Olá! A marca Portugal, sou eu!
Antes de levarmos a nossa marca ao tapete devemos parar, refletir e decidir qual alinhamento que queremos para o grande festival da marca Portugal. Ou melhor, deixar de fazer da marca um festival.
Vivemos em democracia há 50 anos, mas continuamos aprisionados à falta de liberdade que sentimos quando se trata de afirmar a nossa identidade.
Somos abertos a tudo o que vem de fora, por pouco ainda não mudámos o canhão da Nazaré para MacNamara Canyon. No Lidl (marca alemã) de Tavira, na semana passada, o peixe fresco que prevalecia era o salmão. Na prateleira das frutas de Portugal, que me impediram de fotografar, estavam (fora do sítio, segundo disseram) bananas da Colômbia e mais ao lado, maçãs do Brasil e do Chile. Nada de novo é a globalização, dirão; mas agora disfarçada de Nacional, pois quase ninguém lê as letras pequenas da origem.
Mas o que eu queria mesmo era comprar lingueirão e, naturalmente, não havia em lado nenhum; mesmo para comer fora foi preciso recorrer a um circuito de influência, quase segredo, para ser só português, em Portugal.
A promessa de desenvolvimento económico, que está há vinte anos por cumprir, tem sido a desculpa para quase tudo e tem levado quase à extinção os nossos recursos endógenos, às nossas marcas e, no sul de Portugal, a grande parte da beleza do Algarve. A arquitetura de açoteia e arestas sensuais, deu lugar a um desenho de linhas rígidas onde se mistura a vontade de ser moderno com a pena de não ser estrangeiro, e ficamos pelo indistinto que equaliza a nossa identidade.
Já em Loulé, recebem-nos com um simpático Hej no IKEA (olá em Sueco), marca que tem uma notável política de alinhamento identitário, quer ao nível dos conteúdos alimentares, quer ao nível das marcas dos seus produtos, assumindo-se como principal embaixador da Suécia, levando a sua cultura e a sua língua ao mundo.
Mas e quem são as marcas embaixadoras da nossa língua? E da nossa cultura? E a marca Portugal, que futuro terá se for sendo permanentemente enxertada de tantos interesses, ainda que legítimos, dos outros?
Nós, que temos séculos de expansão pelo mundo, recebemos agora o mundo em Portugal.
Fazemos questão de afirmar a nossa hospitalidade e de aprender a dizer olá em todas as línguas. Mas e nós, os Portugueses? Será que não deveríamos pensar um pouco no queremos para o nosso futuro?
A marca de Portugal é um projeto com quase 900 anos. A cada geração cumpre a responsabilidade de escrever um novo capítulo desta epopeia lusíada. Somos hoje um palco muito atrativo para todos, as sul coreanas NewJeans gravaram o seu novo hit SuperShy em Lisboa e até sua santidade, o nosso tão querido Papa Francisco, que é cabeça de cartaz do maior festival da juventude de sempre, faz com que o artista Bordalo II e o Presidente da Câmara de Lisboa Carlos Moedas troquem performances artísticas no TikTok, cada um defendendo o seu tapete.
Pois antes de levarmos a nossa marca ao tapete devemos parar, refletir e decidir qual alinhamento que queremos para o grande festival da nossa marca Portugal. Ou melhor, que temos de deixar de fazer da nossa marca um festival. Temos de “des-salmãonizar” as peixarias. Temos de dar um passo atrás neste desenfreado processo de modernização desgovernada que, por exemplo, reduz a nossa história à escravatura e que faz da marca de Portugal uma oportunidade predatória para as histórias dos outros.
Temos de ter coragem para deixar de ser um país de franchisings: temos de criar coisas novas e nossas; de colocar as mãos na terra e sentir as nossas raízes, de tomar um medronho caseiro num “mosquito” do café Agapito ali perto da Galé, e de sentir que muito deste “Portugal” moderno não nos serve, pois é afinal o antigo dos outros que procura novos sítios para estragar.
Não estraguemos nós o futuro pela falsa ilusão de que o nosso passado não serve para inspirar o nosso presente! Aceitemos o desafio (temporário) de “des-modernizar” a marca de Portugal, para sermos capazes de realinhar a nossa identidade com o futuro.
E os outros? Continuarão a ser todos muito bem-vindos e a ser recebidos com um enorme, afirmativo, orgulhoso e bem português: olá! A marca Portugal, sou eu! Uma das mais antigas e soberanas marcas-país, do mundo!
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