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A liderar o marketing da Zome depois de o neuromarketing lhe ter “transformado” a vida, Pedro Vieira, na primeira pessoa

Rafael Ascensão,

Com um percurso "atípico" no marketing, foi em Cabo Verde que Pedro Vieira descobriu o neuromarketing. É apaixonado por desporto e humor, mas viajar é o que mais gosta de fazer na vida.

Começou os estudos no ramo da engenharia, formou-se em turismo e terminou no marketing. É diretor de marketing da Zome desde 2019, mas foi quando esteve emigrado em Cabo Verde que Pedro Vieira descobriu algo que lhe “transformou a vida”: o neuromarketing.

O profissional de 48 anos diz assim ter um percurso “atípico em relação àquilo que são muitos dos profissionais de marketing”, desde logo porque não teve uma “educação formal” na área. Frequentou inclusive quatro anos do curso de Engenharia de Produção, percebendo que não era esse o caminho, licenciando-se depois em Turismo.

A sua carreira profissional começou precisamente nessa área, tendo passado apenas dois meses até perceber que tinha “talento para vender“, tendo ido rapidamente parar ao “mundo das vendas”. Liderou uma equipa comercial do parque de aventura Diver Lanhoso, fase em que começou a ter necessidade de trabalhar também a área do marketing.

“Eu sempre gostei muito desta área, era apaixonado desde criança por publicidade. Sentia essa curiosidade de explorar esse território e por isso comecei a dar os primeiros passos de forma relativamente informal”, recorda. “A coisa foi evoluindo e acabei por sair da empresa para montar um negócio próprio. E quem tem um negócio e cria uma marca própria tem de ser tudo, gestor vendedor e marketeer”, diz, acrescentando que, algum tempo depois, foi recrutado para dirigir o marketing da Pão Quente, em Cabo Verde.

Avançou para o país africano e foi nessa altura que, através de um curso de mestrado, descobriu algo que lhe “transformou a vida”: o neuromarketing. Esta área abriu-lhe “completamente a visão para outras coisas que vão além do próprio marketing e que têm a ver com o comportamento humano e com behavioural economics“, tendo também ajudado Pedro Vieira a perceber outros conceitos que já tinha de trás, como de storytelling ou gamification. Foi o neuromarketing que me permitiu perceber porque é que essas estratégias funcionavam“, diz o responsável de 48 anos.

No entanto, Pedro Vieria reconhece que o “neuro” é a “parte pequena” da palavra neuromarketing. “O marketing ocupa muito mais e é muito mais vasto. Mas é verdade que esse conhecimento sobre forma como o nosso cérebro processa a informação e toma decisões ajuda transversalmente em todos os outros pontos do marketing, seja na criação de produtos, comunicação ou branding“, diz.

Mas aquilo que mais apaixona Pedro Vieira nesta área tem a ver com estratégia, mas também com criatividade e a comunicação. “São estas as coisas que eu mais gosto de fazer pessoalmente. Gosto de escrever, gosto de criar e isso, naturalmente, é uma parte da função em que gosto de estar sempre envolvido. Acho que é aí que nos conseguimos conectar com as pessoas“, acrescenta.

Quando decidiu sair de Cabo Verde, começou a prestar serviços de consultoria a nível internacional, o que lhe permitiu conhecer “conhecer muito do mundo como consultor de neuromarketing e neuroestratégia”, tendo tido contacto com vários setores, desde o luxo à política, passando pelo IT (Information Technology).

Mas esse “lufa-lufa, de um lado para o outro”, para quem era um jovem pai na altura, causava “algum transtorno”, tendo Pedro Vieira começado a sentir que “estava a perder muito daquilo que era a vida familiar e o acompanhamento dos filhos”.

Decidiu então começar a trabalhar em Portugal, pelo que começou por apostar na estratégia de “agregar valor com formação, explicando às pessoas o que era isto do neuromarketing e da neuroestratégia”, que era um “assunto muito pouco falado na altura em Portugal“, observa o diretor de marketing da Zome.

Foi através de uma dessas reuniões, com responsáveis do Grupo Business (que mais tarde, ao fundir-se com o Grupo Pr1me, deu origem à Zome), que Pedro Vieira começou a sua ligação à empresa onde hoje é diretor de marketing.

