Para lá da regulação, associações dos media preocupados com a sustentabilidade do setor
Num painel relacionado com o novo quadro legislativo europeu, a palavra de ordem entre os responsáveis de associações dos media foi "sustentabilidade".
“Sustentabilidade” foi a palavra mais usada no painel “Novo quadro legislativo europeu: desafios à implementação”, integrado na conferência da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) “20 Anos de Regulação: A Comunicação Social e o Futuro Digital”, onde os responsáveis por associações de media clamaram por apoios ao setor.
“Gostava de falar de regulamentação, mas neste momento não posso falar de outra coisa que não seja sobrevivência“, disse na mesa redonda o presidente do Sindicato dos Jornalistas, Luís Filipe Simões, que defendeu que o apoio do Estado para a sustentabilidade da profissão é essencial.
Luís Filipe Simões, que também afirmou que “o jornalismo é hoje feito por um exército de precários”, apontou que se há 20 anos tivesse dito que o poder político e os governos têm de apoiar o jornalismo, todos o chamariam “louco” pelos perigos da interferência do Estado na Comunicação social. “Acontece que hoje ou há este apoio e preocupação em tornar sustentável este pilar [da democracia] ou o futuro será muito negro“, rematou.
Por parte da Associação Portuguesa de Imprensa (API), Cláudia Maia também reforçou que o que o setor precisa “acima de tudo” é de sustentabilidade financeira, embora conceda que as diretivas e a regulação também possam contribuir para a sustentabilidade da imprensa em Portugal.
Depois de apontar que o investimento publicitário na imprensa caiu mais de 50% nos últimos cinco anos e que são registadas quebras nas receitas dos subscritores (seja em papel ou no digital), a presidente da API realçou que a inteligência artificial (IA) também veio mudar o paradigma da informação, agravando as questões financeiras inerentes aos meios de comunicação.
Cláudia Maia defendeu ainda que as autarquias têm atualmente “máquinas de comunicação com mais capacidade que determinados meios de comunicação” e que “põem e dispõem da informação e sem a passarem aos meios que a procuram para poderem fazer o contraditório e análise”. É também este fator, defendeu, que leva ao crescimento dos desertos noticiosos no país, onde 27% dos municípios têm apenas um ou nenhum meio de comunicação social.
A concordar com estas ideias no debate esteve também Manuela Goucha Soares, presidente do Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas, que afirmou que “a sustentabilidade é de facto a grande preocupação dos jornalistas neste momento, assim como dos órgãos de comunicação“.
E se isto é “particularmente visível na imprensa regional, em que é quase um ato de coragem e resistência diária conseguir manter um jornal ou rádio local a funcionar”, o problema também atinge órgãos de comunicação de expressão nacional, apontou.
Também Luís Mendonça, presidente da Associação Portuguesa de Radiodifusão, defendeu que o que é preciso é sustentabilidade no setor e que a associação a que preside tem trabalhado nesse sentido, apresentando “várias propostas” aos diferentes governos. O responsável aplaudiu a recentemente implementada medida relacionada com a obrigatoriedade de atribuição de tempos de antena nas rádios em todos os momentos eleitorais, que para as rádios locais é “estruturante”. “Pode parecer um valor pequeno, mas para as rádios locais é muito importante”,
“É interessante que num painel sobre o novo quadro legislativo europeu, desafios à implementação, a palavra tenha sido sustentabilidade. E isso diz muito sobre a situação do setor que nós temos todos de acarinhar em virtude de a missão que lhe é confiada em nome da sociedade“, resumiu Pedro Correia Gonçalves, vice-presidente do Conselho Regulador da ERC, que moderou o debate.
“Os meios de comunicação atuais estão numa encruzilhada entre preservar a independência editorial e garantir a sobrevivência económica”, afirmou também Carla Martins, vogal da ERC.
Quadro legislativo europeu para os media coloca desafios aos reguladores
Também presente na conferência, a presidente da Anacom, Sandra Maximiano, considerou que a implementação do quadro legislativo europeu referente aos media e ao digital “coloca desafios significativos” aos reguladores, pela integração das matérias nos diferentes domínios setoriais.
“As matérias que antes se encontravam em domínios setoriais distintos, telecomunicações, conteúdos audiovisuais, publicidade, passam agora a interagir num contexto regulatório interdependente, que requer diálogo permanente entre os reguladores, governos e operadores”, referiu a presidente da Autoridade Nacional de Comunicações (Anacom).
Sandra Maximiano, afirmou ainda que Portugal enfrenta três “grandes desafios” à implementação do quadro legislativo. O primeiro desafio é o da “coerência regulatória”, sendo que a Anacom acredita que “uma articulação sólida entre reguladores”, designadamente com a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) e com a Autoridade da Concorrência (AdC), “é essencial para promover a segurança jurídica e a confiança junto dos cidadãos e das empresas”.
O segundo desafio, de acordo com a presidente do regulador, é o da “capacidade institucional e técnica”, considerando que a “inovação tecnológica nas áreas da inteligência artificial (IA), da segurança das redes, de gestão de dados, da integridade das plataformas digitais, exige competências especializadas e investimento contínuo em conhecimento”. Sandra Maximiano defende que a “regulação moderna deve ser baseada em evidências” e “sustentada por dados”, estando orientada para os resultados.
O terceiro desafio é o da “proximidade com os cidadãos”. “A confiança do público é o maior ativo de qualquer entidade reguladora”, afirmou a presidente.
A dirigente da Anacom considerou que o quadro legislativo europeu, através de “instrumentos como o Código Europeu das Comunicações Eletrónicas e em breve o Digital Networks Act (DNA), o Digital Service Act (DSA), o Digital Markets Act (DMA), o European Medium Freedom Act (EMFA) e o AI Act” constituem um conjunto normativo de grande alcance, que “redefine as responsabilidades das autoridades nacionais”.
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