Da informática para a liderança de marketing da Unicre, Luís Gama, na primeira pessoa
Vindo da área da tecnologia, Luís Gama foi desafiado há pouco mais de dois anos a liderar o marketing da Unicre, empresa que celebra 50 anos. "Adepto da família", adora correr em trails e maratonas.
Formado em engenharia informática, Luís Gama não é o que se possa chamar de um marketeer puro. Na verdade, chegou à área há pouco mais de dois anos, quando foi desafiado a liderar o marketing da Unicre, empresa criada nas vésperas da revolução de abril e que portanto se encontra a assinalar o seu 50º aniversário.
No entanto, o responsável sempre gostou de desafios e considera que tem trazido valor a uma empresa cuja comunicação é muito assente naquilo que são os seus “valores essenciais e de origem: inovação, confiança, segurança, proximidade, responsabilidade, estabilidade”.
“Ou seja, valores que são fundamentais para manter uma empresa durante 50 anos como uma empresa estruturante, que o é até para a própria economia, uma vez que processa uma percentagem de pagamentos superior a 30%”, diz Luís Gama em conversa com +M, recordando o propósito da empresa, que passa por “ligar pessoas, empresas e tecnologias, criando experiências de pagamento únicas“.
Esta comunicação encontra portanto na inovação a sua base, mas “uma inovação com propósito e não apenas para liderar por liderar“, esclarece. “Lançamos [as inovações] normalmente cedo, mas com uma preocupação em que estas sejam soluções estáveis e robustas, muito focadas e preocupadas com a segurança, porque sabemos – e já antecipávamos – que isso iria ser um aspeto fundamental hoje em dia“, refere.
“Mas, ao sermos uma empresa financeira, a nossa comunicação é também muito responsável, dando também obviamente espaço para a criatividade e inovação das agências que trabalham connosco“, acrescenta. Atualmente, a Unicre trabalha com a JBD (marca), Lift (relações públicas) e Adagietto (redes sociais).
A celebrar cinco décadas de existência este ano, a Unicre, que nasceu nas vésperas do 25 de Abril, marcou a efeméride com o lançamento de uma campanha, assinada pela Lift e que tinha como mote “Um futuro feito de história”.
Ainda a propósito destas comemorações, a Unicre prevê lançar até ao final do ano um livro sobre a sua história e trajeto, bem como promover “uma outra ação um bocadinho mais inovadora” e mais ligada à tecnologia, sobre a qual Luís Gama não quis adiantar mais pormenores.
Ao longo deste meio século de história, a Unicre tem “acompanhado e introduzido a tal inovação e soluções com propósito”, refere Luís Gama, lembrando que a Unicre foi a primeira entidade a lançar o primeiro cartão de crédito nacional, em 1974, e que, desde então, tem vindo a inovar nesta matéria, por exemplo com a introdução dos pagamentos contactless ou através de wallets digitais. “A nossa evolução é o reflexo da evolução da economia e dos pagamentos“, entende.
A liderança de uma área de marketing, no entanto, tem sido um “desafio grande”, reconhece. Afinal, Luís Gama formou-se em engenharia informática na Faculdade de Ciências da Universidade Nova de Lisboa, tendo trabalhado numa empresa da área – a Audaxys – antes de integrar o Millennium BCP, onde trilhou um trajeto que passou por várias áreas, “aproveitando aquela que é a cultura do BCP de rotação por várias setores”, desde as áreas de produto, comercial, marketing, canais, área internacional”.
Transitou em 2011 para a Unicre, onde acabou por ficar responsável pela área de sistemas de informação e depois também de operações. Está apenas há dois anos a liderar o marketing, depois de uma reestruturação interna da Unicre, através da qual foi criada uma direção de marketing e uma direção comercial, com a área comercial a focar-se naquilo que é a venda e a direção de marketing a dar ênfase, entre outras, a tudo o que são funções de corporate marketing.
Apesar do desafio, Luís Gama considera que este, com o apoio dos colegas e de toda a estrutura, tem sido superado e têm sido alcançados bons resultados. “Acho que temos dado resposta. É um desafio que dá alguma luta, é uma área bastante diferente daquelas em que tenho estado, mas estou a gostar muito de estar nela e deste desafio, e acho que estou a ser útil à empresa, que também é sempre a minha principal preocupação“, diz.
“Acho que tenho trazido valor. Gosto destes desafios. Entretanto já tinha feito um MBA e, no ano passado, depois de um ano de experiência a liderar a área, decidi fazer um mestrado em Marketing e Estratégia que também estou a gostar muito”, refere.
