Cinema nunca será “mainstream” para a publicidade mas há muitas oportunidades
As ativações de marca nos Cinemas Nos durante 2023 quintuplicaram face ao ano anterior e já representam 20% da faturação da publicidade nos cinemas, revelou o diretor de publicidade da Nos.
A 96.ª edição dos Óscares voltou a fazer brilhar e a colocar o cinema na agenda mediática um pouco por todo o mundo. Em Portugal, os espectadores têm regressado às salas de cinema e o início deste ano parece promissor, depois de ter sido registado um crescimento de 20% em fevereiro em comparação com o mesmo mês de 2023.
No entanto, este meio que nunca será “mainstream” para a publicidade, embora existam muitas oportunidades a serem desenvolvidas, conforme defendeu Miguel Magalhães, diretor da Nos Publicidade, assumindo como objetivo querer colocar o cinema na agenda do mercado e torná-lo parte importante dos planos de media e das agências.
Para o diretor da Nos Publicidade, o cinema pode conviver “saudavelmente” no media mix das marcas e contribuir para os objetivos das campanhas, até porque dispõe de uma série de particularidades, como um elevado grau de foco e atenção, principalmente quando comparado com o digital.
Estas ideias foram defendidas num debate no Nos Brand Activation Day, evento onde se propôs discutir a relação, oportunidades e desafios entre a publicidade e o cinema, juntando para isso diversos players do setor, entre marcas, criativos ou agências de meios. A iniciativa, que teve lugar nos cinemas Nos do Centro Comercial Colombo, contou com a presença de várias ativações de diferentes marcas.
Miguel Magalhães argumento ainda que se investe “muito tempo no processo criativo e pouco tempo naquilo que são as opções de media e que é – sem generalizar – um bocadinho ‘chapa cinco'”, pelo que, tendo também em conta que o mercado português é “muito pequeno”, o cinema é “a última derivada e o investimento já ficou todo nas linhas de cima, em televisão, digital ou outdoor”.
“Também a [agências de] media pode repensar um bocadinho as estratégias que tem e o efeito e importância que determinado meio tem em determinada campanha, e por outro lado precisamos que os criativos criem especificamente para cinema“, afirmou o diretor de publicidade da Nos.
Mesmo em termos de CPM (custo por mil), o cinema é “super competitivo”, defendeu Miguel Magalhães, adiantando que a Nos deixou de vender publicidade à semana para passar a vender por número de contactos e que consegue fazer alguma segmentação em termos geográficos e também tendo em conta o tipo de conteúdo a ser transmitido.
Concordando com a ideia de que o cinema não é mainstream para a publicidade, Alberto Rui, CEO da IPG Mediabrands, afirmou por outro lado que a penetração do cinema em Portugal é elevada, sendo equivalente à do streaming. “Não estou a dizer que a frequência é igual, mas a penetração é igual, portanto não é assim tão nicho, é quase 30% da população portuguesa“, disse.
Quanto à integração do cinema nos media mix, Alberto Rui defendeu que “à partida, conceptualmente, não há nenhuma desvantagem”, até porque todos os meios têm particularidades que se complementam. No entanto, nem todas as marcas “têm o luxo de poder ter um grande media mix”, defendeu.
Afirmando que vê a existência de audiências, impacto e valor no cinema, o CEO da IPG Mediabrands sugeriu que talvez o facto de as marcas e agências não olharem muito para o cinema esteja relacionado com o facto de este meio ter saído dos media mix há uns anos, quando o digital começou a “explodir”, sendo agora muito difícil de voltar a conseguir incorporar o mix. Até porque para conseguir entrar “alguém tem de sair”.
Para Alberto Rui, o cinema deixou de ser “sexy” e tendência, pelo que o que há a fazer é trazer este meio de volta “para a agenda”.
Nuno Jerónimo concordou que não se dá a “atenção devida” ao cinema – quer em termos de planeamento de media, quer quando se pensa na estratégia criativa. “Cabe-nos a nós fazer anúncios memoráveis para cinema”, diz. O diretor criativo d’O Escritório reconhece que o cinema representa uma “oportunidade incrível” para a publicidade pela escala que tem e pela atenção que capta. “Quando procuramos ter um envolvimento mais emocional e contar uma história com tempo, acho que é aqui [no cinema]“.
Também presente no evento, Luís Nascimento, administrador executivo da Nos, recordou que depois de em 2020 ter sido registada uma quebra de 75% quanto ao número de pessoas que foram ao cinema, 2023 foi um ano “extraordinário”, com a estreia de “bons filmes” e com um crescimento registado na ordem dos 30% em termos de audiência, ficando “apenas 13% abaixo” de 2019 (que foi o melhor ano de sempre do cinema). Estes 13% são na maioria idosos que perderam o hábito do cinema, detalhou depois Luís Nascimento. “As pessoas voltaram, podemos dizer de forma clara“, assegurou o responsável da Nos, acrescentando que “as audiências estão cá, os anúncios é que não“.
Luís Nascimento enumerou ainda seis razões pelas quais faz sentido investir em publicidade no cinema, começando desde logo por apontar o foco e a atenção com que as pessoas estão numa sala de cinema que “não é comparável com aquela em nenhum outro ecrã”, garantiu, citando estudos internacionais que relevam que o foco no cinema é três vezes superior ao registado em televisão.
O facto de as pessoas terem disponibilidade e paciência para ver anúncios mais longos e de os jovens serem a “principal força de regresso” aos cinemas desde 2021 – tendência que vai continuar a aumentar, segundo o administrador da Nos – foram outras das razões apontadas.