O responsável recorda-se de, nessa reunião, Patrícia Santos, que depois foi CEO da Zome, ser “muito cética” em relação ao tema. “Mas, no fim da reunião, disse-me que andava à minha procura há muito tempo e não sabia. Porque tudo aquilo que eu lhe fui dizendo sobre neuromarketing e neuroestratégia casava plenamente com aquilo que eles sentiam que era preciso trazer para a empresa“, diz.

A colaboração começou assim de uma forma “relativamente natural e orgânica”, com Pedro Vieira a dar também alguma consultoria relacionada com comunicação e apresentações públicas de objetivos, por exemplo.

Mas, “rapidamente chegámos à conclusão que havia mais caminho para percorrer e depois de termos dado os primeiros passos — e tendo em conta que isto envolvia um grande grau de conhecimento –, percebeu-se que tudo só fazia sentido, se houvesse alguém dentro da empresa a fazer o roll-out de toda essa descoberta”, refere.

“Fizeram-me uma proposta que na altura não estava nos meus horizontes mas que, pelo meu objetivo de começar a estar mais presente na vida familiar, encaixou como uma luva. Na altura, o Grupo Business não estava a pensar criar uma marca própria. A minha intervenção era mais centrada naquilo que era a proposta de valor e entendendo aqui o marketing não com o aspeto de branding, mas sim as questões do dia-a-dia, de agregarmos cada vez mais valor, comunicarmos de uma forma diferente e de nos posicionarmos de uma forma diferenciada para o mercado”.

Mas, entretanto, foi preciso lançar uma marca própria — a Zome — e fazê-lo “de forma rápida”. “Felizmente, com toda a estrutura e alinhamento das equipas que já existia, conseguimos superar esse desafio e foi assim que nasceu a Zome. Nasceu de uma forma espontânea, mas muito alicerçada, estrategicamente, nessa vontade de trazer uma energia nova para o setor, fazer as coisas de forma muito diferente e muito centrada nas pessoas, no seu comportamento, nas suas necessidades, mais subconscientes. Ou seja, o nosso estudo é um estudo que vai além daquilo que é dito pelas pessoas, e que se foca essencialmente naquilo que as pessoas sentem quando dizem algo”, explica Pedro Vieira.

“E indo ao mais profundo das emoções das pessoas, ao subconsciente, conseguimos desenhar toda uma proposta de valor que vai muito mais de encontro daquilo que as pessoas necessitam ou anseiam, mesmo sem elas conseguirem verbalizar exatamente aquilo que sentem“, acrescenta sobre o nascimento da Zome, uma marca imobiliária 100% portuguesa muito focada no mercado português, “apesar de sabermos que a nossa ambição é crescemos cada vez mais para outros mercados”.

Pedro Vieira sublinha ainda que a marca foi lançada num setor “altamente conservador” onde já existiam marcas estabelecidas “há anos”, pelo que “trabalhar em cima do alcance da notoriedade e abrir o mercado foi muito desafiador“.

Mas “algo devemos estar a fazer bem e acho que estamos a acertar a nossa proposta de valor porque estamos a crescer de forma contínua, sustentável”, diz o responsável, avançando que a empresa está a crescer na ordem dos 50% de volume de negócios, bem como a evoluir como rede, contando já com 50 unidades espalhadas por todo o país e mais de dois mil colaboradores.

“Estamos com um crescimento bastante sólido e acima daquilo que são os números do mercado e isso acho que é o reflexo também daquilo que estamos a trazer de novo para o setor”, afirma. E o contributo do marketing é precisamente esse: “trazer valor para todos os aspetos do negócio e fazê-lo crescer”, acrescenta Pedro Vieira.

Quanto à comunicação da Zome, esta é “muito próxima das pessoas, com um cariz emocional muito marcado“. “Mais do que falar sobre a tecnicidade daquilo que é a nossa proposta de valor, importa-nos muito comunicar aquilo que são os nossos valores e a forma como fazemos as pessoas sentirem-se ao longo de todo o processo“, diz o diretor de marketing que conta com outras cinco pessoas na sua equipa e com o apoio das agências Um mais Um (ao nível criativo) PR Suit (assessoria de imprensa) e AdClick (marketing digital).

