ECO da campanha. Caravanas partidárias travam no ‘semáforo’ das autárquicas
No dia em que Passos e Portas pegaram no carro e Mortágua trocou o barco pelo comboio, o tom da campanha misturou linhas vermelhas na política, luz verde aos idosos e um cartão amarelo em Belém.
Ainda as caravanas partidárias aqueciam os motores para o oitavo dia de campanha para as autárquicas e já Pedro Passos Coelho estava a tomar o pequeno-almoço com o candidato do PSD a Sintra, o segundo concelho mais populoso do país e que se prevê que seja uma das votações mais renhidas no domingo, com Marco Almeida, a ex-ministra Ana Mendes Godinho (PS) e a deputada Rita Matias (Chega).
Na segunda aparição na campanha, após já ter estado na Amadora ao lado de Suzana Garcia, o ex-primeiro-ministro recusou, também no poder local, um bloqueio a entendimentos à direita: “As ‘linhas vermelhas’ dos candidatos têm de ser ditadas por consciência e por coisas muito particulares, especiais e graves. Tirando isso, vivemos numa democracia e temos de saber trabalhar em conjunto, quaisquer que sejam os eleitos”, defendeu. Montenegro preferiu fugir ao tema para não causar “ruído”; Mariana Leitão só avisou que os candidatos liberais são “irredutíveis nos princípios”.
Com a entrega da proposta do Governo a coincidir com o último dia da campanha, na sexta-feira, tal como na véspera, o Orçamento do Estado (OE) para 2026 voltou a contaminar as lides autárquicas: a começar pelo anúncio antecipado do aumento do Complemento Solidário para Idosos e a acabar na própria aprovação. Que Marcelo acredita que virá a ter o apoio do PS, já que de lá foram retiradas as propostas mais divisivas sobre lei laboral e impostos, para serem votadas em leis autónomas.
Outra hipótese é a viabilização pelo Chega, que não assusta a Iniciativa Liberal desde que traga “medidas reformistas” para um país “pobre e atrasado”.
No dia em que Paulo Portas apareceu de surpresa em Vale de Cambra e em que Mariana Mortágua se estreou nas autárquicas pela via férrea, a saúde foi outro tema forte.
Em Aveiro, antes de explicitar a ambição de triplicar o número de eleitos face a 2021 e de obter vereadores com pelouros, a liberal Mariana Leitão desafiou a ministra da Saúde a refletir sobre se pode continuar no cargo após “planos e mais planos” nada terem resolvido; e o porta-voz do Livre, Rui Tavares, a evidenciar mais certezas no Minho de que Ana Paula Martins “já tinha poucas, cada vez vai tendo menos” condições para exercer o cargo após um bebé nascer na receção do hospital de Gaia.
Também a caravana do PS concentrou esforços na denúncia de que o Governo está a “falhar em toda a linha nos compromissos que assumiu com os portugueses” nesta área que é “sensível, complexa, exigente e que exige a mobilização de todas as forças e vontades”.
À porta do Hospital Garcia de Orta, em Almada, e ao lado da autarca Inês de Medeiros e das ex-ministras Marta Temido e Mariana Vieira da Silva, o secretário-geral frisou que a reforma da emergência hospitalar prometida pela ministra “tem de ser feita ouvindo em primeiro lugar os autarcas”. Que, lamentou, pediram para ser ouvidos pelo Executivo e não obtiveram “qualquer resposta”.
Tema quente
“Eleitoralismo” com medidas do Orçamento do Estado
A cinco dias das eleições autárquicas e três dias antes da entrega da proposta de Orçamento do Estado (OE) para 2026, o Governo anunciou que o Complemento Solidário para Idosos (CSI) vai aumentar 40 euros no próximo ano, o que significa que o montante máximo desta prestação passará a ser de cerca de 670 euros.
A novidade fez manchete num jornal diário, Luís Montenegro confirmou-a durante uma ação de campanha em Évora e não tardou a chuva de críticas dos partidos da oposição ao “eleitoralismo” da proposta que acabou mesmo por marcar o oitavo dia da campanha eleitoral.
Em Almada, José Luís Carneiro (PS) falou de “descarada falta de isenção, imparcialidade e independência”. Na Nazaré, André Ventura (Chega) notou que o anúncio “faz do Governo uma espécie de ator de populismo e de eleitoralismo autárquico”, defendendo uma subida permanente das pensões.
Em Moscavide, Paulo Raimundo (CDU) referiu que “se calhar só depois das eleições é que ele lança cá para fora as coisas negativas, muito negativas do Orçamento”. E em Barcelos, Rui Tavares (Livre) atirou que “a gente já conhece bem as manhas de Luís Montenegro”.