O responsável diz estar a gostar bastante de uma área que não era a sua formação de base, desde logo porque lhe permite “juntar competências que trouxe de áreas anteriores para aquilo que é construir produto e desenvolver oferta, onde é fundamental ter uma perspetiva daquilo que é fazível“. Isto porque “muitas vezes não há a visão do que é possível fazer-se do lado de sistemas de informação e daquilo que hoje as tecnologias nos permitem, sendo que a nossa empresa assenta essencialmente em tecnologia”, acrescenta.
Nascido em Luanda, Angola, Luís Gama veio com quatro anos com os pais para Portugal, tendo ficado a viver no Barreiro, onde jogou basquetebol durante muitos anos e onde ainda hoje tem “muitos amigos”. No entanto, ficou sempre uma “grande ligação” às raízes dos pais, na aldeia de Janeiro de Cima, no concelho do Fundão. “A minha aldeia é Janeiro de Cima“, diz.
Atualmente vive em Lisboa e um carro comum de cinco lugares não serviria para transportar a família inteira. À sua esposa, juntam-se no seu agregado familiar quatro filhos – o Vasco (com 24 anos), o Afonso (20), a Marta (19) e a Rita (16). “Sou um adepto da família, para mim é um aspeto fundamental nas decisões que tomo. No âmbito daquela vontade de aceitar desafios, há apenas um aspeto que tenho sempre presente que é a família e o impacto que estas decisões podem ter nela”, diz.
É a família, aliás, que elege como o maior desafio da sua vida – embora não pense nela como um desafio, mas antes enquanto algo em que se empenha mais do que no resto – e que passa por conseguir ter uma família “estruturada”, onde não falte aquilo que acha que é importante, sempre “com valores”.
“O grande desafio é ter uma vida familiar estruturada, sólida, com confiança entre todos, duradoura. Gostava muito deixar essa marca nos meus filhos, que eles vissem que isso é importante para todos e que quando este nosso desafio não é concretizado, os outros até podem pontualmente concretizar-se, mas falta-lhes esta estabilidade“, refere.
O tempo livre não é tanto como gostava, mas consegue sempre arranjar algum. “Mesmo quando não o tenho, invento. Ainda no outro dia fui correr às onze da noite”, diz. O desporto e as corridas são precisamente as atividades a que dedica mais tempo (para lá da família), gostando bastante de fazer maratonas e trails.
Além disso, gosta muito de viajar, pelo que aproveita sempre que pode para juntar as duas coisas, planeando maratonas e trails no estrangeiro. “É quase uma forma de organizar viagens ao estrangeiro com a família“, diz, acrescentando que este ano esteve no norte de Itália e nos Alpes franceses. Para lá das viagens, as férias de verão são passadas entre a baía de São Martinho – onde a mulher sempre passou férias – e o rio Zêzere, em Janeiro de Cima.
A gastronomia é outra das suas paixões, tanto no que toca à arte de cozinhar como à de comer. O gosto por cozinhar, aliás, é muitas vezes a “tática” que usa para juntar amigos e família. “Gosto de cozinhar – normalmente sou eu que cozinho – e gosto de cozinhar pratos essencialmente portugueses, na maior parte dos casos um bocadinho mais pesados, refletindo um pouco aquela que é a matriz culinária da minha zona [Janeiro de Cima], seja maranhos, cabrito… tudo o que seja esse tipo de pratos”, revela.
O desafio que viu os pais enfrentar, quando regressaram a Portugal vindos de Angola e tiveram de reconstruir a sua vida – reconhecendo-lhes bastante “ímpeto e energia” -, foi algo que o marcou bastante e à sua forma de ver a vida. A este episódio, enquanto momento que mais marcou a sua vida, soma-se aquele em que decidiu planear a sua vida familiar e a decisão conjunta com a mulher de se focarem na família.
“Acho que são os dois momentos que marcaram um pouco a minha forma de ser e de estar. Os outros são situações pontuais“, diz.
Luís Gama em discurso direto
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1. Que campanhas gostava de ter feito/aprovado? Porquê?
Uma das campanhas internacionais pelas quais gostaria de ter sido responsável é a campanha Mother Nature, da Apple. Para além de ser a minha marca preferida, e que me acompanha há mais de 20 anos, a Apple é uma marca que conquista a lealdade dos consumidores, não apenas devido à sua qualidade técnica, mas também graças à inovação que constantemente apresenta ao mercado. Esta campanha retrata uma reunião da respeitada (e temida) Mãe Natureza com a Apple e revela, de uma forma totalmente original e brilhantemente executada, os resultados do relatório de sustentabilidade da marca.
