O que não me sai da cabeça?
O velho adágio “um Homem culto é um Homem livre” pode e deve ser atualizado para “um Homem culto e informado é um Homem livre”.
A pergunta que escolhi como título para estas linhas é, a cada semana, a última questão respondida pelos autores e convidados de um conhecido podcast de análise política. O que não me sai da cabeça neste início de ano é a crescente falta de esperança que parece estar a instalar-se em quase todas as sociedades contemporâneas. A falta de esperança tem sido, simultaneamente, a causa e a consequência para o crescimento da intolerância, da polarização e da radicalização em quase todos os ambientes sociais, políticos e profissionais.
É muito arriscado tentar identificar o gatilho para a falta generalizada de esperança, mas arrisco três considerações que considero serem muito relevantes na sua explicação. A primeira é a passividade escandalosa com que os decisores enfrentam a resolução dos problemas resultantes das alterações climáticas. Depois é preciso evocar o cinismo e a tibieza perturbadora com que “os senhores do mundo” lidam com as atrocidades das guerras na Ucrânia e em Gaza. Por fim, é necessário lembrar os impactos da constatação por todos sentida da fragilidade da condição humana com o irromper da pandemia do Covid-19.
A ideia crescente de que o mundo se transformou num lugar cada vez mais incerto, inseguro e incompreensível, tem sido terreno fértil para o crescimento dos populismos a ponto de, aqui e ali, se questionar o benefício inegável da globalização e dos avanços tecnológicos que a ela estão associados. Nem mesmo a certeza de nunca se ter vivido tão bem e com tanto conforto como hoje, e de beneficiarmos de uma distribuição da riqueza sem igual na história da humanidade, fazem calar as vozes do apocalipse. Porquê? Porque a desinformação, entendida como a disseminação de notícias falsas ou enganadoras, tem cumprido o papel principal no alastrar da confusão que se instalou, condicionando as escolhas que se fazem e os caminhos que se elegem. Seja intencional ou não, a desinformação provoca uma verdadeira pescadinha de rabo na boca que é essencial romper: a desesperança é amplificada pela desinformação, que por sua vez eleva os populismos, que se alimentam do desalento e da própria desesperança.
Talvez por isto a desinformação esteja no centro das preocupações do mundo, saltando este ano para o primeiro lugar dos riscos de curto prazo identificados pelo World Economic Forum no relatório sobre 2024. A desinformação é hoje a maior inimiga do progresso porque diminui a liberdade individual. É o alimento da intolerância, dos radicalismos e da polarização extremada, condiciona escolhas esclarecidas e conscientes, e assumiu um papel de relevo no estado das coisas. O velho adágio “um Homem culto é um Homem livre” pode e deve ser atualizado para “um Homem culto e informado é um Homem livre”.
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