Farmacêuticas nacionais mais que duplicaram vendas para EUA antes do ‘Dia da Libertação’

Empresas da saúde exportaram mais 160% no primeiro trimestre do que entre janeiro e março de 2024. Indústria mantém-se "confiante" na capacidade de produção e na cadeia de abastecimento global.

Sob o antigo ditado de que “prevenir é o melhor remédio”, as farmacêuticas portuguesas terão tentado antecipar-se às tarifas dos Estados Unidos (EUA), o segundo maior destino das suas vendas, e procurado escoar os produtos e ingredientes de medicamentos para o outro lado do Atlântico antes do chamado “Dia da Libertação”, a 2 de abril.

No primeiro trimestre, as exportações da saúde para Estados Unidos cresceram 32,5%, em termos homólogos, para 484 milhões de euros. Só de fevereiro para março, estas empresas mais que duplicaram as exportações para a maior economia do mundo de 131 milhões para 286 milhões de euros. Na prática, os EUA representavam 16% das vendas de produtos farmacêuticos e de preparações farmacêuticas de base e passaram para 69% em apenas um mês.

Em janeiro, mês da tomada de posse de Donald Trump, o mercado norte-americano valia apenas 7% das exportações do setor ou cerca de 63 milhões de euros. Entretanto, em meados de fevereiro, os Estados Unidos estimaram taxar os produtos farmacêuticos em “25% ou mais” e levaram as vendas a aumentar de 63 milhões de euros no início do trimestre para quase 300 milhões no final de março.

O Instituto Nacional de Estatística (INE) divulgou esta segunda-feira novos dados sobre as exportações, referentes a abril, que permitem perceber que a atividade das farmacêuticas para o mercado norte-americano – que se havia intensificado nos meses anteriores – voltou a estabilizar no quarto mês de 2025. As organizações ligadas ao setor descartam comentários ou explicações, mas a queda coincide com o facto de, no temido dia 2 de abril, a administração Trump ter revelado que os produtos farmacêuticos iam ficar de fora das tarifas recíprocas, a par com os artigos de cobre.

Depois de ter escapado ao reforço das taxas aduaneiras, a indústria mantém-se num impasse e, simultaneamente, a preparar-se para qualquer investida da administração Trump. Ainda no início de maio, já depois da avalanche tarifária, o presidente dos Estados Unidos disse que iria anunciar tarifas sobre produtos farmacêuticos dali a “duas semanas”, logo após ter assinado uma ordem executiva para promover o seu fabrico em território norte-americano. Certo é que se passaram cinco semanas e não houve novidades da Casa Branca nesse sentido.

Empresas estão confiantes na cadeia de valor

As multinacionais do setor que estão presentes em Portugal corroboram a volatilidade e dinamismo internacional com os quais o mercado se depara, embora afirmem que a situação ainda é controlável e que estão a trabalhar na mitigação de “quaisquer potenciais impactos nos doentes”.

A situação continua a ser muito volátil e estamos a acompanhar de perto e a avaliar os potenciais impactos à medida que mais pormenores vão ficando disponíveis. Entretanto, estamos confiantes de que, com a nossa cadeia de abastecimento global e as nossas capacidades de produção, podemos continuar a fornecer medicamentos aos doentes, sejam eles pessoas ou animais”, referiu fonte oficial da alemã Boehringer Ingelheim.

“O ambiente externo é dinâmico e está a evoluir rapidamente. Consideramos que a situação atual é controlável e estamos confiantes na nossa capacidade de lidar com as mudanças na política e implementar quaisquer potenciais medidas de mitigação de forma ponderada e eficaz”, comentou a suíça Roche.

Enquanto administrador da Federação Europeia das Associações e Indústrias Farmacêuticas, o CEO da Bial, António Portela, assinou a carta que dezenas de farmacêuticas enviaram a Bruxelas a pedir apoio à Comissão Europeia para conseguir manter as operações na União Europeia, perante este risco em Washington e o aumento da regulação comunitária.

Questionada sobre a missiva, fonte oficial da farmacêutica portuguesa diz que traça medidas para garantir que a Europa continua a ser base de investigação, desenvolvimento e fabrico de medicamentos, nomeadamente “o fortalecimento das normas europeias de propriedade intelectual, a adoção de um quadro regulatório favorável à inovação e a coerência entre políticas ambientais e químicas”.

A inovação é crítica para os pacientes, para os sistemas de saúde e para a economia europeia. A Europa precisa de assumir um compromisso sério com o investimento no ecossistema farmacêutico, ou corre o risco de se tornar apenas consumidora da inovação de outras regiões

Fonte oficial da Bial

A Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica (Apifarma) recusa comentar este movimento do setor e a política protecionista do presidente norte-americano, mas garante ao ECO que “está alinhada com o posicionamento da EFPIA [European Federation of Pharmaceutical Industries and Associations] e encontra se a acompanhar a evolução dos acontecimentos”.

Vendas da saúde disparam 160% no primeiro trimestre

No cômputo geral, entre janeiro e março, as empresas da saúde venderam 2.244 milhões de euros para o exterior, o que representa um aumento de cerca de 160% em relação aos primeiros três meses de 2024, segundo a Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (Aicep) com base na informação do INE.

O Health Cluster Portugal constata que a tendência de crescimento das exportações da fileira da saúde, que foi recordista no ano passado, continua a verificar-se em 2025. “No que respeita ao tipo de produto, o maior aumento verificou-se no segmento da fabricação de preparações farmacêuticas, passando de um total de 698 milhões de euros registados no mesmo período do ano passado, para 2.021 milhões de euros entre janeiro e março de 2025, um aumento de 189,5%. Em segundo lugar, destaca-se a exportação de produtos farmacêuticos de base, com um aumento de 71,4%, correspondente a um total de 72 milhões de euros”, informa o cluster de saúde em resposta ao ECO.

Importa ainda realçar que a Alemanha destronou os Estados Unidos enquanto principal destino das exportações portuguesas da fileira da saúde ao registar um volume na ordem dos 1.268 milhões de euros no primeiro trimestre, mas só conquistou a liderança por causa de janeiro e fevereiro, meses nos quais as exportações de produtos farmacêuticos para a Alemanha totalizaram 1.235 milhões. Em março, com o agudizar da guerra comercial e a necessidade de investir noutros mercados, as exportações destes bens e substâncias para a maior economia da Europa caíram a pique para 20,8 milhões de euros.

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