EDP alerta que defesa e independência energética são indissociáveis
Administrador Pedro Vasconcelos espera que o aumento dos custos previstos pela União Europeia (UE) na área da Defesa não impacte negativamente os investimentos no setor energético.
O administrador da EDP Pedro Vasconcelos alerta para a importância da independência energética na Europa, afirmando que esta questão está hoje “lado a lado” com as prioridades de defesa do continente.
Em entrevista à Lusa, no âmbito do Dia Mundial da Energia, Pedro Vasconcelos reforçou que “Defesa e independência energética não são realidades que se separem“. Nesse sentido, espera que o aumento dos custos previstos pela União Europeia (UE) na área da Defesa não impacte negativamente os investimentos no setor energético.
“A Europa é claramente dependente energeticamente. Dependia em excesso e em exclusividade da Rússia, e a Alemanha aprendeu, em primeira instância, essa lição”, afirmou o administrador, salientando ainda o impacto dos preços do gás. “Pagamos entre cinco a dez vezes mais caro o gás do que pagávamos antes da Covid-19”, apontou o também presidente executivo do negócio da EDP na Península Ibérica.
Segundo o responsável, “cada eletrão novo que produzimos, seja de sol, vento ou água, é um eletrão a menos que temos que queimar gás”, aproveitando para reforçar a necessidade de acelerar a integração das renováveis no sistema europeu.
A independência energética “tem a dupla valência de, primeiro, evitar as dependências americanas, ou russas, no limite, ou do Médio Oriente. E, segundo, traz competitividade à Europa“, explicou, sublinhando que países como Alemanha, Reino Unido, França, Polónia, Itália e a Península Ibérica estão a apostar fortemente nas renováveis para reduzir a dependência do gás.
Questionado sobre os maiores obstáculos ao desenvolvimento energético na Península Ibérica, o administrador da EDP destacou as dificuldades nos processos de licenciamento e aprovações ambientais, que são “extremamente difíceis, morosos e com pouca visibilidade sobre prazos”.
“Conseguir acelerar os licenciamentos e tornar as regras mais claras é fundamental”, defendeu, apontando que a Comissão Europeia prevê mecanismos para acelerar projetos em zonas já impactadas por energias renováveis.
Além disso, apontou a necessidade de investimentos e agilidade nas redes de transmissão e distribuição, para garantir a conexão das novas fontes renováveis. “A digitalização, automação e qualidade da informação são fundamentais para garantir a visibilidade e o funcionamento eficiente do sistema, especialmente com o crescimento do autoconsumo”, acrescentou.
Olhando para a frente, o administrador da EDP prevê que, num horizonte próximo, talvez até em menos de 10 anos, os consumidores serão também produtores e gestores da sua energia, numa rede inteligente e interconectada.
No futuro próximo, “os papéis de consumidores e produtores vão-se confundindo ao longo do tempo”, afirmou, destacando o conceito de “prosumers” — consumidores que também produzem energia.
A Europa é claramente dependente energeticamente. Dependia em excesso e em exclusividade da Rússia, e a Alemanha aprendeu, em primeira instância, essa lição.
Segundo o responsável, carros elétricos poderão passar a injetar energia na rede em momentos de necessidade, “desde que o sistema assim o permita”, o que requer regulação, infraestrutura e digitalização. Esta descentralização, concluiu, “traz resiliência e redundância ao sistema”, tornando-o mais robusto e sustentável.
Instado a comentar quais as áreas que terão de acelerar mais para garantir o avanço da transição energética — produção, distribuição, consumo ou regulação –, o administrador da EDP foi categórico: “Todos”.
Destacou a evolução registada nas últimas décadas, sublinhando a passagem “de 50 produtores em Portugal para cerca de 40 mil”, e salientou melhorias na distribuição e transporte, com “qualidade de serviço que nunca tivemos antes, a um custo cada vez mais reduzido”.
O administrador apontou ainda uma forte procura por novas conexões nas redes elétricas, impulsionada por data centers e indústrias que querem instalar-se na Península Ibérica. “Só em Espanha há 70 gigawatts de consumo novo a querer entrar, enquanto Portugal tem 23 gigawatts de capacidade instalada. Mas ainda não há resposta suficiente, porque se espera por investimentos e decisões dos operadores”, lamentou.
