Novo Banco. Ideias Velhas. Erros de sempre.
Nacionalizar o Novo Banco é pura e simplesmente transformá-lo numa nova CGD. E queremos mesmo repetir os erros que foram cometidos no banco público?
A operação de venda do Novo Banco (NB) mostra como Portugal não se consegue livrar das ideias velhas e dos erros que sempre comete. Nacionalizar o NB é apenas um regresso ao passado, de ideias ultrapassadas, e cometer os mesmos erros que foram cometidos na CGD entre 95 e 2011.
Dado o que se sabe das ofertas, criou-se uma espécie de unanimidade entre as elites políticas que o NB deveria ser nacionalizado. A argumentação divide-se em vários pontos (de forma sintética): primeiro, ao receber apenas 750 M€, o Estado está a vender o banco ao desbarato. Segundo, um dos potenciais compradores é um private equity que pretende “vender o banco aos bocados” e terceiro, não devemos permitir que parte significativa da banca fique nas mãos de estrangeiros.
Sinceramente, não vejo motivos para uma nacionalização. Naturalmente, tenho para com essa opção uma aversão ideológica. Não creio que seja função do Estado deter bancos (e daí que não me chocasse, noutro contexto, a privatização, mesmo que parcial, da CGD). E num país com um forte “crony capitalism”, o Estado ter bancos apenas incentiva mais práticas pouco transparentes entre público e privado.
Também não creio que os argumentos para a nacionalização sejam corretos.
Primeiro, vale o NB mais que 750 M€, no momento atual? Valendo o banco 15% do mercado bancário, e sendo ligeiramente mais pequeno que o BCP, podemos verificar pela cotação deste, que o NB dificilmente valeria mais em bolsa. Se o comprador investir 1.500 M€ (750 da compra e 750 do aumento de capital), para recuperar o investimento em oito anos (um prazo razoável), terá de ter dividendos de 200 M€/ano.
Mesmo admitindo uma taxa de dividendos de 80% do lucro, estamos a falar de 250 M€/ano de lucro, o que implica, embora possa haver alguma poupança fiscal por via do reporte de prejuízos, um resultado antes de impostos de mais de 300 M€/ano. Convenhamos que para um banco que em dois anos apresentou mais de dois mil M€ de prejuízos, não se afigura fácil.
Quanto à questão do comprador querer vender o banco “aos pedaços”, também creio que não é um argumento forte. Primeiro, qualquer comprador vai continuar a fazer o que a administração de Stock da Cunha e António Ramalho têm vindo a fazer desde agosto de 2014: vender as participações não financeiras (turismo, autoestradas, etc) e continuar a reestruturação (agências, back-office, rescisões), procurando fugir de um modelo de negócio bancário ultrapassado.
Além disso, o futuro comprador, que vem para fazer dinheiro (como qualquer investidor), não deixará, para rentabilizar uma venda futura, de perceber que o ativo principal do banco é o seu mercado de financiamento a PME´s e a sua rede de retalho. O que o comprador estará a adquirir é exatamente a quota de 15% no mercado nacional. Não há ativos tangíveis que ele possa simplesmente levar para fora do país.
Há, no entanto, um perigo, que é o de não sendo nenhum dos comprador um banco (mas fundos), de usarem a liquidez do banco para financiar os seus próprios negócios. Consta que a Fosun está a usar os ativos financeiros da Seguradora que adquiriu para comprar dívida da própria Fosun. Mas essa é uma questão de Supervisão, não de venda.
Relativamente à questão do controlo de parte do mercado bancário por estrangeiros, isso resulta dos erros cometidos entre 1995 e 2011. Um país falido não consegue manter os seus melhores ativos. E achar que os problemas da banca começaram com a “troika” é atirar areia para os olhos. Além de que países como a Bélgica ou a Nova Zelândia têm grande parte do seu setor financeiro nas mãos de estrangeiros.
Nacionalizar o NB, é pura e simplesmente transformá-lo numa nova CGD. Eu percebo a questão ideológica da nossa extrema-esquerda. Mas num país sério e moderno, o Estado não tem 40% do mercado bancário. E queremos mesmo repetir os erros que foram cometidos na CGD? Recorde-se que o banco público, desde 2007, e com a recapitalização deste ano, já custou mais de sete mil M€ aos contribuintes.
Qual então a possível solução? Eu creio que há duas perguntas-chave a fazer, e da qual depende a resposta:
- O NB precisará de mais capital nos próximos 3-4 anos?
- Se o NB precisar de mais capital, qual será a posição da Comissão Europeia e da DGCOM à recapitalização pelo Estado?
Se a resposta for negativa às necessidades de capital, ou seja, o NB não precisará de mais capital ou a precisar, será em valores não muito significativos, então preferiria uma solução tipo “Loyds” ou “ABN Amro”, ou seja, reestruturar para depois vender.
Embora esta solução tenha um risco elevado na negociação com Bruxelas, quer na nacionalização, quer na recapitalização, continuo a achar aquilo que já aqui escrevi há umas semanas: “temos uma União Bancária que ninguém quer usar, porque ninguém vai querer ter o ónus político de fazer pagar os depositantes pela falência de um banco.” E o NB tem um gestor à sua frente altamente capaz de o fazer. Creio que António Ramalho dá-nos essa confiança. Mas para isso era necessário que se apresenta-se um plano sólido e um acordo firmado que no prazo máximo de 4-5 anos o banco seria efetivamente vendido.
Se, pelo contrário, o risco de necessidades de capital avultada existe, então creio que é tempo de deixar o setor privado assumir esse risco. Sim, eu sei que há um pedido de garantia do Estado sobre certos ativos. Mas essa garantia, se for concedida, só pesará no dia em que for acionada. No entanto, concedo que a questão da garantia é bastante séria, e merece ser um dos pontos críticos do processo.
Se se nacionalizar o NB, o Estado terá pelo menos um encargo de dois mil M€ (o valor que terá de oferecer ao fundo de resolução e os 40% do valor restante de dívida do fundo de resolução, que passam a ser contribuições da CGD e do NB). Mas este encargo pode subir para os quatrp mil M€, caso os restantes bancos digam que nestas condições a responsabilidade do empréstimo do fundo de resolução passou a ser do Estado. E a estes valores, somar-se-ia as futuras necessidades de recapitalização. Queremos mesmo gastar mais 5 ou 6 mil M€ num banco?
Se vender, o Estado recuperará (a 10, 20 ou mais anos) os quatro mil M€ que emprestou ao fundo de resolução (embora 25% pagos pela CGD), embora possa ter de se responsabilizar no caso de emitir uma garantia, cujo valor se fala entre dois a três mil M€.
Há diferenças importantes entre o NB e a CGD, no que toca aos dinheiros públicos:
- Primeiro, os quatro mil M€ do Estado no NB são até ao momento um empréstimo, enquanto os sete mil M€ na CGD são capital.
- Segundo, ao contrário do que muita gente acha e diz, no NB não houve apenas até ao momento dinheiros públicos envolvidos. NO NB os privados já perderam muito dinheiro. Os acionistas perderam o valor das suas ações e os titulares de obrigações subordinadas perderam dois mil M€. Na CGD as imparidades e as perdas foram todas suportadas pelos contribuintes.
- Terceiro, no NB a má gestão e os crimes estão a ser investigados, há pessoas em processo de acusação e inclusive presas. Na CGD, viram alguém responder pelos empréstimos desastrosos que geraram milhares de milhões em perdas?
Pois, eu também não…
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
Novo Banco. Ideias Velhas. Erros de sempre.
{{ noCommentsLabel }}