Quando o negócio prospera da terceira geração em diante

A primeira geração constrói, a segunda preserva e a terceira destrói: A origem desta antiga máxima é porque está cada vez mais ultrapassada na realidade.

Morte dos Gupos Familiares à terceira geração: qual a origem deste mito?

É um dos provérbios mais conhecidos e repetidos quando se fala do percurso de Grupos Familiares ao longo das três primeiras gerações, onde se constrói e preserva ou não uma fortuna : “Fundador rico, filho nobre e neto pobre

Bom, as estatísticas não mentem. Há pouco anos, a Business Week publicou um estudo onde demonstrava que 40% dos Grupos Familiares atingiam a segunda geração, 13% chegavam à terceira e apenas 3% conseguiam sobreviver e serem passados à quarta geração. Por isso a instituição Family Business Center calcula a esperança média de vida dum negócio de raiz familiar em apenas 24 anos.

Mas, atenção, é importante ter em conta a base destas estatísticas. Não se aplicam apenas aos grandes e médios Grupos Familiares que nos interessam, mas sim às centenas de milhões de negócios gerados e conduzidos por famílias em todos os espetros de dimensão – incluindo a mercearia em Jaipur, o rent-a-car na esquina de Paros, a mini loja de “cá vai tudo”no centro de Guangzhou, tudo o street food joint da medina de Fez ou os triciclos de fritos nas ruas e mercados de Ho Chi Min ou Phnom Penh.

E porque alguns Grupos Empresariais sobrevivem várias gerações e outros não ?

No universo dos grandes e medos Grupo Familiares, há no entanto uma cultura e uma escala que, sem colocar em causa estas estatísticas, evidenciam naturalmente um grau de mortalidade inferior. Embora sem a relevância dos números da Business Week, claro que há várias famílias empresariais que não conseguem, por várias razões, manter e transmitir a riqueza para além da terceira ou quarta geração. Por isso aquelas que o conseguem fazer são um exemplo a seguir e selecionámos um conjunto de Grupos nacionais de sucesso que estão ou vão entrar na terceira geração, procurando retirar os fatores de sucesso comuns que lhes serviram de orientação.

Antes disso, julgo ser útil partilhar uma reflexão publicada na Harvard Business Review em Julho de 2021 sobre a matéria e algumas considerações que dela derivam. Os dados publicados sugerem que os Grupos Familiares duram muito mais tempo do que as empresas não familiares. Na verdade, estes Grupos dominam a maioria das listas das empresas mais duradouras do mundo e estão melhor preparadas para o século XXI porque assentam de forma convicta numa missão de longo prazo refletida na firma como pensam, gerem e investem.

A longevidade dos Grupos Familiares e o que a justifica: A visão da Harvard Business Review

Já temos referido várias vezes que a propriedade familiar aporta uma vantagem competitiva significativa em situações que exigem resiliência em vez de crescimento rápido. A peça da Harvard Business Review refere que Grupos Familiares, com proprietários próximos do negócio, se podem adaptar mais rapidamente às circunstâncias em mudança e equilibrar os imperativos de navegar através da crise atual com as implicações para o longo prazo em mente. Isso significa trabalhar arduamente não só para preservar fundos, mas também para garantir o bem-estar dos funcionários e das suas comunidades. Em muitos estudos, os Grupos Familiares demonstraram ser melhores empregadores e cidadãos da comunidade do que os seus pares não familiares. Essa é uma vantagem competitiva distintiva e que representa o capitalismo no seu melhor.

É verdade que existem muitas versões do mito das três gerações e números dramáticos porque, como acontece com o estudo da Business Week, se põe muita coisa no mesmo saco. O mito das três gerações é tão difundido que se pode tornar uma profecia auto-realizável para os Grupos Familiares que acreditam que as hipóteses de sucesso a longo prazo estão empilhadas contra elas – como se tivessem à vista uma permanente nuvem negra que se aproxima com a terceira geração.

O artigo da Harvard Business Review ilustra este tema reforçando o que temos dito ao longo de muitos artigos nesta coluna, agora com o caso de um grupo americano De facto, foi o que quase aconteceu com uma conhecida família empresarial bem-sucedida quando um membro independente do conselho de administração os aconselhou, para garantir a sobrevivência do Grupo Familiar, a não o entregar à próxima geração.

Os irmãos acionistas preocupavam-se profundamente com o Grupo e com os seus colaboradores e valorizavam muito a ideia de deixar o negócio como um legado para a sua família, em vez de vender o Grupo. Assim, quando estavam prontos para se aposentar, não dormiam a pensar se deveriam vender o negócio ou passar a propriedade para a próxima geração. A recomendação do membro do conselho de administração levou-os a acreditar que tinham de escolher entre fazer a sua empresa durar ou mantê-la na família. Mas eles sentiram, e bem, que esta seria uma falsa escolha, e então decidiram dar uma hipótese à propriedade familiar. Foi uma medida sábia: hoje, os irmãos estão a preparar a transferência da propriedade para a próxima geração e o negócio está a prosperar com a ajuda de administradores não familiares que estão a fazer a transição entre os acionistas já aposentados e a próxima geração, em formação para assumir a liderança.

