O novo paradigma da IA na era da computação quântica

  • Mário Marques da Silva
  • 7:00

A computação quântica representa um salto paradigmático no processamento com IA. Nesta nova era da IA quântica, será essencial equilibrar inovação com regulamentação.

A computação quântica está prestes a transformar a forma como processamos informações, impulsionando avanços em diversas áreas, como inteligência artificial, ciência dos materiais e criptografia. Nos próximos anos, espera-se que os progressos nesta tecnologia abram caminho para um novo paradigma computacional, com impactos profundos na sociedade e na economia global.

Explorando propriedades da física quântica, como a sobreposição e o entrelaçamento, a implementação prática da computação quântica enfrenta grandes desafios, como a necessidade de operar a temperaturas próximas do zero absoluto (0 Kelvin) e a elevada sensibilidade a erros de bit devido à interação como meio ambiente, conhecidos como problemas de coerência quântica. Para resolver este problema, são utilizados códigos corretores de erros quânticos.

Atualmente, a computação quântica encontra-se numa fase de evolução acelerada, impulsionada tanto por investimentos privados como por avanços académicos e industriais.

Empresas como a IBM disponibilizam plataformas na nuvem, como o IBM Quantum, permitindo o acesso a processadores quânticos para investigação e desenvolvimento, com previsões de alcançar um computador quântico funcional e massivo até 2030.

A Google já demonstrou a chamada “supremacia quântica”, evidenciando que um computador quântico pode resolver, em minutos, problemas que levariam milhares de anos a um supercomputador clássico.

A Microsoft aposta na abordagem dos qubits topológicos: uma tecnologia que, embora ainda experimental, promete maior estabilidade e tolerância a erros. A Intel, por sua vez, foca-se na integração da computação quântica com a tecnologia de semicondutores baseada em silício, tentando criar qubits mais fiáveis e escaláveis.

Paralelamente, a China tem investido fortemente na computação quântica, com empresas como Alibaba, Baidu e Tencent a desenvolverem soluções inovadoras.

A computação quântica tem o potencial de transformar radicalmente a Inteligência Artificial (IA), principalmente no que diz respeito ao treino de modelos e análise de grandes volumes de dados. Os computadores quânticos conseguem processar simultaneamente um vasto número de possibilidades, permitindo reduzir significativamente o tempo necessário para treinar e operar redes neuronais profundas.

Além disso, algoritmos quânticos poderão identificar padrões complexos em grandes volumes de dados com maior eficiência do que os métodos clássicos, melhorando a tomada de decisões dos sistemas de IA, proporcionando ganhos substanciais em áreas como reconhecimento de imagem, previsão de comportamentos e descoberta de novos materiais.

A evolução da IA levanta, no entanto, questões éticas e sociais profundas. Diferentemente das tecnologias anteriores, que apenas armazenavam, processavam ou transmitiam informação, a IA consegue tomar decisões autonomamente e criar narrativas. A ascensão de modelos de IA avançados traz o risco da disseminação de desinformação e da manipulação digital, uma vez que algoritmos são otimizados para maximizar o engajamento, explorando emoções humanas como medo e ódio.

Além disso, a IA pode substituir postos de trabalho em setores tradicionalmente ocupados por humanos, alterando profundamente a estrutura do mercado laboral. Estes efeitos colaterais da IA tenderão a ser intensificados pela computação quântica. Regulamentações rigorosas serão necessárias para garantir que a IA da nova geração seja utilizada de forma ética e responsável, evitando cenários em que algoritmos possam tomar decisões que impactam negativamente a sociedade, influenciando ideologias, economias e sistemas políticos.

Um dos maiores desafios trazidos pela computação quântica é o impacto na segurança digital. Algoritmos clássicos de criptografia, como RSA e ECC, amplamente utilizados de forma impercetível quando acedemos à Internet, dependem da dificuldade de factorização de grandes números ou do problema do logaritmo discreto. No entanto, um computador quântico suficientemente poderoso poderá quebrar estas criptografias em questão de minutos.

Para mitigar este problema, surge a criptografia quântica, que utiliza os mesmos princípios da computação quântica, como a sobreposição e o entrelaçamento. A Distribuição de Chaves Quânticas permitem a criação de chaves criptográficas únicas por sessão, impossíveis de serem intercetadas sem que o remetente e o destinatário detetem. Entre os algoritmos mais utilizados na criptografia quântica, destacam-se o BB84 e o E91. No BB84, o envio de fotões independentes do transmissor para o recetor é considerado, sendo que as bases de medição (regras para ler os fotões) exploram a sobreposição de estados para criar incerteza na medição, garantindo segurança. Já o protocolo E91 baseia-se na sobreposição dos estados entrelaçados até que sejam medidos, garantindo a inviolabilidade das chaves através do fenómeno do entrelaçamento quântico.

Espera-se que a computação quântica seja amplamente utilizada através da “cloud”. No entanto, para aplicações que exigem tempos de resposta extremamente curtos, como na condução autónoma, soluções híbridas poderão combinar computação quântica na “cloud” com processamento clássico local, garantindo decisões em tempo real.

A computação quântica representa um salto paradigmático no processamento com IA. Nesta nova era da IA quântica, será essencial equilibrar inovação com regulamentação, garantindo que o potencial da computação quântica seja explorado de forma segura e ética, maximizando os benefícios para a sociedade.

  • Mário Marques da Silva
  • Diretor do Departamento de Engenharias e Ciências da Computação da Universidade Autónoma de Lisboa

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