Confrontado com estas críticas de que se está a aproveitar do cargo de primeiro-ministro para fazer anúncios orçamentais, o presidente do PSD ripostou que a apresentação do OE na Assembleia da República até ao dia 10 é uma “obrigação” e que encara as palavras dos opositores como um elogio às opções do Executivo. “Dizerem que tem uma vertente eleitoralista significa que se reveem no conteúdo do Orçamento porque só é eleitoralista aquilo que agrada aos eleitores. Fico satisfeito com o reconhecimento de que o OE possa ser bom para as pessoas porque é esse o objetivo”, declarou Montenegro durante uma ação de campanha em Évora.
Embora reconhecendo a “coincidência de datas” e compreendendo que “cada partido possa dizer aquilo que é a sua expectativa para o futuro”, até o Presidente da República veio a terreno aconselhar o Governo a “evitar fazer campanha eleitoral sobre isso”.
Ainda assim, Marcelo Rebelo de Sousa frisou que, sendo realizadas poucos meses após as legislativas, as autárquicas de domingo terão “uma leitura autónoma” e, ao contrário de outros atos eleitorais, “neste caso é mais difícil haver uma espécie de antecipação ou de juízo” sobre a avaliação do Executivo.
A figura
Mortágua sai do barco de Gaza para os comboios de Leiria
“Lamento, estou aqui. Estou de volta”. Regressada a Portugal no domingo à noite depois de várias semanas a bordo de uma flotilha humanitária que tinha como destino a Faixa de Gaza, Mariana Mortágua retomou esta terça-feira a atividade enquanto coordenadora do Bloco de Esquerda.
Garantiu que voltará a assumir as funções de deputada “o mais brevemente possível” – foi substituída no Parlamento por Andreia Galvão, número três na lista de Lisboa nas legislativas de maio – e ao oitavo dia da campanha para as autárquicas desembarcou na estação de caminhos-de-ferro de Leiria. Ali foi recebida por dezenas de apoiantes e disparou em várias direções: dos problemas da linha do Oeste aos da habitação, até ao Chega que “consegue ser tudo, quer oposição, quer muleta do Governo”.
À hora do almoço, em entrevista à RTP, a deputada única bloquista tinha dito que “nunca [pensou] se esta participação na flotilha [lhe] daria um voto ou tirava um voto”, embora tenha a certeza de que representou “muitos milhares de portugueses” com essa viagem que acabou intercetada por Israel.
Já questionada sobre a possibilidade de ter o seu lugar de coordenadora do partido em risco, Mortágua respondeu que a campanha autárquica tem corrido “muito bem” e, por isso, não tem “nenhuma razão” para acreditar que o Bloco de Esquerda terá um mau resultado no próximo domingo.
O número
Há 91 listas de candidaturas de grupos de cidadãos candidatos às câmaras municipais nas eleições do próximo domingo, distribuídas por 86 concelhos. É um número recorde de participação destes movimentos, superando as 81 que avançaram há quatro anos. No total, incluindo as câmaras e as juntas de freguesia, são 1.061 as chamadas candidaturas independentes às autárquicas, de acordo com a contabilização feita pela Comissão Nacional de Eleições (CNE).
A frase
"Não precisamos de mais pessoas a viver no Porto. Mesmo que perca as eleições, prefiro fazer campanha com seriedade. Também podia prometer casas para toda a gente, mas ganhar a câmara só por ganhar não faz sentido. (…) Vão construir em todas as esquinas onde há um terreno municipal? Não é legítimo [Manuel Pizarro] esconder este plano secreto de trazer mais 100 mil pessoas para a cidade.”

A surpresa
Apoio de Portas para manter CDS como “quarto partido autárquico”
Nas últimas autárquicas, o CDS-PP conseguiu manter as seis câmaras municipais a que preside, embora tenha perdido votos nas localidades a que concorreu sozinho. Volvidos quatro anos, três desses autarcas estão obrigatoriamente de saída por terem atingido o limite de mandatos. Um delas é José Pinheiro, em Vale de Cambra, com o partido a candidatar o atual vereador André Martins Silva.
Há quase uma década fora da política ativa, Paulo Portas fez um “intervalo na [sua] vida profissional, que é muito cheia, e quis dar um sinal” de apoio à equipa que candidata a este município de cariz industrial do distrito de Aveiro, apelando ao voto em “bons gestores da coisa comum”.
O ex-governante recordou depois que, quando foi presidente do partido, procurou sempre inspirar os seus autarcas a concretizarem “três ou quatro coisas, independentemente da especificidade do concelho” – e que a primeira na lista era a redução de impostos. No presente, Portas “[tem] ouvido dizer que o CDS tem boas oportunidades de manter as seis câmaras que governa e de ser o quarto partido autárquico”. Isto é, logo a seguir a PS, PSD e CDU – e mantendo-se à frente do Chega, que no domingo aspira a alcançar as primeiras vitórias a nível local.
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