Como se posicionaram os jornais na corrida à Casa Branca?
Os jornais norte-americanos têm invertido a sua tendência de apoio a um dos candidatos presidenciais. Muitos optaram por não apoiar nem Trump nem Harris, com a democrata a recolher mais endorsements.
A tradição de os jornais apoiarem um dos candidatos presidenciais remonta há décadas nos Estados Unidos. No entanto, essa postura parece estar a ser alterada, sendo que este ano vários jornais optaram por não dar o seu endorsement a qualquer um dos candidatos. Para alguns meios, esta tem sido a atitude padrão, como o The Wall Street Journal, que não apoia nenhum candidato presidencial desde 1928.
Num dos casos mais mediáticos deste ano, o Washington Post anunciou que quebraria a tradição e não apoiaria nenhum candidato às eleições presidenciais dos EUA e que se absteria de o fazer em futuras eleições. “Estamos conscientes de que esta decisão dará origem a muitas interpretações, que será vista como um apoio implícito a um dos candidatos, ou a rejeição de outro, ou como uma evasão às nossas responsabilidades de opinião”, escreveu o publisher do jornal, William Lewis.
A decisão terá sido tomada por pressão de Jeff Bezos, dono do jornal desde 2013, que defendeu depois num artigo de opinião que os endorsements presidenciais “não fazem nada para inclinar a balança de uma eleição”. Ao invés disso, o que realmente fazem é “criar uma perceção de parcialidade” e “uma perceção de não independência”, disse, argumentando que “acabar com eles é uma decisão de princípios, e é a certa”. Após esta decisão de não apoiar nenhum dos candidatos – tomada pela primeira vez desde 1988 – o Washington Post perdeu mais de 250 mil assinantes.
Também o Los Angeles Times decidiu não apoiar nenhum dos candidatos, contrariamente ao que tem sido a sua tradição de apoio aos candidatos democratas. Embora o conselho editorial do jornal já tivesse tudo alinhavado para divulgar esse apoio, o plano caiu por terra perante a decisão da família de Patrick Soon-Shiong, bilionário da biotecnologia que comprou o jornal em 2018 por 500 milhões de dólares.
Sem dar grandes explicações – quer a nível externo quer interno – o dono do jornal terá vetado o endorsement que estava previsto, dando a conhecer que o Los Angeles Times não daria apoio a nenhum dos lados na corrida à Casa Branca. Pouco depois, três membros do conselho editorial renunciaram, quase 200 trabalhadores assinaram uma carta aberta exigindo uma explicação e milhares de leitores cancelaram as suas assinaturas, que encararam a decisão como um “apoio disfarçado” a Donald Trump.
Foi Nika Soon-Shiong, filha do dono do jornal, quem veio depois explicar que a decisão de não apoiar nenhum dos candidatos foi motivada pelo apoio contínuo dado por Kamala Harris a Israel, na guerra em Gaza, segundo o The New York Times.
A Gannett, a dona da maior rede de jornais dos Estados Unidos , também anunciou que os seus mais de 200 títulos – onde se incluí o USA Today – não iriam optar por endorsements a propósito das eleições de 5 de novembro. A rede de publicações da Gannett abrange dois milhões de assinantes digitais e uma média diária de 2,9 milhões de leitores em publicações impressas em 43 estados norte-americanos, segundo a CNN internacional.
A opção de não apoiarem nenhum dos candidatos, tomada pelos jornais que historicamente apoiavam o candidato presidencial democrata, foi capitalizada por Donald Trump e pelos republicanos, que evidenciaram que estes jornais – que predominantemente escolhiam endossar os candidatos do Partido Democrata – se distanciaram de Kamala Harris por não a considerarem competente para o cargo.
Entre os títulos que endossam Kamala Harris incluem-se o The New York Times, o The Boston Globe, o The New Yorker magazine, o The Seattle Times, o The Philadelphia Inquirer, o The Denver Post e o San Antonio Express-News, mas também meios como a Vogue ou a Rolling Stone. O The New York Times, por exemplo, descreveu num editorial que Kamala Harris é a “única escolha patriótica” enquanto Trump “não é adequado para ser presidente”.
Já outros jornais, como o New York Post, o The Washington Times e o Las Vegas Review-Journal, apoiam Donald Trump, assim como a revista Maxim, por exemplo. O New York Post, por exemplo, escreveu que Trump “exibe a mesma força e vigor que demonstrou em 2016″, apesar de ter um sistema de justiça contra si, de “duas tentativas de assassinato” e dos ataques “histéricos e constantes” nos media contra o republicano.
No cômputo geral, entre os principais jornais norte-americanos, a atual vice-presidente conta com 55 do assumidamente do seu lado, enquanto o candidato republicano junta 11 jornais enquanto apoiantes declarados, segundo a contagem do Hindustan Times. O número de jornais apoiantes da candidata democrata é muito menor em relação a 2016, quando cerca de 240 jornais apoiaram Hillary Clinton (enquanto 20 endossaram Trump). Já nas eleições de 2020, 120 jornais apoiaram Joe Biden e 14 Donald Trump.
