Choques globais dominam taxas de juro pela primeira vez na história
Economistas no Fórum do BCE pedem cautela aos bancos centrais face a um ciclo de taxa de juro sem precedentes que tem sido moldado por choques globais e pelas políticas orçamentais dos Estados.
O último dia do Fórum do BCE em Sintra arrancou com as atenções centradas nos ciclos da política monetária, com as apresentações de Kristin Forbes e Paolo Surico, que trouxeram novas perspetivas sobre os desafios atuais enfrentados pelos bancos centrais.
Kristin Forbes, professora do MIT, apresentou o paper “Rate Cyles”, que mostra a evolução dos ciclos das taxas de juro em 24 economias desenvolvidas ao longo de 55 anos, e que levou a investigadora a concluir que o ciclo atual de taxas de juro é, em muitos aspetos, sem precedentes.
No decorrer da sua intervenção, Forbes destacou que, apesar desta singularidade, o ciclo atual também apresenta semelhanças com períodos anteriores: “O caminho agressivo de aumentos das taxas foi muito semelhante aos ciclos de aperto pré-2008, incluindo o nível em que as taxas de juro se estabilizaram neste ponto do ciclo.”
Um dos pontos mais intrigantes da apresentação de Forbes foi a crescente importância dos choques globais na determinação das taxas de juro. “Os choques globais explicaram mais de 50% da variação nas taxas de juro. É a primeira vez que podemos dizer que os choques globais foram mais importantes do que os choques domésticos na explicação dos movimentos das taxas de juro”, salientou.
Por outro lado, Paolo Surico, professor da London Business School, trouxe uma perspetiva complementar ao estudo de Kristin e dos co-autores do paper (Jongrim Ha e Ayhan Kose), focando-se em três elementos cruciais: salários, inflação dos serviços e política fiscal.
Surico apresentou dados que desafiam algumas perceções comuns. “Apesar de a inflação estar acima da média histórica, os salários não estão”, notando inclusive uma “forte correlação negativa” entre o Índice de Preços no Consumidor na Zona Euro e os salários. “Os salários estão a subir mais tarde do que o IPC”, destacou.
Relativamente à inflação dos serviços, um tema bastante discutido no último painel do Fórum BCE de terça-feira, que contou com a participação de Christine Lagarde (presidente do BCE) e Jerome Powell (presidente da Fed), Surico notou uma mudança significativa relativamente a ciclos anteriores. “A inflação dos serviços atingiu o pico entre seis meses e um ano mais tarde. Isto implica que há um período em que a inflação dos serviços está a subir enquanto a inflação geral está a descer.”
O professor da London Business School também alertou para o papel, muitas vezes subestimado, da política orçamental na inflação recente: “O aumento de 6,5% nos gastos públicos da área do euro em 2020 contribuiu entre 2,5% e 4% para a inflação mundial entre 2022 e 2023”.
Ambos os economistas concordaram que o atual ambiente económico exige cautela por parte dos bancos centrais. Forbes concluiu que “qualquer recalibração das taxas de juro no futuro deve ser cautelosa e gradual”, notando que “há incerteza sobre como este ciclo de taxas se irá traduzir”.
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