Inovação e relevância: As melhores armas para dar a volta à crise
Ser o mais barato ou o mais acessível nunca é mais do que um argumento de curto prazo. A corrida longa é a do preferido, a do desejado, a do pedido pelo seu nome próprio.
Pode falar-se em crise no universo do grande consumo quando as vendas continuam a crescer a dois dígitos? Sim, pode-se, quando se olha com um pouco mais de atenção para o que fica por baixo da espuma gerada pela inflação.
Por estes dias, o olhar da opinião pública está focado na questão da inflação nos produtos alimentares. E seja ou não o mais correto o ângulo que está a ser colocado sobre este tema, o problema existe, é complexo e tem consequências óbvias sobre o mercado.
O forte crescimento dos preços (e dos custos) e, mais ainda, a redução do poder de compra resultante do não crescimento equivalente da componente remuneratória, afetam o orçamento das famílias e a sua capacidade de comprar.
Obviamente, isto não afeta apenas o setor do grande consumo. Mas, quando falamos de produtos do dia-a-dia e que implicam compras repetidas e de rotina, há sempre, pelo menos num primeiro momento, alguma resistência à sua redução. Afinal, há outras despesas que podemos ou não fazer quando precisamos de conter os nossos orçamentos e muitas delas implicam valores mais significativos. Assim, nestes momentos de maior aperto financeiro, é usual verificar que, apenas um pouco mais à frente, o efeito da conjuntura impacta as compras alimentares e de outros produtos de supermercado.
E, de alguma forma, também assim ocorreu nesta sequência de períodos anómalos, abrangendo pandemia, disrupção das cadeias de abastecimento e eclosão do conflito no Leste Europeu. Em boa verdade, os setores da alimentação, bebidas, higiene pessoal e do lar, resistiram genericamente bem (mesmo havendo significativas assimetrias entre famílias de produto) ao contexto e, seguramente, bem melhor que diversos outros setores de atividade.
Mas, quando a crise chegou, chegou em força e de forma bem sentida por consumidores e operadores económicos.
Assim, especialmente a partir de setembro último, as campainhas começaram a soar, de forma cada vez mais estridente. Vendas em volume em compressão, vendas de produtos de valor cada vez mais baixo, vendas crescentes dos produtos das marcas da distribuição não acompanhadas pelas das de marcas de fabricante.
A evolução tem sido muito rápida, muito profunda e muito dolorosa. Mais ainda, quando as estruturas de custos já muito sobrecarregadas em 2022, não param de ser agravadas.
Está a gerar-se, em muitas empresas, um estado de preocupação crescente e de quase depressão. Porque, em cada mês, os dados são mais penalizantes que no anterior. Porque, apesar dos sinais aparentemente positivos que surgem a nível mais macro, os respetivos impactos tardam em chegar às suas estruturas de custos. Porque os consumidores, por manifesta incapacidade económica, se vão afastando dos produtos de valor mais relevante. Porque se sente no consumidor uma progressiva revolta e se assiste a uma crescente efervescência social. Porque, em suma, se sente que se entrou num túnel escuro e comprido e não se vislumbra (ainda) luz no seu final.
A economia funciona como um pêndulo e por muito distante que isso neste momento surja, a cada crise económica se seguirá uma recuperação, a cada quebra do mercado se seguirá um novo crescimento. Pode demorar seis meses ou dois anos, mas ela chegará.
E as empresas e as marcas, independentemente das dificuldades atuais, têm que se preparar já para dizerem ‘estou presente’ nesse momento.
Logicamente, é preciso sobreviver ao presente para viver o futuro e, nesta altura, esse é o exercício e o equilíbrio mais difícil.
É preciso não ceder à tentação de comprimir e minimizar a atuação nesta fase mais complexa, sob pena de não se estar preparado para os desafios que mais à frente surgirão. Usando uma linguagem futebolística, uma equipa que se prepara para não descer de divisão, não pode – em dois dias – querer vencer um campeonato.
Por isso, é preciso ter sempre presente que há corridas de 100 metros que temos que enfrentar (e tentar vencer) todos os dias, mas que temos que continuar a fazer a nossa ‘maratona’, não abdicando daquilo que nos distingue, daquilo que constrói o nosso valor: qualidade, inovação, comunicação, sustentabilidade, responsabilidade. Sim, os budgets podem ser mais curtos, mas a opção de verter tudo para preço e prateleira, pode dar-nos oxigénio momentâneo mas não nos deixa respirar normalmente.
Por outro lado, há que conseguir destacar-se do meio da multidão, emergir do meio do ruído, e tal só é possível com relevância. Uma buzzword quase tão vulgarizada como a inovação ou a sustentabilidade, mas nem por isso – passe a redundância – menos relevante.
Hoje, tudo o que fazemos, deve ter sempre implícito melhorar a felicidade e o bem-estar dos nossos públicos e dos nossos consumidores. Ser o mais barato ou o mais acessível (affordable) nunca é mais do que um argumento de curto prazo. A corrida longa é a do preferido, a do desejado, a do pedido pelo seu nome próprio.
E temos que ver a pessoa para lá do consumidor. Hoje, cada um de nós é bem mais do que um cidadão com carteira. E é com a pessoa, mais do que com o consumidor, que as marcas e as empresas têm de conversar. Com o consumidor a relação é fundamental, mas é essencialmente transacional. Com a pessoa, a comunicação deve ser aspiracional e empática, tentando sempre mostrar que uma marca é bem mais do que um produto e mais ainda do que o preço respetivo.
É verdade que todos atravessamos maiores dificuldades e é também verdade que somos mais criteriosos com o dinheiro que gastamos e com o preço do que compramos. Mas isso não significa que, de forma transversal a todos os grupos socioeconómicos ou a todas as faixas etárias, não tenhamos produtos e marcas que não abdicamos de comprar. Porquê: porque, se calhar de forma diferente para cada um de nós, eles são relevantes nas nossas vidas.
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