Exoneração de embaixador português no Qatar deve-se a “rotação habitual”, diz MNE
A exoneração ocorreu uma semana depois do chefe da missão no país ter dito que os trabalhadores conseguiam trabalhar mais horas sob temperaturas superiores a 40ºC por terem a pele mais escura.
O Ministério dos Negócios Estrangeiros justificou esta quarta-feira a exoneração do embaixador português no Qatar, António Alves de Carvalho, após declarações polémicas do chefe de missão no país, como um “procedimento habitual na carreira diplomática”.
No cargo apenas desde 2020 (depois de ter estado colocado na Guiné-Bissau), António José Alves de Carvalho foi exonerado pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, por proposta do Governo, informação já publicada em Diário da República, disse à Lusa fonte oficial do MNE.
A exoneração do embaixador de Portugal em Doha ocorreu cerca de uma semana depois de o chefe da missão diplomática portuguesa, Manuel Gomes Samuel, ter dito numa peça emitida pela estação televisiva SIC, a 8 de agosto, que denunciava violações dos direitos humanos dos trabalhadores envolvidos na construção dos estádios que acolherão no Qatar o próximo Campeonato Mundial de Futebol Fifa de 2022 (entre 21 de novembro e 18 de dezembro), que estes conseguiam trabalhar mais horas sob temperaturas frequentemente superiores a 40ºC por terem a pele mais escura.
“É natural que uma pessoa que tem mais melanina na pele, portanto, mais habituada a climas em que o sol tem uma incidência mais forte, tenha mais capacidade, obviamente, de persistência a essas temperaturas do que um habitante, por exemplo, do norte da Europa”, disse o chefe da missão diplomática portuguesa em Doha.
Nos 23 minutos de duração da peça da SIC, que denuncia violações dos direitos humanos, trabalho forçado, sobrelotação dos alojamentos para trabalhadores e casos de racismo, o chefe da missão diplomática portuguesa em Doha pronuncia-se três vezes, afirmando, numa delas: “Naturalmente, esses trabalhadores têm mais resiliência, não por uma questão de pele, [mas] porque este país é um autêntico ‘melting pot’”.
Tendo vivido em “12 países”, Manuel Gomes Samuel assegura ainda não ter visto no Qatar “questões de racismo que sejam mais evidentes do que noutros países”. “Eu próprio sou testemunha de que os cataris, os locais, têm um tratamento condigno para com os estrangeiros, porque eles sabem que também dependem dos estrangeiros”, observou.
No dia seguinte à divulgação desta reportagem, o gabinete do ministro dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho, citado pelo semanário Expresso, reagiu às declarações do chefe da missão portuguesa em Doha, distanciando-se das mesmas. “As declarações proferidas, em apreço, não representam a posição oficial deste Ministério”, acrescentando: “O Ministério dos Negócios Estrangeiros condena, da forma mais veemente possível, qualquer forma de discriminação racial, racismo e xenofobia, sendo o seu combate uma prioridade de Portugal, tanto internamente como na ação externa que esta área governativa acompanha”.
“As políticas e medidas nacionais na área da integração e das migrações são reconhecidas como boas práticas a nível internacional”, concluiu. Questionado pelo jornal sobre se o chefe da missão diplomática portuguesa em Doha continuaria em funções, o MNE não emitiu qualquer resposta.
À Lusa, o seu gabinete indicou que “se aguarda a anuência das autoridades do Qatar, em conformidade com a prática diplomática estabelecida, para que se possa proceder à nomeação, nos termos habituais, do próximo embaixador de Portugal em Doha”, reiterando que “esta rotação nada tem que ver com alguns casos relatados pela imprensa recentemente”.
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