“Nós operamos num momento de transição para todas as pessoas que vêm ter connosco. Ninguém, tirando os investidores — que é uma margem muito reduzida do nosso público — vem ter connosco se não for porque está com alguma necessidade: ou porque a família cresceu ou morreu alguém na família. Isso gera muitas ansiedades, além do desconhecimento de um negócio que provavelmente para alguns só é feito uma ou duas vezes na vida. Compete-nos a nós ser o maior conselheiro e o verdadeiro suporte, não só técnico mas também emocional“.

“E isso tem que ser comunicado também de uma forma que as pessoas percebam e sintam como genuína, e daí termos uma linguagem muito próxima. Mas ao mesmo tempo posicionamo-nos para onde queremos ir, que é um mercado de inovação constante com uma aposta muito forte na tecnologia e na formação. Não entramos em posicionamentos de sermos os maiores ou a rede número um. Não é esse o nosso posicionamento. O nosso posicionamento é, claramente, fazer as pessoas perceberem qual é o problema que estamos a resolver na vida deles e de que forma é que podemos ser suporte nesses momentos de grande ansiedade“, explica.

Natural de Viana do Castelo, Pedro Vieira vive em Braga desde os seis anos, à exceção de alguns momentos profissionais e pontuais que o levaram para Lisboa, Cascais, e outros pontos do mundo, enquanto trabalhava como consultor. No entanto, nunca largou aquela que é a sua “base”, onde vive então com a mulher e os dois filhos pré-adolescentes, que também trazem “desafios” em que é preciso “ajustar a capacidade de neurocomunicação para os perceber muito bem”.

Em termos de interesses, Pedro Vieira assume-se desde logo como um “apaixonado” por desporto e por humor. No caso do desporto, gosta de em particular de futebol — sendo “inquestionavelmente” adepto do Futebol Clube do Porto –, mas aprecia o desporto em geral. “Nem que seja ver dois miúdos a jogar ténis quando vou a passar, fico logo preso à coisa”, observa. Futebol, ténis, mergulho ou karaté são desportos que já praticou, embora nenhum de forma federada.

Mas tudo o que sejam conteúdos de comédia, humor e escrita criativa, são coisas que também lhe “puxam imediatamente a atenção”. Entre as suas referências mais antigas estão “claramente” Herman José e Monty Python.

“Foram eles que provavelmente me abriram este caminho de gostar muito do humor, mas as referências também vão mudando e felizmente estamos numa fase a nível nacional extremamente rica, com muita gente de qualidade a fazer humor. Não consigo fugir de um Ricardo Araújo Pereira e da sua equipa ou de Bruno Nogueira”, diz, indicando também o nome de Jerry Seinfeld, em termos internacionais.

No entanto, a coisa que “provavelmente mais gosta de fazer na vida” é viajar, até porque as viagens juntam as outras duas coisas. Relacionado com o desporto, viajar “acaba por ser uma atividade física permanente”, até porque Pedro Vieira não gosta de viajar “de forma estática”, indo para um resort, mas sim de se envolver com as pessoas e de conhecer, “mais ao estilo road trip“.

Já o humor traz “uma capacidade de observação diferente, porque conseguimos ver as coisas de vários ângulos, e as viagens dão também essa possibilidade de observar pessoas num estado e em situações diferentes, observar culturas diferentes”.

E é isso que eu sinto que as viagens me trazem. Mais que um carimbo num passaporte, são experiências de vida e a possibilidade de explorar todos estes sentidos que me fazem sentir bem“, acrescenta.

Outras “grandes aprendizagens” que o “ajudam hoje a ser melhor líder” foram adquiridas como membro da Tuna Universitária do Minho. A tuna permitiu a Pedro Vieira ir a Cuba e ao Brasil, conhecer a “Península Ibérica toda” e “abrir muitos horizontes”, obrigando-o também a desenvolver a “capacidade relacional”. Na tuna tocava viola, algo que ainda hoje faz. Aliás, encontra-se mensalmente com um grupo de amigos dos tempos de tuna, para conviver, tocar e “manter vivo esse bichinho”.

A paternalidade é “naturalmente” o grande desafio da sua vida. “Não há desafio maior do que esse. É uma responsabilidade muito grande e com imensas variáveis”, refere Pedro Vieira.

a nível profissional, aponta como o maior desafio conseguir manter-se atualizado e relevante no mundo do marketing e da comunicação, que está a sofrer uma “mutação brutal a uma velocidade doida”.

