Congresso Internacional sobre a Habitação e a Cidade insta as instituições a procurarem abordagens transdisciplinares para inverter a crise da habitação com o apoio das universidades públicas

  • Servimedia
  • 27 Maio 2025

Os académicos pedem que se torne efetivo o direito à habitação reconhecido constitucionalmente, como base de um verdadeiro serviço público de habitação.

A Càtedra Barcelona d’Estudis d’Habitatge (CBEH) inaugurou o 1º Congresso Internacional sobre Habitação e Cidade, que se realiza durante dois dias na Escola de Gestão de Barcelona (UPF). O congresso reúne especialistas locais e internacionais para analisar os grandes desafios da emergência habitacional numa perspetiva transdisciplinar e europeia.

A conferência contou com a presença da ministra catalã do Território, Habitação e Transição Ecológica, Sílvia Paneque; do quarto vice-presidente da Câmara Municipal de Barcelona e responsável pela Habitação, Jordi Valls, e de representantes das quatro universidades que promovem a Cátedra: Joan Guàrdia, reitor da Universidade de Barcelona (UB); Daniel Crespo, reitor da Universitat Politècnica de Catalunya (UPC); Vanesa Daza, vice-reitora de Transferência de Conhecimento da Universitat Pompeu Fabra (UPF), e Xavier Gabarrell, vice-reitor de Campus e Sustentabilidade da Universitat Autònoma de Barcelona (UAB). Todos eles concordaram com a importância da investigação colaborativa e aplicada numa área tão crítica como a habitação.

O encontro centra-se em questões como a regulação do mercado da habitação, a vulnerabilidade, a segregação, a saúde e as transformações urbanas, com o objetivo de gerar conhecimentos úteis para promover políticas públicas mais eficazes.

Josep Ferrer, codiretor da Cátedra, deu as boas-vindas aos participantes e lembrou que “a crise da habitação é estrutural e complexa, e só a partir da soma de disciplinas e atores podemos construir respostas úteis e transformadoras. É essa a missão da Cátedra e esta conferência é uma expressão clara disso mesmo”.

A conselheira Sílvia Paneque assegurou que a administração catalã conta com o mundo académico para “aproveitar o seu rigor” na hora de “desenhar políticas públicas eficientes e eficazes”, especialmente no atual momento delicado em relação ao acesso à habitação.

Paneque explicou que a Generalitat trabalha com a premissa de nunca perder a propriedade pública como forma de expandir o parque habitacional público. O conselheiro e porta-voz explicou que “estão a ser procuradas mudanças estruturais para um problema estrutural” e que estão a ser considerados múltiplos fatores, como a segurança e a melhoria dos bairros, para além das políticas diretamente relacionadas com a habitação. Esta abordagem pluridisciplinar do problema da habitação está em conformidade com as iniciativas da presidência.

Na mesma linha, o Tenente Jordi Valls reflectiu sobre a necessidade de colaboração entre o mundo académico, o setor público e o setor privado, o que deverá permitir recuperar uma política de habitação ambiciosa: “Temos de pensar em conjunto no que aconteceu nos últimos quinze anos para chegar à situação atual”, afirmou. Por fim, assegurou que o direito à habitação deve ser tratado “com a mesma centralidade que a saúde ou a educação, pois é um dos pilares fundamentais do Estado Social”.

Todos os oradores concordaram com o valor da trajetória da Cátedra, que em apenas três anos se consolidou como um espaço de conhecimento útil e transversal, com vocação europeia e serviço público, e sublinharam a necessidade de reforçar a ligação entre a universidade, as instituições públicas e a sociedade.

BAIRROS

Após a inauguração, que teve lugar na segunda-feira, a conferência começou com a palestra inaugural de Jean-Bernard Auby, Professor de Direito na Sciences Po (Paris), dedicada às cidades inteligentes, tema do seu último livro em processo de tradução para espanhol pela Cátedra, que será publicado este ano pela editora Marcial Pons. Auby sublinhou que a digitalização, a inovação e as novas tecnologias de utilização dos dados, como a inteligência artificial, estão a transformar as infra-estruturas, a governação e os serviços públicos. Embora tenha reconhecido que ainda não existe um modelo jurídico específico para a cidade inteligente, sublinhou a necessidade de avançar para uma regulamentação que garanta a transparência, a equidade e a colaboração dos cidadãos.