O provérbio da subida e queda súbitas dos Grupos Familiares é um mito: a riqueza custa a construir, quando existe é preservada a longo prazo e está na raiz da importância de qualquer economia ocidental

Então, há algo no mito das três gerações? É certo que algumas famílias o personificam, mas é raro, muito raro. As famílias ricas normalmente permanecem ricas e as famílias pobres permanecem pobres. Eventualmente há uma regressão à média, escreveu, mas “o processo pode levar 10 a 15 gerações (300 a 450 anos)”. Da mesma forma, quando economistas do Banco da Itália estudaram registos fiscais em Florença em 1427 e 2011, descobriram que os maiores rendimentos de hoje “já estavam no topo da escada socioeconómica seis séculos atrás”.

É verdade que se não houver compromisso e empenho da segunda geração e do próprio Fundador, o provérbio pode materializar-se, mas a maior parte os Grupos Familiares tem a presença de espírito e a sofisticação suficiente para dotar a próxima geração dos instrumentos críticos à boa preservação do legado do Grupo nas suas mãos – o investimento em educação, a passagem de fortes valores familiares e de ética de trabalho, o envolvimento gradual no negócio e o planeamento patrimonial adequado de cada futuro acionista.

Não nos podemos esquecer que a longevidade das empresas familiares é importante não só para os seus proprietários, mas também para a economia. A Harvard Business Review recorda-nos que, de acordo com o U.S. Census Bureau, os Grupos Familiares representam cerca de 90% das empresas americanas. Variando em tamanho de parcerias de duas pessoas a empresas da Fortune 500, essas empresas representam metade do emprego do país e metade do produto nacional bruto dos EUA.

Sete exemplos de Grupos Empresarias familiares portugueses que dão cartas após a terceira geração

Citemos então alguns exemplos de Grupos Familiares portugueses para reforçar esta ideia de que se pode preparar uma família para controlar um grande negócio para além da segunda geração – e que a terceira geração não vem destruir o legado, mas som fortalecê-lo.

ARSOPI

Fundado por Arlindo Soares de Pinho com a visão de estabelecer um gigante metalúrgico altamente especializado e voltado para os grandes clientes industriais internacionais, o Grupo Arsopi tornou-se o centro industrial de emprego, de formação e da comunidade de Vale de Cambra. Foi fortalecido por Armando Soares de Pinho que criou uma guarda de honra de poderosos e competentes diretores séniores e passou a liderança executiva ao seu filho Jorge Leite de Pinho. Jorge continua a afirmar o poder do negócio e está agira comprometido coma delicada tarefa de rejuvenescer a organização preservando os seus atributos distintivos e de liderança. Quando for a altura, a quarta geração receberá um Grupo ainda mais preparado par o futuro e para crescer a longo prazo.

CORTICEIRA AMORIM

O Grupo é dominado por dois blocos – o bloco Família Américo Amorim e o bloco Família António Ferreira Amorim – e está sob gestão da 4ª a geração, onde se destacam os irmãos António (CEO e Cristina Rios Amorim (CFO). O facto do Grupo ter chegado até aqui com uma notável transmissão de liderança de Américo Amorim para António Rios Amorim é digno de louvor, tal como o crescimento e internacionalização imprimido por António de uma dedicação ímpar ao Grupo. Olhando para o futuro, o ponto fraco é o Grupo carecer de um modelo de preparação dos seus futuros acionistas e de sucessão qwier a geração anterior teve mas a juventude dos membros da 4ª geração leva acreditar que conseguirão ultrapassar esse desafio com sucesso sem que seja tarde demais.

PAULA AMORIM

Não podemos falar do sucesso do legado de Américo Amorim, para mim o maior empresário português da sua geração e uma das pessoas que mais me marcou na vida, sem falar na sua filha mais velha Paula. Igualmente 4ª geração do Grupo, a sua paixão por moda leva-a por caminhos inabituais para a Família com imenso sucesso – o melhor exemplo foi teimar junto do Pai na compra de 25% da Tom Ford, depois vendeu 15% à Zegna e acompanhou a oferta da Estée Lauder, vendendo os 10% restantes por 270 M€. A este fantástico negócio juntam-se muitos outros mundo do imobiliário e luxo, com destaque para a Comporta. Mas a maior conquista foi a valorização espetacular da Galp, duplicando de volor em 5 anos para quase 14 bi€, com uma rotação de CEOs que mostrou que estava muito em cima do negócio.

