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ERC reforça necessidade de uma “verdadeira independência financeira”

Rafael Ascensão,

Mesmo que exista uma "independência legal e funcional" é "razoável defender que ela pode ficar em perigo se não for acompanhada de uma verdadeira independência financeira", diz Pedro Gonçalves.

A Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), através do seu diretor executivo, Pedro Gonçalves, reforçou a importância de uma “verdadeira independência financeira” das entidades reguladoras para que estas sejam autónomas e independentes.

A necessidade de criação de uma entidade que coordene a atividade de todas as entidades reguladoras nos domínios “cinzentos e adjacentes” e a “inquinação” do European Media Freedom Act foram outros dos temas abordados no painel “A independência das entidades reguladoras”, integrado no 1º encontro das Entidades Reguladoras Portuguesas.

No final do encontro, questionado pelo +M, Sebastião Póvoa, presidente da ERC, disse não estar preocupado com o atraso na nomeação dos novos membros para o Conselho Regulador do organismo, afirmando que esta entidade se encontra a funcionar em pleno e que a nova nomeação depende unicamente da ação política.

Na sua intervenção, Pedro Gonçalves referiu assim que as entidades reguladoras precisam de ser “distantes” e “independentes” do poder político e defendeu que mesmo que exista uma “independência legal e funcional” é “razoável defender que ela pode ficar em perigo se não for acompanhada de uma verdadeira independência financeira”, apontando falhas no modelo de financiamento da ERC.

Segundo explicou o seu diretor executivo, a ERC dispõe de três fontes de financiamento: verbas do Orçamento de Estado (via Assembleia da República), receitas provenientes do produto das taxas de regulação e supervisão e das coimas aplicadas e a percentagem “que legalmente lhe cabe” dos resultados líquidos anuais da Anacom (Autoridade Nacional de Comunicações) “há vários anos estabelecida e nunca atualizada”.

O valor a transferir para a ERC nunca é fixado e não é recebido diretamente, tendo em conta que a Anacom está legalmente obrigada a transferir para o Ministério das Finanças o valor que cabe à ERC, sendo que “tal enviesamento legal sujeita a ERC a uma falta de previsibilidade quanto ao recebimento daquele montante“.

Com cativações nos orçamentos, as entidades podem ter a sua ação “amplamente cerceada”, disse Pedro Gonçalves, referindo que compete ao poder político assegurar que as entidades reguladoras independentes disponham de dos meios necessários para exercerem as suas competência e funções.

Em 2021, segundo o Relatório de Atividades e Contas divulgado pela ERC, o “orçamento corrigido” desta entidade foi de quase 11 milhões de euros.

Por sua vez, João Pedro Figueiredo, vogal da ERC e das pessoas “que mais sabe de direito de comunicação social” – tal como o caracterizou previamente Sebastião Póvoas –, defendeu que os governos devem aprovar internamente (a par do que está a acontecer ao nível europeu) uma entidade que coordene a atividade de todas as entidades reguladoras, nos domínios “cinzentos e adjacentes”, em que estas “não se sentem à vontade para intervir”.

João Pedro Figueiredo referiu que a ERC tem algumas dificuldades de intervenção, “até porque não tem competências para isso” em áreas “muito importantes” para a área dos media, como as da regulação do mercado da publicidade, proteção de dados, comunicações eletrónicas ou defesa do consumidor.

Nesse sentido, é “crucial” uma cooperação e atuação conjunta entre reguladores nestas “zonas de interceção” que importa esclarecer e articular, defendeu o vogal da ERC, apelando aos responsáveis políticos para que “levem a sério” estas necessidades e promovam o mais rapidamente possível um sistema que permita esta articulação das atividades dos reguladores.

Mais tarde, João Pedro Figueiredo reforçou ainda que a questão da independência financeira das entidades reguladoras, especialmente na área dos media, tem vindo a ser salientada a nível europeu, em termos de legislação em vigor e em preparação.

Referindo-se em concreto ao regulamento em construção “European Media Freedom Act” – que prevê a existência de entidades reguladoras para todos os Estados-membros e que estas devem ter recursos previsíveis e adequados necessários para o exercício das suas responsabilidades –, o responsável deixou algumas críticas, referindo que este tem “subjacente uma ideia um pouco perigosa do ponto de vista da regulação dos media“.

Isto porque está prevista a criação de um “board” de reguladores ao nível europeu, “inquinado” porque a própria Comissão Europeia pretende ter um elemento seu nomeado para este board, ainda que sem direito de voto.

Outra preocupação demonstrada pelo vogal da ERC passa pela possibilidade desta nova identidade poder a vir a intervir em áreas que são competência das autoridades nacionais, “usurpando” as suas funções. Segundo João Pedro Figueiredo, o Parlamento Europeu foi muito crítico quanto a esta ideia, assim como mais de 12 associações de jornalistas, afirmando que espera que os representantes de Portugal no Parlamento e Concelho Europeu “possam defender os interesses de uma regulação verdadeiramente autónoma”.

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