O risco de ser um CEO ativista
A questão para um milhão de dólares é “Qual é o formato e a medida certa para o ativismo de um CEO?”. Equilíbrio e ponderação farão sempre parte da resposta.
O recente caso da saída de Paddy Cosgrave do Web Summit é paradigmático da forma como os CEO podem impactar a reputação das empresas e mesmo colocar a sua continuidade em causa. Bastou um X. Um X que irritou Israel, que não só cancelou a sua presença no Web Summit, como terá feito pressão global para que as grandes multinacionais como a Google, Amazon, Meta, IBM, Intel, Siemens e um conjunto expressivo de investidores israelitas também decidissem cancelar a sua presença no evento. E penso que não é segredo nenhum o poder que Israel tem nestas empresas globais.
Não está em causa a liberdade de expressão de Paddy Cosgrave, nem o conteúdo do seu post. Também não está em causa a reação de Israel, especialmente quando se depara com uma equação impossível na guerra contra o Hamas e tem pressões políticas globais de todos os lados. Este artigo não pretende falar sobre quem tem ou não razão, mas sim das consequências de um CEO ser mais vocal ou mais mediático e exprimir as suas opiniões pública e indiscriminadamente. Especialmente das consequências dessa liberdade de expressão para a empresa que lidera, que neste caso foram dramáticas.
Um equilíbrio perverso, se pensarmos no que é esperado e aceite de um líder. Segundo um estudo da Weber Shandwick, um terço do público em geral vê com bons olhos ou exige mesmo que os CEO sejam ativistas. Nos Estados Unidos, por exemplo, os CEO tendem a ser mais vocais e mais mediáticos, sendo mesmo esperado que assumam posições relativamente a determinados assuntos, sobretudo os que estão na agenda, como a emergência climática, igualdade salarial entre géneros, racismo, sustentabilidade e ESG, responsabilidade social, entre outros. A Nike, por exemplo, tem ganho muito com o seu ativismo, ao abraçar determinadas causas sociais, nomeadamente com a promoção de campanhas antirracismo há uns anos a esta parte. Outro exemplo, seguramente mais polémico, é o de Elon Musk, cujas intervenções têm eco não apenas no país e na sua economia, mas também à escala global. Goste-se ou não, é perfeitamente discutível e teria também de ser analisado à luz de várias dimensões, como exerce a sua influência.
Mas se é certo que o ativismo dos CEO em algumas matérias estruturantes pode beneficiar as empresas que lideram e pode até aumentar a visibilidade e o valor intrínseco em termos de remuneração de um CEO, é igualmente certo que temas polémicos e complexos que nada dão a ganhar às empresas devem simplesmente ficar de fora do ativismo do CEO. Foi o caso de Cosgrave. O ativismo de um CEO não pode ser apenas um tema de consciência social. Não pode ser guiado pela intuição, sem ponderar os riscos associados, pois o preço a pagar pode ser demasiado elevado. Há empresas globais que estudam cada tema minuciosamente antes do CEO ou da própria empresa tomarem uma posição. Isso deve ser feito em todas as causas defendidas e apoiadas pelas empresas. E em cada posição deve ser equacionado: “whats in it for my company” e “what do I have to loose”. Cosgrave não o fez, o Web Summit não o fez. Paddy Cosgrave não tinha nada a ganhar para a empresa com a posição que tomou (a não ser consciência pessoal) e deitou muito, tudo, a perder… não ponderou o risco das suas posições públicas e teve de arcar com as consequências pessoais de ter de se demitir para não afetar ainda mais a reputação da sua empresa. E a verdade é que, nesta fase, apenas podemos supor e antever que efeitos terá para o Web Summit a médio/longo prazo.
Assim, a questão para um milhão de dólares é “Qual é o formato e a medida certa para o ativismo de um CEO?”. Equilíbrio e ponderação farão sempre parte da resposta.
De acordo com estudos desenvolvidos pela RepTrack Company, a reputação dos CEO é medida por quatro grandes parâmetros ou dimensões: influência na sociedade, responsabilidade, liderança e gestão. O perfil mais adequado, segundo os últimos inquéritos de opinião, inclui: ser responsável, ser vocal, ser visível, apoiar causas que são importantes para o mundo e para a empresa e ser mais empático (ou humano). Tudo isto é muito relevante e pode ser altamente gratificante, mesmo do ponto de vista financeiro, em particular para os norte americanos. Por cá, menos… e talvez seja por isso que os nossos CEO sejam muito low profile…
Porque no final de contas, é um exercício difícil este de não se deixar comandar pelo impulso e pela opinião pessoal. Uma vez mais, tudo se resume a ponderação, análise estratégica do risco reputacional e da marca que se pretende deixar como CEO.
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