A fixação no “mau Estado” só vai prolongar o nosso atraso
É inevitável transformar o modelo do Estado português. Não haja ilusões, a execução em si vai levar gerações, mas não podemos achar que este Estado é imutável.
As causas do atraso português vão bem para além das fragilidades do Estado
Nuno Palma, Professor da Universidade de Manchester, lançou há meses “As Causas do Atraso Português”, obra que viaja cinco séculos em busca dos factos que mais contribuíram para a fragilidade estrutural de Portugal – na economia como em todas as outras dimensões da Nação. Apesar de excelente, o livro passou despercebido. Julgo que os opinion makers nacionais não conseguiram ultrapassar o choque e negaram calmamente a própria existência do livro. Mas existe, é bom e retemos a conclusão final (pg 287) como plataforma para esta crónica – Nuno Palma isola como causas fundamentais históricas o atraso das instituições e o baixo capital humano e como causas fundamentais contemporâneas os condicionamentos culturais e …. as ajudas europeias. Deixamos a última de lado e com as restantes demonstrar que a atitude de muitos Grupos Empresariais de raiz familiar está distorcida, não servindo o crescimento e fortalecimento das empresas e por conseguinte da economia nacional.
A realidade dos custos de contexto
Não há ninguém que não esteja consciente da fragilidade do Estado, das suas instituições e das suas políticas e que não exprima a sua revolta e indignidade. Nada de novo – há séculos que é assim e hoje reflete-se numa crítica violenta e permanente dos empresários aos chamados custos de contexto das empresas como por exemplo fiscalidade, custos de energia, modelo judicial, muitas políticas públicas ou agências do Estado ineficazes. Para além do legado histórico posto a nu por Nuno Palma, hoje os custos de contexto em resultam da mediocridade do Estado e, para muitos, de uma formatação estruturalmente socialista do País. Essa formatação foi magistralmente refletida na Constituição, que como um encolher de ombros serve sempre in extremis de pretexto de defesa dessa mediocridade.
O foco dos empresários em combater o “mau estado” só nos atrasa ainda mais
Com o crescente impacto desses custos nas empresas, os empresários portugueses ficaram obcecados em combatê-los, basta ler uma entrevista de um empresário para perceber que se tornou a sua maior prioridade, acima da própria gestão do negócio. Não quero acreditar que este combate ao Estado seja um pretexto para fugir às dificuldades intrínsecas da empresa, mas assistimos a um desequilíbrio comportamental que urge resolver para que os empresários estejam completamente dedicados aos seus negócios e não a política. Para isso há que cortar as duas raízes do mal.
Em primeiro lugar, a permeabilidade do Estado. Os políticos e funcionários cedem uma vez numa coisa pequena, os empresários aproveitam e voltam outra vez a pedir mais outra coisa e outra a seguir. Isto decorre exatamente do que diz Nuno Palma – os empresários gastam tanta energia a combater os custos de contexto que perdem foco e capacidade no fortalecimento e no crescimento das suas empresas.
Em segundo lugar, o individualismo de muitos empresários e a debilidade do movimento associativo. Há semanas um conhecido empresário confessava a sua angústia com o estado “lamentável” do ambiente político e económico em Portugal, referindo que as elites são responsáveis, mas “não especialmente assertivas” e que falta coragem nas empresas nacionais. Este exemplo mostra como os empresários gastam demasiada energia a criticar e combater os custos de contexto quando caberia razões ao movimento associativo assumir essa guerra transformando estes guerrilheiros individualistas num grande exército vitorioso.
As Associações Empresariais têm de ter um papel mais interventivo, ativo e eficaz
Em Portugal as Associações Empresariais não têm força nem expressão para serem ouvidas pelo Estado e provocar mudança, mas isso tem de mudar. Mas no futuro cabe-lhes um papel crucial transformando os associados em guerrilheiros e partindo para a guerra para ganhar. Uma associação com o prestígio e a penetração da CIP e a personalidade de Armindo Monteiro pode ser um belo ponto de partida.
Realinhar as prioridades dos Empresários “políticos”
É evidente que os empresários focados no negócio geram muito mais valor para a economia do que os que passam tempo a tratar custos de contexto. Temos convivido com os Acionistas de dezenas de grandes e médias empresas portuguesas e a diferença é notória – alguns gastam uma reunião connosco a queixar-se de custos de contexto, mas a maioria quer é discutir aspetos intrínsecos ao crescimento e valorização do Grupo: estratégia, novos produtos e mercados, governança, organização, IA, … Este é o mundo empresarial certo, onde os líderes estão focados em ações e não em desculpas, embora libertem tempo para combater o mau Estado em ambiente associativo quando é preciso. Aqui investe-se tempo e dinheiro em qualificação, motivação, inovação, exportação, internacionalização. A diferença em relação a outras empresas é a liderança – falar pouco e fazer muito, liderar pelo exemplo e ter a obsessão certa: a valorização e o crescimento do negócio.
Nota final – a pensar no próximo Domingo
É inevitável transformar o modelo do Estado português. Não haja ilusões, a execução em si vai levar gerações, mas não podemos achar que este Estado é imutável nem ficar de braços cruzados a escrever frases fogosas, mas estéreis nas redes sociais, em conferencias e entrevistas pomposas. Há muito que se pode fazer num mandato governativo e Domingo temos a melhor oportunidade para começar. A liderança e o programa certo vai energizar as empresas e o crescimento do País com todos os benefícios sociais associados. Votemos com consciência, reivindiquemos com vigor e as rodas começam a girar. E os empresários vão naturalmente colocar as prioridades e energias na valorização e crescimento dos seus negócios para valorizar e fazer crescer o País.
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