AVELEDA

Fundada em 1870, a Casa Aveleda é um dos mais antigos e prestigiados Grupos Familiares portugueses do setor do vinho e a gestão está na 5ª geração. A passagem da geração anterior acontece há poucos anos e manteve um modelo pouco comum – a liderança por dois co-CEOs, hoje Martim e António. Têm competências complementares e comungam a paixão pelo Grupo e os desafios que a gestão familiar, uma família numerosa, coloca. Apesar da juventude dos dos co-CEOs, os valores, a comunhão emocional e o vários projetos recentes de crescimento do Grupo em desenvolvimento testemunham o reforço do legado que se prepara para um dia ser recebido pela 5ª geração.

CASA ERMELINDA FREITAS

A Casa é uma referência no setor dos vinhos e Leonor Feitas representa a 4ª geração, detendo sozinha a propriedade e a gestão. Uma casa que passou da bisavó até à sua mãe Ermelinda antes de passar para Leonor que a transformou num Grupo com 14 milhões de litros de vendas e uma referência nacional. O grande desafio está na próxima geração – a sua filha trabalha no negócio, mas terá a formação e o perfil para suceder à mãe? Ou deverá haver um gestor profissional que faça a transição?

MOTA-ENGIL

O Grupo Mota-Engil é um dos 50 maiores a nível mundial e não para de crescer em todo o mundo. Se o fundador o trouxe de Angola para Portugal para obras já emblemáticas, foi a inteligência, a energia e a ambição de António Mota com o suporte inquestionável das irmãs que transformaram o Grupo no colosso que é hoje. Está nas mão de Carlos Mota Santos e de Manuel António Mota, membros de 3ª geração que herdaram do Tio, do Pai e dos gestores de transição uma organização preparada para a 4ª geração.

SEMAPA

Mais um caso de um grande Grupo Empresarial Familiar nas mãos da 4ª geração. Fundado pelo avô de Pedro Queiroz Pereira, fundador da Companhia das Águas de Lisboa, e com o Pai a estender-se para a SONAP e o Hotel Ritz. Mas o que é hoje o Grupo é largamente obra de Pedro Queiroz Pereira com as incursões em Cimento e Papel. Anres de falecer já investira muito no preparação das suas três filhas e herdeiras, a 4ª gerção que tem um papel decisivo no Grupo não obstante existirem um Presidente para a o Grupo e CEOS com grande autonomia nas unidades de negócio. Apesar de não terem um papel executivo, a relação emocional e de gestão das três irmãs com o Grupo leva a acreditar que chegada altura a transição para a 5ª geração se pode fazer de forma suave, mas isso implica um trabalho preparatório relevante tal como tenho afirmado várias vezes nestas colunas.

Conclusão

No nosso universo, a morte de Grupos Familiares às mãos da terceira geração é um mito provocado por estatísticas demasiado genéricas – a determinação e resiliência destes Grupos são muito fortes e a perseverança na busca da longevidade traz enormes benefícios

Como já temos dito, os Grupos Familiares apresentam vantagens competitivas importantes em comparação com as empresas públicas de capital aberto, com forte tendência a prosperar quando os tempos se tornam difíceis. A pandemia comprovou-o. Embora poucas empresas tenham sido imunes aos desafios da pandemia, os Grupos Familiares emergiram em melhor forma do que seus concorrentes.

Em dezembro de 2020, foi feito um inquérito junto de empresas familiares em todo o mundo (140 inquiridos dos cinco continentes representando mais de 25 indústrias) e encontrou-se um otimismo de que não só tinham resistido ao pior, mas uma expectativa de que ganhariam terreno nos próximos meses. 68% dos inquiridos acreditavam que teriam operações mais eficientes quando a pandemia acabasse. E mais de metade acreditava que haveria novas oportunidades de negócio, processos de tomada de decisão mais eficientes e oportunidades de aprendizagem para a próxima geração. Mesmo no auge da pandemia, 25% dos entrevistados acreditavam que sua participação de mercado não apenas sobreviveria, mas aumentaria nos próximos anos.

Em conclusão, a propriedade familiar traz uma vantagem competitiva em situações que exigem resiliência em vez de crescimento rápido. Os Grupos Familiares, com proprietários próximos do negócio, podem adaptar-se rapidamente às circunstâncias em mudança e equilibrar os imperativos de navegar através da crise atual com as implicações para o longo prazo em mente. Isso significa trabalhar arduamente não só para preservar os fundos da família, mas também para garantir o bem-estar dos colaboradores e das comunidades. De facto, as empresas familiares têm demonstrado ser melhores empregadores e cidadãos da comunidade do que os seus pares não familiares. Essa é uma vantagem competitiva distintiva e que representa o capitalismo no seu melhor.

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