“E ter essa capacidade de estar sempre à frente exige muito de nós, é um desafio muito grande. Até mesmo pelas mudanças geracionais. Na minha altura demoravam, se calhar, 20 anos, agora miúdos com cinco ou 10 anos de diferença já têm uma linguagem e comportamentos diferentes. É desafiante, mas é muito interessante porque nos obriga a estar permanentemente em alerta”, diz.

Pedro Vieira em discurso direto

1 – Que campanhas gostava de ter feito/aprovado? Porquê?

A nível internacional, destaco a campanha da KIA “Movement that inspires”, pelo arrojo de fazer uma completa transformação de estratégia global de marca, comunicando uma nova identidade e propósito de uma forma inovadora e perfeitamente alinhada com uma mudança estratégica de negócio, com alto impacto para o futuro.

Já nacional, “Tem tudo e mais não sei o quê”, da Worten, pela elasticidade do conceito, pela clareza da mensagem e pela capacidade de chegar o público-alvo com a dose certa de humor, emoção e estabelecimento de relação.

2 – Qual é a decisão mais difícil para um marketeer?

Abandonar uma grande ideia. Há ideias que nos apaixonam, nos fazem vibrar, mas que por algum motivo não são as mais adequadas para determinado momento da empresa, têm uma probabilidade baixa de atingir os objetivos estratégicos ou existe algum tema técnico que a impede de concretizar e por isso têm que ser abandonadas, por muito entusiasmantes que possam ser.

3 – No (seu) top of mind está sempre?

Inovar, fazer diferente, criar. Entender e gerar comportamentos. Aprender.

4 – O briefing ideal deve…

Ser conciso, perfeitamente claro nos objetivos a atingir, com o máximo de informação contextual possível e com o mínimo de “amarras” criativas.

5 – E a agência ideal é aquela que…

Tem a capacidade de perceber o objetivo do cliente e não se deixar seduzir por escrever geniais tiradas de copy ou produzir brilhantes criatividades visuais inconsequentes e que não atinjam os objetivos de negócio do cliente. É a companheira que sente as dores do cliente e se foca no que realmente importa para as debelar e não no seu umbigo criativo, prémios ou outras motivações que não sejam centradas 100% no seu cliente.

6 – Em publicidade é mais importante jogar pelo seguro ou arriscar?

Arriscar sempre. Com dose maior ou menor de risco, mas devemos sempre procurar novos territórios, novas abordagens, surpreender e criar novas formas de interação e conversão. O mundo está em constante mudança e nós, por consequência, também temos que estar.

7 – O que faria se tivesse um orçamento ilimitado?

Trabalhava com mais pessoas, que nos trouxessem novas perspetivas e desafios. Experimentava e errava muito mais, porque é essencial para evoluir. Investia ainda mais na aquisição de conhecimento dos negócios, do comportamento humano e do mundo para abrir ainda mais os horizontes das pessoas das minhas equipas.

8 – A publicidade em Portugal, numa frase?

A publicidade em Portugal é como um Galo de Barcelos: única, colorida, cheia de personalidade e símbolo de criatividade e inovação.

9 – Construção de marca é?

Identidade, consistência, resiliência. Para se criar uma marca forte, que crie relação e memória de longo prazo com o seu mercado temos que garantir consistência em todos os pontos de contacto e ao longo do tempo. Temos também que aceitar que o caminho vai ter grandes obstáculos, surpresas, e que nos devemos moldar aos diferentes contextos ao longo do tempo, mas sempre sem perder a identidade, o ADN, a genuinidade, que é o garante da diferenciação e sustentabilidade da marca.

10 – Que profissão teria, se não trabalhasse em marketing?

Seria um servidor. Não no sentido do hardware tecnológico, mas no sentido de ser alguém que serve e é um bom conselheiro. Nem sempre trabalhei em marketing. Trabalhei em vendas, gestão de negócios, organização de eventos, entre outras áreas e há algo que une todas. O sentido de serviço às pessoas, às comunidades, às empresas. Gosto muito de servir e, numa perspetiva mais egocêntrica, gosto de sentir que sirvo para alguma coisa. Se o pudesse fazer num bar de praia tropical, com o pé na areia, seria excelente.

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