Media

Trabalhadores da Global Media pedem mais intervenção de reguladores

Lusa,

O PCP e BE requererem audições urgentes com os ministros da Cultura e do Trabalho sobre a reestruturação da Global Media e a aquisição da participação da Agência Lusa pelo Estado.

Os trabalhadores de JN, DN, TSF e O Jogo disseram esta quarta-feira, no parlamento, não compreender o que se passa no grupo Global Media e pediram intervenção dos poderes públicos, desde logo dos reguladores ERC e Banco de Portugal. O PCP e o Bloco de Esquerda querem ouvir os ministros do Trabalho e da Cultura sobre a situação vivida no grupo de media agora controlado por um fundo internacional.

Membros dos Conselhos de Redação (CR) e Comissão de Trabalhadores (CT) de Jornal de Notícias (JN), Diário de Notícias, O Jogo e TSF foram ouvidos esta quarta-feira na Comissão de Cultura, Comunicação Juventude e Desporto, após requerimentos do PCP e do BE, isto quando o grupo Global Media (controlado pelo World Opportunity Fund) está a promover a saída de 150 a 200 trabalhadores (a maioria no JN e na TSF). Em entrevista ao +M, o presidente executivo, José Paulo Fafe, já tinha dito que sem a saída de centenas de funcionários o “grupo morre”.

O membro do CR do JN Augusto Correia disse que o jornal feito sobretudo a Norte é “a voz de milhares de portugueses” que ficará “calada” com os despedimentos e que já há gente silenciada pois muitos correspondentes, pagos à peça, “não conseguem ir trabalhar porque ainda não receberam e não têm dinheiro para a gasolina do carro“.

Augusto Correia pediu aos deputados ajuda para “salvar este grupo”, lembrando que “o jornalismo presta um serviço muito importante à sociedade”, permitindo que “o cidadão comum tenha acesso a direitos fundamentais, à informação e à liberdade de expressão”.

Para a jornalista da TSF e membro do CR Judith Menezes e Sousa, o que se passa “é uma farsa absurda” e questionou como pode um “fundo sem rosto entrar de rompante no meio, sitiar um grupo“, sem que se compreenda o que pretende “além de uma sistemática e perversa situação de esvaziamento das redações“. Pediu intervenção dos poderes públicos para que haja “escrutínio do que está por detrás deste fundo“.

O membro da CT da TSF Filipe Santa-Bárbara defendeu que a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) tem de ser “mais presente, mais forte nos seus pronunciamentos, no seu trabalho enquanto regulador”.

Sobre o fundo, disse que nada se sabe mas parece ser “uma entidade corpórea”, pois “fica zangado, não gosta, tem receio, está a pensar ir embora…”.

O jornalista explicou ainda aos deputados que, perante eles, estava metade da equipa de política da rádio, questionando como podem apenas quatro pessoas fazer parlamento, Governo, Presidente da República e partidos e como será fazer uma campanha eleitoral com o corte anunciado de 30 pessoas.

A TSF está em vias de extinção, não é um soundbite, é o que está a acontecer“, vincou.

Os jornalistas elencaram situações que denotam o grave estado da TSF: deixou de ter acesso à France Presse, não tem jornalista para as madrugadas da época do Natal (ainda antes do despedimento) e há trabalhadores sem dinheiro sequer para comprar o passe.

Ambos os jornalistas da TSF concordaram que urge falar do financiamento da comunicação social. Para Santa-Bárbara, os partidos políticos devem ter “pensamento político e um debate sério” sobre o tema, ainda que, afirmou Judith Menezes e Sousa, esse seja um “debate incómodo e com muitas divergências”.

“No dia em que os jornais convencionais morrerem, as pessoas passarão a consumir informação ainda mais através das redes sociais. Quem consome informação só através desses canais não tem preocupações democráticas”, disse, por seu lado, o membro do Conselho de Redação do Diário de Notícias João Pedro Henriques, que defendeu que os próximos programas eleitorais dos partidos não podem ficar à margem destes temas.

O jornalista defendeu ainda uma espécie de lei do mecenato cívico que dê benefícios a quem investe na comunicação social, pois — afirmou — em Portugal é muito difícil um jornal dar lucro.

Sobre a reestruturação do grupo, João Pedro Henriques disse não compreender “o racional” e que há poderes públicos que devem intervir, questionando se não cabe ao Banco de Portugal perceber quem é o fundo financeiro e a origem do dinheiro para daí se perceber quem está por detrás e o que pretende.

Pelo O Jogo, Ana Luísa Magalhães (do CR) afirmou que há hoje apenas dois jornais nacionais sediados no Porto, o JN e O Jogo, e que estão ambos em risco. Defendeu que o Estado devia ter meios legais para evitar que “qualquer um entre num grupo de comunicação e o vire do avesso”.

Sobre a falta de pagamento aos trabalhadores, nomeadamente a quem trabalha à peça, disse que as pessoas estão muito zangadas, mas também com a “falta de respeito da administração, a falta de empatia” e que, ao mesmo tempo que despede centenas, abriu uma vaga de especialista em marketing e comunicação.