A primeira mesa-redonda da conferência, moderada pelo codiretor da Cátedra Montserrat Pareja-Eastaway, ofereceu uma perspetiva das ciências sociais sobre a habitação, mostrando como os problemas de acessibilidade estão articulados numa estrutura social, jurídica e política mais ampla. Irene Sabaté (UB) salientou que o direito à habitação não é protegido com a mesma firmeza que o direito à propriedade e identificou três formas principais de violação: inacessibilidade, instabilidade e inadequação. Durante a tarde, a Professora Sabaté apresentou também o seu novo livro Un lugar donde volver. Mujeres en lucha por una habitación propia (Ed. Bellaterra, 2024).

Perante estes problemas, surgiram nos últimos anos diferentes movimentos sociais em defesa da habitação que, segundo os investigadores João França (UB) e Jordi Mir (UPF), foram decisivos para transformar a perceção coletiva do direito à habitação e para promover alterações legislativas. Por fim, Sergi Valera (UB) destacou o espaço público como parte essencial do ecossistema residencial e como local de interação social que contribui para o bem-estar, do qual muitos grupos continuam a ser excluídos.

Na mesa redonda sobre a habitação, a vulnerabilidade e os sem-abrigo, moderada por Juli Ponce, co-diretora da Cátedra, Wellington Migliari (UB) insistiu na importância dos bairros e dos ambientes como fatores de socialização. Utilizando o estudo de caso de Belo Horizonte (Brasil), Migliari salientou que a adolescência é muitas vezes um momento crítico em que muitas pessoas perdem a condição de lar, e defendeu a necessidade de políticas públicas que abordem a situação de sem-abrigo numa perspetiva estrutural, preventiva e territorializada. Durante a tarde, Migliari apresentou o seu último livro El Derecho a la Vivienda y la Ciudad: ¿efectividad y exigibilidad de un hogar? (Ed. Tirant Lo Blanch, 2025).

A mesa redonda “Segregação residencial, gentrificação, turistificação”, moderada pela co-diretora da Cátedra Judith Gifreu, abordou igualmente a relevância dos bairros. Montse Simó e Karla Berrens (UB) apresentaram o estudo “Luxury housing or is housing a luxury?” sobre a transformação urbana e social da Dreta de l’Eixample. Analisaram a forma como este bairro está cada vez mais orientado para o mercado internacional de luxo, com casas que atingem preços de até 18.000 euros por mês, enquanto a população residente sofre uma deslocação subtil mas constante.

A análise dos anúncios imobiliários e as entrevistas com os vizinhos revelaram uma clara substituição social, com os residentes nacionais a abandonarem mais o bairro, enquanto os recém-chegados – principalmente de Itália, França e Argentina – se instalam com mais frequência. Os investigadores alertaram ainda para a alteração da utilização do espaço público e do comércio local, bem como para a desvantagem estrutural dos inquilinos face à expansão dos grandes operadores imobiliários. Neste processo, concluíram, o luxo não está a ser vendido apenas como um bem tangível, mas também como uma experiência de vida exclusiva, sendo Barcelona um cenário atrativo para um público global.

Fernando Gil Alonso e Cristina López Villanueva apresentaram em seguida um estudo sobre a fragmentação espacial das zonas urbanas espanholas e os seus efeitos na coesão social. O estudo mostra que os grupos africanos são os mais segregados e fragmentados, especialmente em Barcelona, enquanto os cidadãos europeus tendem a concentrar-se nos centros históricos e nos bairros de classe média. Esta distribuição gera barreiras sociais e territoriais que dificultam a interação entre grupos, enfraquecem os laços comunitários e consolidam as desigualdades estruturais no acesso à habitação e aos recursos urbanos.

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