Metalurgia e metalomecânica preferem incentivos fiscais ao investimento à baixa do IRC

"Precisamos dramaticamente de investimento em Portugal. Só isso é que nos pode elevar para outro nível, com formação das pessoas” e inovação “em paralelo”, afirma o presidente da AIMMAP, Vítor Neves.

O presidente da Associação dos Industriais Metalúrgicos, Metalomecânicos e Afins de Portugal (AIMMAP), Vítor Neves, considera que é mais importante aumentar os incentivos fiscais ao investimento das empresas do que reduzir a taxa de IRC.

“Para mim, era muito mais importante haver benefícios fiscais ao investimento do que baixar o IRC. Para ser claro: precisamos dramaticamente de investimento em Portugal. Só isso é que nos pode elevar para outro nível, com formação das pessoas. A inovação está ali a correr em paralelo”, afirmou Vítor Neves, na conferência “Aço, Quotas e Competitividade: A Hora da Metalomecânica”, organizada pelo ECO.

O dirigente associativo diz que estão a ser tomadas decisões erradas em termos de políticas públicas, nomeadamente ao nível da despesa, que é gerida à custa da despesa corrente e permanente do Estado, com prejuízo para o investimento.

Não vemos, do lado do setor público, impacto do PRR. (…) Só este ano estamos a chegar aos 10 mil milhões [de euros de investimento público], que tínhamos em 2010, mas tem lá quatro mil milhões de PRR”, alertou Vítor Neves, defendendo que é necessário inverter este modelo e deixar de financiar despesa corrente com o Orçamento do Estado em detrimento do investimento.

Questionado sobre se houve perda de oportunidade para apoiar mais as empresas nacionais quando a opção foi suprir carências do Estado com a bazuca europeia, tendo em conta a falta de elegibilidade de algumas regiões, Vítor Neves retorquiu que sim.

O presidente da Comissão Nacional de Acompanhamento do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), Pedro Dominguinhos, mostrou-se “totalmente de acordo” com a ideia de que Portugal precisa de um pipeline de investimento e não pode “fazer investimento aos solavancos”, sem um programa estável de longo prazo. E enumerou três programas do PRR com impacto: agendas mobilizadoras, onde a indústria tem “sido capaz de entregar”; a indústria 4.0, porque significa “modernização tecnológica”, e a descarbonização.

Vítor Neves e Pedro Dominguinhos foram também unânimes na previsão de que 2027 será mais exigente do ponto de vista orçamental, com uma possível depressão do investimento. Ainda assim, o presidente da Comissão Nacional de Acompanhamento do PRR evidenciou-se mais otimista, no painel intitulado “Cadeia de valor, investimento e modernização industrial”, moderado pela editora-executiva do ECO, Mónica Silvares.

Porquê? A junção de diferentes players da cadeia de valor no mesmo consórcio, desde a investigação do projeto ao seu desenvolvimento e comercialização, está a fazer com que “algumas centenas” de empresas coloquem produtos inovadores no mercado e “a traduzir-se neste momento” no aumento das exportações. Ou seja, são projetos e investimentos que arrastam outras empresas e criam boas oportunidades para o crescimento futuro.

Pedro Dominguinhos, Presidente da Comissão Nacional de Acompanhamento do PRR

Pedro Dominguinhos considera que o exemplo mais paradigmático, entre as agendas mobilizadoras do PRR para a indústria, é a “Produtech R3”, por ser a maior, ter mais de 100 parceiros e uma configuração que caracteriza de “particularmente interessante” por juntar, em cada um dos projetos, centros de investigação, universidades ou centros tecnológicos, “produtores de equipamento e tomadores de tecnologia”, normalmente, em dois setores diferentes.

“Percebemos que há um impacto significativo. Ontem [terça-feira] estive a falar com a Eurofio, que é a líder da agenda mobilizadora INOV.AM, e estão a conseguir produzir moldes de forma aditiva. Isto significa uma alteração profunda do que é tradicionalmente a indústria de moldes e há ligação à indústria de equipamentos para se poder comercializar essas soluções no mercado”, exemplificou ainda.

Estamos a produzir o carro elétrico na Stellantis com o apoio do PRR. Atrevo-me a dizer que se não fosse o PRR dificilmente teríamos a produção de veículos elétricos com esta dimensão na fábrica da Stellantis. Ou, noutra agenda mobilizadora, a Forvia de Nelas, que está selecionada para o novo carro elétrico, numa joint venture entre a Stellantis e uma empresa chinesa, a produzir em Espanha e está na shortlist para o novo carro da Autoeuropa.

Pedro Dominguinhos

Presidente da Comissão Nacional de Acompanhamento do PRR

Na perspetiva do presidente da Comissão Nacional de Acompanhamento do PRR, até havia capacidade de as empresas nacionais absorverem mais dinheiro. “Se considerarmos, por exemplo, a indústria 4.0, onde estamos a falar de investimentos até 200 ou 300 mil euros, o tecido empresarial é capaz de absorver”, garante, justificando essa posição com muitas candidaturas que não obtiveram verba mas tinham projetos.

Ademais, há um efeito de arrastamento das PME e criar parcerias que de outra forma não aconteceriam. Na metalomecânica, as agendas mobilizadoras estão a permitir que as empresas que estavam só focadas no setor automóvel comecem a “transferir-se” para o espaço, a saúde ou os drones, ilustrou.

Pedro Dominguinhos fez ainda referência a empresas que, não sendo beneficiárias diretas do PRR, acabaram por beneficiar indiretamente do plano para alavancar investimentos na produção, entre as quais está a construtora Casais. O grupo liderado por António Carlos Rodrigues, cuja agenda mobilizadora não foi aprovada, “está neste momento está a fornecer um conjunto significativo de residências universitárias e de habitação, a aumentar a sua linha de industrialização e vai fazer investimentos significativos na área da industrialização”.

Para o presidente da AIMMAP, a ambição deve ser maior. É necessário implementar uma estratégia concertada na Europa para a reindustrialização, investir na competência dos trabalhadores e em vender “melhor” (mais caro). “O que estamos a ver do ponto de vista das tarifas é o exemplo paradigmático de como as coisas são tratadas de uma forma casuística, absolutamente ad-hoc, sem pensar nas consequências nem para a própria indústria”, denotou Vítor Neves.

O objetivo era em 2020 a indústria ter um peso de 20% do PIB europeu. Estamos em 11-12%. O tema da reindustrialização tem sido um chavão ao longo dos últimos anos, depois da pandemia, na guerra da Ucrânia, e continua a ser hoje. Mas a Europa não tem nenhuma política nem estratégia relevante do ponto de vista da industrialização.

Vítor Neves

Presidente da AIMMAP

A AIMMAP deixou ainda um apelo aos associados: “Gostaria que tivéssemos mais campeões de crescimento. Precisamos de empresas líderes e crescer por aquisição deve ser um caminho a seguir”.

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