Por outro lado, o seu poder de compra é comparativamente menor ao de outras gerações, como os Millennials, o que os impede de realizar compras sustentáveis. No entanto, 34% dos inquiridos da geração Z afirmaram ver de forma positiva as marcas de fast fashion, em comparação com 47% dos participantes da geração Millennial, de acordo com um estudo realizado pela Untold Insights no Reino Unido.

O equilíbrio entre a acessibilidade e a sustentabilidade é o desafio das empresas para conquistar as gerações mais jovens que romperam com os convencionalismos.

A empatia é um eixo cada vez mais relevante dada a instabilidade em todas as facetas da vida: a economia, a sociedade, a política que se refletem nas suas emoções. É surpreendente e pouco otimista que o relatório Gallup Global Emotions tenha encontrado níveis invulgares de infelicidade (com 33 pontos, o valor máximo desde a criação do relatório em 2016) e que outras fontes como o Edelman Trust Barometer afirmem que o otimismo económico colapsou, com apenas 40% dos inquiridos a afirmar que a família viverá melhor nos próximos 5 anos (um resultado 10 pontos mais baixo em comparação com 2019).

E que papel podem ter as marcas face a estes sentimentos? Existe não só a necessidade, mas também a oportunidade, de realizar ativações de marca que ecoem nas diferentes comunidades e que, além disso, forneçam ferramentas para que os consumidores naveguem nas turbulências e possam lidar com estes sentimentos negativos, ajudando-os a sentir-se seguros. Segundo o relatório “The future 100” da VML Intelligence, dois terços das pessoas procuram uma relação emocional com as marcas que compram. Querem experiências diferenciadoras, valorizam a comunidade e anseiam por mais paixão. E para poder entregar isso, ouvir é o imperativo para desenvolver empatia por este consumidor que está no comando: 70% a nível global exigem que as marcas os ouçam para compreenderem as suas necessidades.

E se estes exigem às marcas que os ouçam, as marcas têm a oportunidade para serem ouvidas. A proliferação do áudio, com podcasts para ouvir em alternativa à leitura, são um bom aliado. Como profissionais de marketing, temos de reconhecer e capitalizar a crescente preferência por estes conteúdos facilitados pela conveniência de ouvir e realizar outras atividades. É uma espécie de revival do “second screen”, sem o ecrã e que confirma que afinal o multitasking é possível. Estes novos formatos permitem criar relações duradouras com os consumidores, pois este auge imparável do áudio digital pode converter-se numa revolução na forma como consumimos conteúdos.

2024 traz-nos enormes desafios e por isso é gratificante trabalhar em comunicação e marketing – uma ciência não exata que nos desafia permanentemente e que nos demonstra que aliar a tecnologia à emoção vai permitir resolver os receios que a IA está a despoletar e vermos que esta nova “invenção da roda” vai-nos permitir fazer melhor o nosso trabalho. Vamos a isso?

  • Marlene Gaspar
  • Diretora-Geral da LLYC

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

A metamorfose do consumidor que está no comando

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião