Conciliação e corresponsabilidade em Espanha, progressos e desafios no caminho para a igualdade
23 de março é o Dia Nacional da Conciliação da vida pessoal, familiar e profissional e da corresponsabilidade na assunção das responsabilidades familiares.
O grau de progresso em termos de equilíbrio entre a vida profissional e a vida privada determina a maturidade do mercado de trabalho e a igualdade num país. Em Espanha, esta é uma tarefa pendente que, embora tenha havido progressos significativos nos últimos anos, ainda representa um desafio crucial para a igualdade de oportunidades entre homens e mulheres. Este aspeto torna-se mais interessante no âmbito do Dia Nacional do Equilíbrio Trabalho-Vida e da Corresponsabilidade, que é comemorado a cada 23 de março desde 2018.
Em Espanha, mais de 507 000 pessoas trabalham a tempo parcial para cuidar de membros da família ou devido a outras obrigações pessoais, de acordo com os dados do Inquérito às Forças de Trabalho (EPA) para o quarto trimestre de 2024. Destes, 91% são mulheres (mais de 465.000).
O facto de nove em cada dez pessoas que trabalham a tempo parcial em Espanha para conciliar a vida profissional com a vida pessoal serem mulheres revela um fenómeno estrutural na configuração do mercado de trabalho, marcando um longo caminho a percorrer em termos de corresponsabilidade e conciliação. Os peritos e as organizações sindicais concordam que a conciliação entre a vida profissional e a vida privada deve ir além da aplicação de medidas isoladas e envolver uma estratégia e uma cultura de recursos humanos a longo prazo nas organizações.
A ASEMPLEO, a associação patronal das empresas de trabalho temporário (ETT) em Espanha, apela a “uma abordagem responsável desta situação e à implementação de medidas concretas” para promover a igualdade. O presidente da associação, Andreu Cruañas, propõe “criar um cenário em que a conciliação entre a vida profissional e a vida familiar gere oportunidades equivalentes para homens e mulheres, promovendo um quadro regulamentar e uma cultura que garanta, por um lado, que a escolha voluntária de mulheres e homens não penalize o seu desenvolvimento profissional ou as suas opções de reforma. Por outro lado, as políticas salariais não devem enviesar estas escolhas em detrimento das mulheres.
Por seu lado, a Confederação Sindical Independente Fetico está convencida de que a Espanha deve fazer um esforço para progredir em termos de corresponsabilidade e cita os dados do Instituto da Mulher, que mostram que 44,5% das mulheres realizam sozinhas as tarefas domésticas, contra 9,6% dos homens.
Para o secretário-geral da Fetico, Antonio Pérez, “a corresponsabilidade deve ser um tema central no diálogo social e na negociação coletiva. A representação sindical nas empresas é uma arma muito poderosa, que conhece a realidade dos seus trabalhadores, e pode negociar e implementar políticas que ajudem a promover a corresponsabilidade”.
A confederação alerta ainda para o facto de, nos últimos anos, a dificuldade em estabelecer planos de igualdade ter dificultado a possibilidade de avançar e debater o equilíbrio entre a vida profissional e familiar e a sua importância na distribuição de papéis.
Apesar dos desafios subjacentes nesta área, a Espanha tem demonstrado progressos nos seus níveis de equilíbrio entre a vida profissional e pessoal e de corresponsabilidade, como demonstra o facto de estar em décimo lugar no Índice de Equilíbrio Trabalho-Vida 2024, realizado pela Remote e que abrange um total de 40 países. Assim, a Espanha situa-se acima dos Países Baixos, do Reino Unido, da França, de Portugal e da Suécia, entre outros países.
EMPRESAS DE REFERÊNCIA
Algumas empresas, como a IKEA, apostaram no equilíbrio entre a vida profissional e pessoal, onde as pessoas trabalham continuamente e conhecem os seus horários com quatro meses de antecedência, bem como as férias anuais e os fins-de-semana livres.