Na audição foi ainda abordada a Lusa. O Estado esteve para comprar a posição da Global Media e da Páginas Civilizadas (ambas detidas, maioritariamente, pelo World Opportunity Fund) na agência de notícias mas o negócio não foi avante por “falta de compromisso político alargado”, disse o Governo.

Em resposta a perguntas de deputados, Ana Luísa Magalhães, de O Jogo, considerou “normal que o Estado tenha querido adiar a resolução deste problema [da Lusa]” para a próxima legislatura pois poderia “ficar com o ónus de estar a financiar o despedimento coletivo” na Global Media.

Filipe Santa-Bárbara, da TSF, disse que há várias dúvidas que ficam desse negócio não concretizado, nomeadamente “o facto de a nova administração da Global Media já contar com esse negócio e sabendo-se que esse negócio foi iniciado ainda por Marco Galinha”.

PCP e BE querem ouvir ministros da Cultura e do Trabalho

Também esta quarta-feira o PCP e o Bloco de Esquerda (BE) anunciaram que vão requerer audições urgentes com os ministros da Cultura e do Trabalho sobre a reestruturação do Global Media Group (GMG) e a aquisição da participação da Agência Lusa por parte do Estado.

Face à conjuntura de despedimentos e atrasos no pagamento dos salários, o PCP considera que é urgente a audição da ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social “para prestar esclarecimentos sobre a intervenção do Governo na garantia do respeito dos direitos dos trabalhadores do GMG e na salvaguarda dos postos de trabalho”.

Já sobre a Lusa, “O PCP entende que o Estado devia ter adquirido as participações sociais com o objetivo de assumir em plenitude o capital social da empresa. Ao longo dos anos ficou claro que os acionistas privados em nada acrescentam à empresa, e têm-se sempre aproveitado da sua posição para retirar vantagens. Para a Lusa, é importante a sua consagração como serviço público de agência de notícias, tal como é importante a valorização e reforço do seu papel estratégico na dimensão da informação”, defende-se no documento do Grupo Parlamentar do PCP.

Neste sentido, “o PCP considera que o Governo, através do senhor ministro da Cultura, deve prestar os devidos esclarecimentos sobre as diligências que adotou”.

Além destes requerimentos dirigidos a Pedro Adão e Silva e Ana Mendes Godinho, a bancada comunista pediu também para ouvir no parlamento as direções demissionárias do Jornal de Notícias, da TSF, de O Jogo e do Dinheiro Vivo, que fazem parte do GMG.

A situação vivida pelos trabalhadores no Global Media Group também levou o Bloco de Esquerda a solicitar a audição urgente da ministra do Trabalho, tendo o partido ainda pedido para ouvir o ministro da Cultura sobre o mesmo tema e sobre a estrutura acionista da Lusa. Os dois requerimentos foram entregues esta quarta-feira na comissão parlamentar de Cultura, Comunicação Juventude e Desporto, pretendendo o partido que os mesmos sejam apreciados na reunião de quinta-feira.

Os bloquistas referem que este grupo de media “atravessa uma situação de enorme instabilidade”, havendo trabalhadores com salários em atraso, contratos que não são renovados e anúncios de despedimentos. “Estão, por isso, em causa os direitos dos seus trabalhadores bem como a qualidade e a sobrevivência de importantes títulos da comunicação social portuguesa”, alerta o BE.

Para os bloquistas, ouvir no parlamento a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, e a Autoridade para as Condições do Trabalho sobre “o desrespeito pelos trabalhadores do Global Media Group” é fundamental para o parlamento, pedindo por isso que estas audições sejam marcadas com caráter de urgência.

Presença de fundo no capital do GMG preocupa BE

Num outro requerimento, os bloquistas pedem ainda “a audição urgente do ministro da Cultura sobre o Global Media Group e a estrutura acionista da Lusa”.

“Quando os acionistas da Global Notícias – Media Group, S.A., e da Páginas Civilizadas, Lda., manifestaram interesse em alienar as suas participações sociais na Lusa, o Governo mostrou disponibilidade para negociar a adquirir uma posição mais significativa na estrutura acionista da agência noticiosa”, refere o requerimento.

De acordo com o texto, a Direção-Geral do Tesouro e Finanças apresentou, em 22 de novembro de 2023, “uma proposta formal de aquisição, que incluía a liquidação integral da dívida do grupo Global Media à Lusa”, mas entretanto “o ministro da Cultura foi informado a 30 de novembro da posição do PSD de que qualquer decisão deveria ser tomada pelo próximo Governo”, o que ditou que o executivo socialista tenha decidido que já não havia condições para concluir esta operação.

“Uma vez mais, é importante lembrar que o Global Media Group, no seguimento de um processo de reestruturação acionista, é agora controlado pelo fundo World Opportunity Fund, um fundo de investimento, sediado nas Bahamas, cujo capital se desconhece”, refere ainda.

A presença deste fundo, através do Global Media Group, na estrutura acionista da Lusa “é motivo de grande preocupação”, segundo o BE.

“O recuo do Governo sobre o aumento da sua participação na Lusa é, por todas estas razões, bastante preocupante. Sendo igualmente importante criar uma situação de maior transparência sobre a propriedade de um Global Media Group, que detém importantes títulos da comunicação social portuguesa”, justificam.

(Última atualização às 18h59 com mais informação)

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