A nível nacional, devo confessar que sou fã das campanhas da Vodafone, especialmente das campanhas de Natal, porque retratam a realidade do espírito de união das famílias portuguesas e da importância de estarmos presentes para os nossos, mesmo que essa presença aconteça à distância, por via de um telefonema ou uma videochamada.
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2. Qual é a decisão mais difícil para um marketeer?
Acredito que seja gerir as incertezas do mercado e as expectativas do público para quem comunicamos. É essencial criar uma relação que vá para além do negócio, mas que não seja evasiva e é imprescindível manter a essência da marca mesmo perante limitações tão reais como prazos a cumprir e orçamentos a respeitar.
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3. No (seu) top of mind está sempre?
A minha família. Como filho sou uma pessoa muito grata pela educação que tive e pela relação tão próxima que sempre tive com os meus pais e irmão. Enquanto pai, espero que um dia os meus filhos possam dizer o mesmo em relação a mim e reconheçam a família como suporte essencial na nossa vida.
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4. O briefing ideal deve…
No meu entender, o briefing ideal deve ter objetivos claros, público-alvo bem definido, concorrência identificada, mensagens estruturadas, considerações legais e éticas, orçamento, espaço para a criatividade e métricas de sucesso previamente definidas.
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5. E a agência ideal é aquela que…
A agência ideal é aquela que, para além de conhecer a nossa organização de dentro para fora e de compreender as suas necessidades, está alinhada com a nossa missão e desafia-nos a pensar e a inovar além do status quo. Por vezes estamos tão focados no trabalho do dia-a-dia, no cumprimento de prazos e na gestão de formalidades corporativas, que nos esquecemos de que para vermos a ilha, temos de sair da ilha. Uma agência que nos relembre que precisamos de pensar e fazer fora da caixa é uma agência com espírito crítico no seu ADN e constitui um parceiro que não se limita a dar-nos aquilo que nós achamos que queremos, mas que nos dá, com dados e explicações, aquilo que nós precisamos e não sabíamos.
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6. Em publicidade é mais importante jogar pelo seguro ou arriscar?
Na Unicre seguimos o lema Unlocking Future, por isso procuramos arriscar tanto no negócio como na comunicação, mantendo sempre um equilíbrio entre a disrupção e a segurança que prometemos aos consumidores. A publicidade vive do equilíbrio. É preciso arriscar dentro dos limites daquilo que é aceitável e exequível para a marca e o regulador. No setor financeiro precisamos de ter a noção do mercado em que nos inserimos, que é um mercado tendencialmente mais sério e corporativo. No entanto, isso não é impedimento para não sermos inovadores na nossa comunicação.
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7. O que faria se tivesse um orçamento ilimitado?
Se tivesse um orçamento ilimitado organizaria um grande projeto de literacia em pagamentos (programa transversal e adequado a diferentes gerações e estratos sociais). O 4.º Inquérito à Literacia Financeira da População Portuguesa apurou que Portugal ficou em 13.º lugar, entre os 39 países participantes, no que concerne ao indicador global de literacia financeira. Este resultado parece não refletir um panorama extremamente preocupante, mas a verdade é que somos o segundo país da União Europeia pior classificado em literacia financeira, sobre questões como inflação e juros. Sinto que a literacia financeira em Portugal ainda tem muito por onde ser explorada e que, nas circunstâncias económicas atuais, todos poderiam beneficiar de uma formação sobre esta temática, com impacto muito positivo nos negócios em geral, e no nosso em consequência, atuando como fator indutor de geração de riqueza para o país.
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8. A publicidade em Portugal, numa frase?
Sou recente neste setor, mas diria que na maioria dos casos combina a criatividade e a emoção, de forma responsável e com toque muito humano, refletindo as características do povo português, muito sentimental, expressivo e com apelo ao toque e contacto humano. No fundo, a nossa publicidade espelha muito bem a nossa cultura e dinâmica interpessoal.
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9. Construção de marca é?
A construção de marca é, nada mais nada menos, do que a construção de relações duradouras de reconhecimento e confiança com os consumidores. Construir uma marca é criar uma identidade única, suportada em valores consistentes e sustentáveis, de forma a ligá-la emocionalmente às pessoas estabelecendo uma relação que perdure e que permita diferenciar-se no mercado.
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10. Que profissão teria, se não trabalhasse em marketing?
Se não trabalhasse nesta área, provavelmente seria novamente CIO (chief information officer), porque a minha formação académica foi na área dos sistemas de informação na Universidade Nova de Lisboa, que complementei com um MBA em gestão na Católica e um mestrado em marketing e estratégia na Nova SBE.
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