No continente europeu, a britânica The Economist declarou recentemente o seu apoio à ainda vice-presidente dos EUA. “Se a The Economist tivesse direito a voto, votaríamos em Kamala Harris“, afirma o título.
Personalidades também têm voz ativa
São também várias as personalidades – entre músicos, atletas ou atores, por exemplo – que dão a conhecer publicamente se apoiam uma determinada candidatura. Estes apoios acabam por ser relevantes tendo em conta que cerca de um em cada dez norte-americanos (11%) confessa que uma celebridade já os fez reconsiderar a sua posição sobre uma questão política e que 7% dizem já ter apoiado um candidato político devido ao apoio concedido por uma celebridade.
Entre aqueles que demonstraram apoio a Kamala Harris, encontram-se as artistas Taylor Swift, Jennifer Lopez, Madonna e Cardi B, o ator Harrison Ford ou o jogador de basquetebol LeBron James.
O conjunto de atores que compõem os “Vingadores”, da Marvel – Scarlett Johansson, Robert Downey Jr., Chris Evans, Mark Ruffalo, Don Cheadle, Danai Gurira e Paul Bettany – também demonstraram o seu apoio a Kamala Harris num vídeo conjunto.
Tweet from @MarkRuffalo
Arnold Schwarzenegger, que além de ator foi governador da Califórnia pelos republicanos, também mostrou o seu apoio à candidata democrata, embora afirmando que neste momento não gosta de nenhum dos partidos e que odeia política “mais do que nunca”.
Entre outros atores que também ofereceram apoio à democrata encontram-se nomes como os de Julia Roberts, Leonardo DiCaprio, Whoopi Goldberg, George Clooney , Barbra Streisand, Jane Fonda, Ben Stiller, Matt Damon, Jennifer Aniston, Robert De Niro, Jennifer Lawrence ou Anne Hathaway. Vários músicos também demonstraram o seu apoio publicamente, entre os quais Bad Bunny , Ricky Martin, Eminem, James Taylor, John Legend, Kesha, Billie Eilish, Bruce Springsteen, Neil Young ou Beyoncé, cuja música “Freedom” foi usada pela campanha de Kamala Harris.
Mas para lá do mundo artístico, Kamala Harris é ainda apoiada — sem surpresas — pelo ex-presidente Barack Obama e por Michelle Obama, bem como pelo ex-presidente Bill Clinton e Hillary Clinton. Bill Gates também demonstrou o seu apoio à candidata democrata, tendo entregue 50 milhões de dólares a uma organização sem fins lucrativos que apoia a campanha presidencial de Kamala Harris, segundo o The New York Times.
Já o lado republicano conta com menos personalidades a apoiarem publicamente a candidatura. Do mundo de Hollywood surgiu apoio por parte de atores como Mel Gibson, Dennis Quaid, Jon Voight, Rosanne Barr e Zachary Levi.
Já no panorama musical, Kid Rock, Amber Rose, Chris Janson, Jason Aldean e Azealia Banks expressaram o seu apoio ao candidato republicano. O ex-lutador Hulk Hogan e a lenda do boxe Mike Tyson também apoiam publicamente o ex-Presidente norte-americano. O astronauta Buzz Aldrin, o segundo homem a pisar a Lua, foi outra figura que disse apoiar Donald Trump para futuro residente da Casa Branca.
Por outro lado e de forma bastante expressiva, Donald Trump tem a seu lado o homem mais rico do mundo, Elon Musk. O dono da Tesla, da Space X e do X (ex-Twitter) é um dos maiores financiadores da campanha republicana, tendo doado 118 milhões de dólares para a campanha de Trump. No decorrer da campanha, Elon Musk prometeu também sortear um milhão de dólares por dia a quem se registasse para votar em Donald Trump, tendo surgido dúvidas quanto à legalidade deste tipo de apoio financeiro.
Musk tem estado a fazer campanha por Donald Trump, de forma ativa, tendo inclusive criado um comité de ação política, o America Pac, que está a promover atos de apoio à candidatura republicana.
Já outros magnatas da tecnologia, como Mark Zuckerberg, dono da Meta ou os líderes das gigantes Google e Apple não deram o apoio a nenhum dos candidatos.
Já em agosto, Zuckerberg tinha avançado numa carta que não iria fazer nenhuma contribuição para apoiar as infraestruturas eleitorais nas eleições presidenciais norte-americanas. A decisão surgiu depois de a Chan Zuckerberg Initiative já ter feito doações nas eleições de 2020 – que totalizaram mais de 400 milhões de dólares – com a intenção de garantir que os eleitores pudessem votar de forma segura nas eleições que tiveram lugar durante a pandemia.
No entanto, embora este tivesse sido um apoio “desenhado para ser apartidário”, o mesmo foi interpretado “por algumas pessoas” como se tivesse sido concedido em benefício de um partido e em detrimento do outro, revelou Zuckerberg.
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