Referindo que em 2023 mais de 12 milhões de pessoas foram ao cinema (oito milhões aos cinemas Nos), Luís Nascimento defendeu que “faz todo o sentido” juntar sinergias entre aquilo que são as experiências de ativação de marcas no exterior da sala de cinema com o anúncio que passa no ecrã.
O responsável referiu também que a Nos se encontra a trabalhar cada vez mais os dados e informações que recolhe através do site e da app Nos Cinemas para conseguir uma maior segmentação da audiência e evidenciou ainda a oportunidade que existe para as marcas trabalharem desde o início a integração de product placement nas produções cinematográficas junto dos argumentistas e produtores.
Product Placement é viável mas tem de ser num formato “win-win”
Debatendo a viabilidade do uso da técnica de product placement nas produções cinematográficas, Nuno Markl defendeu que hoje em dia está provado que se consegue integrar esta técnica de marketing no cinema de uma forma “boa para toda a gente”, embora o público possa ter uma ideia “demonizada” desta estratégia.
“Desde que não sejam coisas forçadas ou mal feitas, todos vão beneficiar com isso“, defendeu por sua vez Alberto Rui Pereira, referindo que as produções cinematográficas precisam do investimento enquanto as marcas que precisam de comunicar.
Nuno Jerónimo também reforçou que esta tem de ser uma relação “win-win” e alertou que o público é também uma peça fulcral nesta equação e que a expectativa das pessoas em relação ao envolvimento das marcas não pode ser “defraudada”. “Temos de ter muita sensibilidade quando falamos em cinema e no envolvimento das marcas. É preciso ter esse cuidado de que quem vem a uma sala de cinema ver um filme não sentir que lhe estão a estragar a experiência“, disse.
Para Nuno Jerónimo há filmes que abrem espaço para que as marcas entrem com naturalidade ou graça, mas que para outros tipos de filmes “temos de pensar muito bem como é que aparecemos e qual é a expectativa das pessoas”, tendo de ser feito um cruzamento entre aquilo que é o arco narrativo da história e a narrativa da marca.
Embora encare a publicidade em produções cinematográficas como um “risco enorme“, o diretor criativo d’O Escritório considera que “temos de encontrar esse espaço e acredito mesmo que pode – e tem de ser – bem feito para que toda a gente ganhe e fique satisfeita no fim, principalmente o público”, afirmou.
Também Miguel Magalhães concordou com esta necessidade de um formato “win-win, em que quem vem ver o filme se sente confortável com a história que está a ser contada e com as menções que estão a ser feitas“.
Concedendo que a “espécie de preconceito” existente em relação à ideia de product placement pode vir da experiência que existe em televisão – que “é um bocadinho as marcas serem enfiadas à patada” –, o diretor da Nos Publicidade também considera que tem de haver mais abertura no processo criativo da construção de um filme. Isto, “se é que queremos mesmo as marcas a ser substitutas do Estado no financiamento do cinema em Portugal”.
O CEO da IPG Mediabrands sublinhou ainda a ideia de que as marcas hoje, além de objetivos comerciais, têm também propósitos. “Hoje as pessoas querem mais das marcas do que simples produtos e serviços. Querem atuação na sociedade”, pelo que os filmes e séries são um “ótimo espaço para as marcas se afirmarem, de uma forma muito mais natural”.
“É um longo caminho a fazer mas é uma oportunidade muito grande para as marcas em Portugal”, acrescentou Alberto Rui.
Ativações de marca representam 20% do investimento em publicidade nos cinemas
À margem do evento, Miguel Magalhães adiantou que as ativações de marca realizadas nos Cinemas Nos durante o ano de 2023 quintuplicaram face ao ano anterior. Neste momento, estas já representam 20% da faturação da publicidade nos cinemas Nos, quando em 2022 esta percentagem era de “praticamente zero”.
O ano passado “foi um ano em que passámos, de facto, a meter as ativações de marca no cinema e no mapa da publicidade“, disse o responsável da Nos, detalhando que em 2023 os cinemas Nos contaram com mais de duas ativações por mês.
No entanto em termos de valores financeiros, este modelo não é “tão atrativo em termos de margens”, porque tem muito mais custos e é muito mais trabalhoso. “De qualquer maneira, é uma montra importantíssima e acho que é uma forma de vincar o cinema enquanto alternativa de meio publicitário nas suas várias vertentes“, sublinhou Miguel Magalhães.
Em termos de crescimento, o diretor de publicidade da Nos disse não haver propriamente um objetivo traçado. “Queremos crescer, mas queremos crescer em tudo, e é mais fácil crescer na publicidade em ecrã do que propriamente nas ativações. E temos um limite, não queremos que os foyers dos cinemas passem a ser uma feira de marcas. Temos de ter alguma cuidado, tem de haver propósito e sentido”, disse. “Não vamos querer crescer demasiadamente porque depois a experiência de quem vem ao cinema e a integração das marcas começa a ser contraproducente. Diria, se tiver de arriscar, que nunca passará muito dos 25% [do total da faturação da publicidade nos cinemas Nos]”, acrescentou.
Entre as marcas que mais regularmente fizeram ativações de marca em 2023 nos Cinemas Nos encontram-se a Lactogal, Siva, Lego, Prio, Opel, Delta, Unilever e Jerónimo Martins.
O diretor da Nos Publicidade referiu ainda que Lisboa, Porto e Coimbra continuam “evidentemente” a ser as cidades mais procuradas pelas marcas por estas ativações, mas que também já começa a existir “alguma dispersão geográfica”, exemplificando com o Algarve ou com Braga, “por ser um centro de estudantes e com um target mais novo”.
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