Espanha terá de recrutar mais de 4 600 profissionais da segurança e da defesa para responder aos novos conflitos mundiais
De acordo com relatório “Previsiones ante un escenario de conflicto”, elaborado pelo Instituto de Ciencias del Empleo y las Relaciones Laborales (Instituto de Ciências do Emprego e Relações Laborais).
O recrudescimento dos conflitos armados na Europa Oriental e no Médio Oriente, associado a possíveis mudanças na política externa dos EUA, está a transformar profundamente o panorama internacional. Neste novo contexto, a segurança e a defesa tornaram-se centrais nas agendas políticas e económicas dos países europeus, obrigando as suas indústrias a reagir rápida e proativamente.
Isto reflete-se no relatório “Previsões num cenário de conflito”, elaborado pelo Instituto de Ciências do Emprego e Relações Laborais (ICER), que alerta para os profundos desafios que o setor da segurança e defesa em Espanha enfrenta neste ambiente em mudança. Ao mesmo tempo que se abrem novas oportunidades de participação em programas internacionais, intensificam-se as exigências regulamentares, tecnológicas e de qualificação dos talentos.
Uma das principais conclusões do relatório é que, nos próximos cinco anos, o setor necessitará de incorporar entre 3300 e 4650 novos profissionais. Destes, alguns terão de se especializar em disciplinas tecnológicas – como a cibersegurança ou a inteligência artificial -, bem como noutras áreas como a sustentabilidade, o cumprimento da regulamentação ou a gestão responsável das exportações estratégicas. Além disso, os perfis híbridos – que combinam conhecimentos técnicos com conhecimentos de regulamentação internacional – e os gestores de projetos internacionais, essenciais para a coordenação das exportações e das alianças multilaterais, são identificados como perfis críticos.
“A Espanha encontra-se num ponto de viragem. A nossa indústria de defesa tem a oportunidade de se consolidar como um ator chave no novo equilíbrio global, mas apenas se for capaz de responder com agilidade a um ambiente marcado pela pressão tecnológica, crescentes exigências regulamentares e intensa competição internacional por talentos”, afirma o ICER. “Com este relatório pretendemos alertar para os profundos desafios que o setor enfrenta neste novo cenário global. À medida que se abrem novas oportunidades de participação em programas internacionais, também se intensificam as exigências regulatórias, tecnológicas e de qualificação de talentos”, salientam.
Um dos desafios mais imediatos para o setor é o aumento das despesas de defesa dos países europeus. Em resposta à invasão da Ucrânia, foram ativados projetos colaborativos de grande escala, como o Future Combat Air System (FCAS) ou o Eurodrone, nos quais a Espanha pode desempenhar um papel relevante como fornecedor de capacidades-chave. No entanto, esta liderança só será viável se a indústria nacional for capaz de responder a uma procura tecnológica crescente, de acordo com o nível de sofisticação e competitividade exigido por estes programas.
O desafio é tão urgente quanto ambicioso. De acordo com o relatório, serão necessários entre 2.400 e 3.300 novos especialistas em áreas tecnológicas chave, com perfis altamente qualificados, dentro de três a cinco anos. Entre as disciplinas mais procuradas estão a cibersegurança, a inteligência artificial, os sistemas autónomos e a defesa aérea, entre outras. Um facto particularmente revelador é que 30-40% das vagas de cibersegurança são atualmente difíceis de preencher devido à escassez global de talentos em cibersegurança.
A esta necessidade junta-se o desafio da reconfiguração das cadeias de abastecimento. A União Europeia está a promover a sua autonomia estratégica e procura reduzir a sua dependência tecnológica de atores externos como os Estados Unidos e a China. Neste contexto, a Espanha pode ganhar peso se a sua indústria conseguir responder à procura de componentes críticos e alinhar-se com as normas europeias. No entanto, esta oportunidade também impõe uma pressão estrutural sobre a capacidade de produção e a adaptação regulamentar.
PROCURA E SUSTENTABILIDADE
Paralelamente, o reforço da relação transatlântica com os Estados Unidos pode posicionar a Espanha como uma base logística fundamental entre a Europa e o Norte de África. Este papel geoestratégico obriga as empresas a adaptarem-se às normas americanas de interoperabilidade, tecnologia e conformidade, especialmente no âmbito dos projetos conjuntos promovidos pela NATO.
Em Espanha, o governo autorizou recentemente aumentos no orçamento da defesa de quase 7 mil milhões de euros só este ano, uma decisão que foi autorizada pelo Conselho de Ministros e que aproxima o país dos compromissos internacionais em matéria de despesas militares e de defesa.
Outra frente geopolítica relevante é o Médio Oriente e o Norte de África, onde o aumento das tensões está a gerar uma procura crescente de equipamentos, tecnologia e sistemas de vigilância. A experiência acumulada pela indústria espanhola em missões internacionais pode permitir-lhe competir nestes mercados. No entanto, terá de o fazer no estrito cumprimento dos quadros éticos e legais da UE, que exigem a máxima rastreabilidade e transparência.
A sustentabilidade também surge como uma variável transversal neste novo ambiente. Cada vez mais, os contratos no setor da defesa serão condicionados por critérios ESG (ambientais, sociais e de governação). De acordo com o ICER, o setor terá de incorporar entre 300 e 450 novos profissionais especializados em sustentabilidade, conformidade regulamentar e gestão responsável das exportações estratégicas.
Neste cenário de transformação acelerada, a indústria da defesa espanhola deve não só adaptar-se, mas também antecipar-se. A sua capacidade para atrair talento qualificado, liderar a inovação tecnológica e alinhar-se com os padrões internacionais será decisiva para se posicionar como um parceiro fiável nos grandes programas europeus e mundiais. Mais do que uma necessidade circunstancial, esta é uma oportunidade estratégica para redefinir o papel de Espanha no novo mapa da segurança internacional.
Para além do desafio tecnológico e regulamentar, o setor da defesa e da segurança – que também inclui a segurança privada e os serviços auxiliares conexos – enfrenta uma intensa pressão salarial. Em 2025, o governo aprovou um aumento de 400 milhões de euros nos salários do pessoal militar, com aumentos médios de 200 euros por mês. Paralelamente, os salários em áreas tecnológicas como a cibersegurança e a inteligência artificial já ultrapassam os 66 000 euros brutos por ano em posições intermédias e atingem os 100 000 euros brutos por ano em perfis seniores altamente especializados.
A segurança privada também regista uma subida dos salários, impulsionada pelo reforço das infra-estruturas críticas, pelos eventos internacionais e pela digitalização do setor. Com uma previsão de crescimento anual de 7 % para a cibersegurança e o objetivo do governo de atingir 2 % do PIB em despesas de defesa até 2029, espera-se um aumento acumulado de até 12 % nas faixas salariais do setor no seu conjunto, reforçando a sua atratividade para novos perfis profissionais e empresas internacionais.
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