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Assembleia-geral da Global Media é esta segunda-feira. O que está em causa e como se chegou até aqui?

Rafael Ascensão, + M,

À assembleia-geral antecedeu-se o acordo para a venda de alguns títulos, a demissão do CEO que representava o fundo que controlava o grupo e o princípio de decisão da ERC. Como se chegou até aqui?

Em mais um episódio da história recente e conturbada do Global Media Group, tem lugar esta segunda-feira a assembleia-geral pedida em janeiro pelos acionistas Kevin Ho e José Pedro Soeiro, que em conjunto representam 49,75% do capital social do grupo. O que está em causa e como se chegou até aqui?

Um dos principais objetivos que levou à marcação da assembleia passava pela destituição do conselho de administração da Global Media e do seu CEO, José Paulo Fafe, que, entretanto, se antecipou e demitiu “por considerar estarem esgotadas as condições para exercer essas funções”.

José Paulo Fafe era o representante do World Opportunity Fund (WOF), fundo de investimento com sede nas Bahamas (um chamado “paraíso fiscal”) que passou a deter 51% do capital social da Páginas Civilizadas, a qual (ainda) controla, diretamente e indiretamente, 50,25% da Global Media.

Além das Páginas Civilizadas (posição calculada a partir da soma da detenção direta de 41,51% e da indireta, através da Grandes Notícias Lda, de 8,74%), o capital social do GMG é detido por Kevin Ho (29,35%) e por José Pedro Soeiro (20,40%).

Foram várias as dúvidas e questões levantadas sobre a titularidade do fundo de investimento, o que motivou requerimentos e pedidos de esclarecimentos. A Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) abriu um processo no início de janeiro e entretanto deu a conhecer ao início da noite da passada quinta-feira que o World Opportunity Fund tinha 15 dias para tirar as dúvidas ao regulador sobre a falta de transparência quanto à titularidade da sua participação qualificada, caso contrário ficará “imediata e automaticamente suspenso o exercício do direito de voto“.

“Não sendo sanadas as dúvidas, a ERC publicita a falta de transparência”, adiantou o regulador em comunicado, pelo que em consequência ficará “imediata e automaticamente suspenso o exercício do direito de voto e dos direitos de natureza patrimonial inerentes à participação qualificada em causa, até que a ERC publique nova comunicação e notifique as entidades de que a situação de falta de transparência da titularidade das participações qualificadas se encontra corrigida”.

Entretanto, já na noite de sexta-feira, a Lusa avançou que a Páginas Civilizadas já chegou a acordo com o World Opportunity Fund (WOF) para encontrar uma solução para a Global Media, que passa pela saída do fundo.

Pode, assim, ficar resolvida a questão do fundo, abrindo caminho para a venda dos ativos, tal como está previsto.

Mas, na ordem de trabalhos da assembleia-geral, consta também um ponto que visa viabilizar um aumento de capital de cinco milhões de euros, que será feito “por novas entradas em dinheiro, a realizar pelos acionistas da sociedade, no prazo que vier a ser fixado pela assembleia-geral, com respeito pelo seu direito de preferência”.

Entretanto, no dia 6 de fevereiro, foi assinado um memorando de entendimento para a compra de alguns títulos da Global Media e também a TSF por um grupo de quatro empresários liderados por Diogo Freitas, da Officetotal Food Brands. A este junta-se a Parsoc, a Iliria e o empresário Jorge Ribeiro.

O Jornal de Notícias, O Jogo, as revistas JN História, Notícias Magazine, Evasões, Volta ao Mundo e também a TSF e a Rádio Comercial dos Açores, vão assim passar para uma nova empresa, que terá também como acionistas uma cooperativa de jornalistas, a quem será cedida uma participação.

O acordo foi negociado com José Pedro Soeiro, Kevin Ho, Marco Galinha e Mendes Ferreira, acionistas minoritários do Global Media Group que, em conjunto, detêm 74,45% do grupo dono também do Diário de Notícias, do Açoriano Oriental ou do Dinheiro Vivo, títulos não incluídos na operação. Os atuais acionistas minoritários do Global Media Group devem ficar com uma participação a rondar os 30%. Na passada segunda-feira, a ERC referia que ainda “não deu entrada” qualquer acordo de negociação sobre a Global Media.

Trabalhadores participam na greve de 24 horas das redações do Jornal de Notícias, TSF, O Jogo e Diário de Notícias, detidas pelo Global Media Group (GMG).MIGUEL A. LOPES/LUSA

A assinatura do acordo visou também assegurar transferência do dinheiro necessário para serem efetuados os pagamentos dos salários em atraso de janeiro, que começaram a ser pagos no dia seguinte à assinatura do acordo de compra.

A Global Media começou no final do ano passado a atravessar um período conturbado e de falta de liquidez, o que levou a pagamentos em atraso – incluindo o ordenado de dezembro e o subsídio de natal – que fez com que o grupo enfrentasse em janeiro uma paralisação conjunta dos trabalhadores do Jornal de Notícias, Diário de Notícias, TSF e O Jogo e Dinheiro Vivo.

A 18 de janeiro soube-se que o WOF não ia avançar com a transferência para pagar os salários em atraso de dezembro até que a decisão da ERC quanto à questão da transparência fosse conhecida e que fosse concluído o processo de arresto avançado em janeiro por Marco Galinha para garantir os seus direitos na Global Media, da qual tem 17,59% do capital, por via indireta.

Antes da greve conjunta, o Jornal de Notícias e a TSF também já tinham feito greves, com o jornal a não ter chegado às bancas pela primeira vez em mais de 30 anos e com os microfones da rádio a serem desligados pela primeira vez em 35 anos. A paralisação do JN foi motivada em grande medida pela decisão da administração do grupo de rescindir com entre a 150 a 200 trabalhadores do grupo. A da TSF, anterior, com a saída do então diretor, Domingos de Andrade, e com travagem dos aumentos de ordenado, proposta pela anterior administração.

Vários dos decisores envolvidos na crise que assola a Global Media foram também ouvidos em comissão parlamentar, como Marco Galinha que referiu que a situação financeira do Global Media Group “não pode ser assim tão má” como era advogado por José Paulo Fafe, pois recebeu quatro propostas para a sua compra.

José Paulo Fafe também foi ouvido no parlamento, onde defendeu que o fundo WOF “cumpriu todas as obrigações até agora” e que todas as decisões do grupo foram “aprovadas por unanimidade, sem que na comissão executiva conste nenhum voto contra ou mesmo abstenção”.

Foram ainda ouvidos outras personalidades como Domingos de Andrade, ex-administrador do GMG e diretor da TSF, ou Pedro Adão e Silva, ministro da Cultura.

Domingos de Andrade foi afastado do conselho de administração da Global Media em setembro, aquando das entradas de José Paulo Fafe – que foi depois nomeado CEO – e de Diogo Agostinho e Filipe Nascimento, que se juntaram a Marco Galinha, Paulo de Lima de Carvalho, António Manuel Mendes Ferreira e Kevin Ho. Em janeiro, Paulo de Lima de Carvalho e Filipe Nascimento demitiram-se, deixando a comissão executiva apenas com José Paulo Fafe e Marco Galinha.

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