Entre o play e o verde-código-verde

  • António Fuzeta da Ponte
  • 13 Abril 2023

E as marcas, já perceberam todas que não voltamos a 2019? Desenganem-se se pensam que quando os custos aumentam, o que salva é o preço baixo.

No outro dia perguntaram-me como anda o consumidor a reagir a tanta mudança. A resposta está na pergunta. Anda a reagir, a adaptar-se. Como sempre fizemos.

Já passámos o inverno e confirma-se: a pandemia ainda cá está, porque já não está. Está cá porque se sente o que nos deixou: não queremos mais máscaras, não queremos mais aniversários em Zoom, não queremos mais confinamentos anémicos, não queremos mais não fazer coisas. E depois da pandemia, quando o céu deveria ficar de novo azul, veio a guerra. A Europa tem guerra à porta, já passou um ano dessa terrível realidade e agora tratamos a inflação como um primo distante que voltou de viagem e crava-nos dormida. Quando se irá embora?

Ainda assim, parece que tanto a pandemia como a guerra nos deram uma imunidade às adversidades. Não queremos mais ser privados do que o covid ameaçou tirar.

Queremos e estamos de volta às lojas, às viagens, aos restaurantes, aos festivais. As salas esgotam e o metaverso foi uma festa em que choveu e ninguém apareceu.

Queremos ir aos esgotados Coldplay, enchemos o Algarve e as portagens da autoestrada nos dias de sol. Os concertos de verão prometem casa cheia, todos os dias, para qualquer cartaz ou preferência.

E no nosso smartphone estamos a ver mais TikToks do que nunca, o streaming traz mais pares de olhos para a frente das televisões do que alguma vez. Vemos séries nos intervalos de podcasts, vemos TV com o smartphone na mão. E um humorista traz-nos em 15 minutos as notícias da semana inteira, para que não percamos tempo em noticiários de hora e meia. E passamos de novo da TV para o telefone, para vermos um anúncio de 6 segundos que não é “skipável” para depois vermos um live shopping de 2 horas que só acontece hoje.

Estamos plenos digitais a viver em modo omnicanal. E absorvemos conteúdos de qualquer formato, duração ou canal, desde que gostemos. Quando gostamos pesquisamos, comparamos, tornamo-nos peritos em modo fast forward, tudo para ver ou ter o que nos dá prazer. Já estamos outra vez felizes e se calhar novamente sem saber porquê.

E as marcas, já perceberam todas que não voltamos a 2019? Se é verdade que estamos ávidos consumidores de conteúdos, estaremos igualmente ávidos para o retalho, para a banca, para a moda ou setor automóvel? Deixará a inflação que a nossa vontade passe do “play” para o “verde-código-verde”?

Entendam as marcas que mais que nunca a mensagem importa, o conteúdo importa, a experiência faz toda a diferença. Desenganem-se se pensam que quando os custos aumentam, o que salva é o preço baixo. Não, já não queremos só o low cost. Queremos o que gostamos, somente isso. E envolvemo-nos. Porque no que gostamos, tornámo-nos peritos e exigentes.

Exigimos que não seja só um produto, que não seja só um serviço, que nos conte uma história, que nos envolva, que nos faça voltar. Ah, e já agora, se chegar mais rápido e sem portes, melhor ainda. Podem entregar ontem?

  • António Fuzeta da Ponte
  • Diretor de marca e comunicação da Nos

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