Renováveis já aliviam fatura da luz dos portugueses
As energias renováveis já estão a ter um impacto direto e positivo na fatura da eletricidade dos portugueses, assegura o administrador da EDP Pedro Vasconcelos. “Nos últimos três ou quatro anos, as renováveis já têm demonstrado o seu enorme valor na fatura final dos clientes”, disse na entrevista à agência Lusa.
Segundo o responsável, a presença crescente de energia solar e eólica no sistema elétrico nacional tem sido decisiva para travar a escalada dos preços da eletricidade, num contexto internacional marcado por forte pressão sobre o custo do gás natural.
Antes da pandemia, o preço do gás rondava os 5 a 8 euros por megawatt-hora (MWh). “Depois da pandemia e da guerra na Ucrânia, esses valores dispararam para os 50 euros, e Portugal continua 100% dependente deste combustível”, recordou Vasconcelos. “Se não tivéssemos renováveis, a fatura teria subido muito mais”, alertou o também presidente executivo da EDP Iberia.
Lembrando as feed-in tariffs, mecanismos de política pública usados para incentivar a geração de energia renovável, o responsável acrescentou que além de funcionarem como um “amortecedor” contra a volatilidade dos mercados internacionais, as renováveis trouxeram vantagens económicas diretas para os consumidores.
“Chegámos a ter situações em que a energia foi comprada a 90 euros e vendida a 230 euros. Foi um sobreproveito que estabilizou o sistema e evitou aumentos nas tarifas de acesso à rede”, uma das parcelas da conta da eletricidade, explicou.
Ainda que as renováveis estejam a contribuir para a estabilização dos preços, o gestor defende que a fatura da luz continua pressionada por uma carga fiscal significativa. Pedro Vasconcelos lembra que o IVA da eletricidade continua nos 23%, a que se juntam a taxa do audiovisual, a tarifa social — suportada durante anos pelos produtores —, bem como impostos adicionais aplicados à geração de energia em Espanha, com impacto também no mercado português.
“Esta é uma discussão de política orçamental. O Estado tem um bolo para gerir. Se baixar o IVA ou aliviar taxas na energia, vai ter de compensar noutro lado”, referiu.
No ano passado, o Governo alargou a taxa de IVA reduzida (6%) ao consumo mensal de eletricidade de até 200 kWh (ou até 300 kWh para famílias numerosas) para potências contratadas até 6,9 kVA, mas o escalão normal de 23% mantém-se para o restante consumo.
Segundo o administrador da EDP, esta realidade explica por que motivo, mesmo com preços de mercado cada vez mais baixos durante o dia — incluindo os chamados “preços zero” da energia solar —, os consumidores não sentem esses valores refletidos diretamente na conta mensal. “A fatura elétrica traz muito mais do que a energia propriamente dita”, alertou.
Ainda assim, Pedro Vasconcelos destaca que a competitividade do setor elétrico nacional tem permitido absorver grande parte desta carga fiscal sem penalizar o consumidor. “Segundo o Eurostat, Portugal tem tarifas de eletricidade significativamente mais baixas do que a média europeia — mais baratas do que em Espanha, França ou Alemanha, mesmo com todos estes encargos”, sublinhou.
Para o responsável, é graças à força das renováveis que esse equilíbrio tem sido possível. “Se não fossem elas, estaríamos a pagar muito mais. Hoje, os portugueses já veem esse benefício na sua fatura”, reforçou.
O responsável pelo negócio da Península Ibérica da EDP rejeita ainda culpar as renováveis pelo apagão de 28 de abril. “O problema claramente não é das renováveis, elas estavam a cumprir o seu objetivo. A pergunta é que outras centrais ou mecanismos deveriam estar a funcionar em simultâneo para o sistema estar estável e ter os adequados níveis de redundância para que não falhasse”, acrescentou.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
EDP alerta que defesa e independência energética são indissociáveis
{{ noCommentsLabel }}