Além disso, a empresa implementou uma política segundo a qual os funcionários têm dois dias de folga por semana e mais do dobro dos fins-de-semana de folga indicados no acordo coletivo de trabalho. Estas medidas vêm juntar-se à flexibilidade de repartir as férias fora do verão, contribuindo assim para melhorar a capacidade de conciliação entre a vida profissional e a vida familiar.
Os exemplos estendem-se também à área da tecnologia, onde o teletrabalho e a flexibilidade se tornaram uma parte fundamental das empresas deste setor. O caso da T-Systems Iberia destaca-se pela sua política de teletrabalho voluntário, “em que cada colaborador pode trabalhar em regime de teletrabalho até três dias por semana, com a possibilidade de trabalhar mais dias em casos excecionais. A empresa também implementa eficazmente medidas de desconexão digital e tem uma comissão para garantir a correta aplicação destas políticas”, afirma Caroline Morales, Vice-Presidente de Pessoas da T-Systems Iberia.
Na indústria farmacêutica, a BeiGene é uma empresa centrada na investigação do cancro que está consciente “da importância de os seus colaboradores encontrarem um equilíbrio entre a vida profissional e pessoal, especialmente num setor tão exigente como o da saúde e da indústria farmacêutica”.
Desde as suas origens, a empresa tem implementado várias medidas para facilitar o equilíbrio entre a vida profissional e pessoal e promover o seu bem-estar, tais como “horários de trabalho flexíveis, que lhes permitem gerir melhor o seu dia de trabalho e adaptá-lo às suas necessidades pessoais; bem como o teletrabalho a 100%, benefícios de saúde mental e física, apoio à mobilidade interna ou, ainda, licenças pagas mais extensas do que as estabelecidas pelo acordo coletivo”, salientam.
Relativamente a esta última, a BeiGene destaca não só casos como o nascimento e a prestação de cuidados a um filho, a morte de um membro da família ou de um parente próximo, mas também o aborto, os tratamentos de fertilidade falhados ou o cancelamento da adoção, tendo mesmo sido estabelecida uma licença remunerada em caso de morte de um animal de estimação.
INOVAR EM RH
Para avançar no caminho da igualdade, os especialistas concordam que será necessário abordar os recursos humanos de uma forma diferente. “É essencial combinar medidas de prevenção da discriminação com uma gestão inteligente do capital humano através de políticas de compensação e de organização do trabalho, entendidas como um imperativo ético de desenvolvimento social”, explica Andreu Cruañas.
A isto junta-se a posição sindical, que promove negociações ativas e eficazes em que se consegue a aceitação da licença de conciliação, com ênfase no coletivo masculino e que “as próprias empresas promovam a distribuição equitativa de tarefas para atenuar os papéis de género”, salienta Antonio Pérez.
Algumas empresas estão a avançar nesta dinâmica, e “adotámos modelos híbridos e flexíveis, oferecendo horários de trabalho adaptados às necessidades individuais, o que aumentou a satisfação e a fidelização dos talentos. No entanto, é necessário continuar a melhorar a implementação de políticas de trabalho flexíveis, que em muitos casos são comprometidas por enquadramentos legais e regulamentares que devem ser adaptados às novas realidades laborais”, acrescenta Caroline Morales, da T-Systems Iberia.
Ou, como explica a BeiGene, “o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional é um pilar fundamental para o bem-estar e a motivação das nossas equipas. Sabemos que um ambiente de trabalho que respeita e promove o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional não só contribui para a satisfação dos nossos colaboradores, como também tem um impacto positivo na sua produtividade e no seu compromisso com a empresa. Influencia o bem-estar e a motivação, conseguindo um maior empenho e retenção de talentos, uma vez que se sentem valorizados e comprometidos com a empresa, uma redução do stress e uma melhoria da saúde mental, que se reflete na qualidade de vida. Tudo isto resulta num aumento da produtividade”.
Existem também certificações que estão a ajudar as empresas a uniformizar os seus modelos de conciliação, como a Fundação Másfamilia, que distingue os avanços em matéria de corresponsabilidade e conciliação e já reconheceu empresas como a DKV, Orange, Grupo Eulen, Urbaser e Caixabank, entre outras.
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