PAN recorre ao Constitucional no voto dos emigrantes e quer recontagem

Após o PS ter decidido não recorrer para o Constitucional, o PAN avança com essa ação para o círculo eleitoral da Europa, quer reverter a anulação dos votos e proceder à sua recontagem.

O Partido Socialista ameaçou, mas não o fez. Agora é o PAN que avança com um recurso contencioso da decisão de anular 157.205 votos de emigrantes portugueses pelo círculo eleitoral da Europa. Com este recurso enviado ao Tribunal Constitucional, o partido Pessoas, Animais e Natureza pretende declarar inconstitucional a norma que levou à anulação dos votos e proceder à recontagem das urnas. Em causa está a exigência de juntar uma fotocópia do cartão de cidadão ao boletim de voto enviado por carta.

“O PAN – Pessoas – Animais – Natureza deu hoje [sexta-feira] entrada no Tribunal Constitucional de um recurso contencioso da decisão que resultou na declaração de nulidade de 157.205 votos pelo Círculo Eleitoral da Europa, um valor que representa mais de 80% do total de votos por este círculo eleitoral”, anuncia o partido em comunicado divulgado esta sexta-feira.

O objetivo do PAN é que “seja declarado nulo o resultado eleitoral apurado para se proceder à recontagem dos votos“. O partido considera que é inconstitucional que se peça a junção de fotocópia do cartão de cidadão (CC) ou bilhete de identidade (BI) ao boletim de voto e propõe que essa norma seja declarada inconstitucional por parte do Tribunal Constitucional.

O TC tem agora 24 horas para notificar os restantes partidos e estes têm também 24 horas para apresentar as suas contra-alegações. Os juízes do Palácio Ratton têm depois 48 horas para tomar uma decisão final e só depois, consoante o veredicto (e os procedimentos necessários que daí decorram), os resultados eleitorais poderão ser publicados em Diário da República. A tomada de posse da próxima composição da Assembleia da República está dependente deste ato formal: “A Assembleia da República reúne por direito próprio no terceiro dia posterior ao apuramento dos resultados gerais das eleições“, define a Constituição.

O PS tinha ameaçado fazer o mesmo, mas acabou por recuar de forma a que o processo eleitoral “fique encerrado o mais rapidamente possível, para dar lugar à nova legislatura”. “O Partido Socialista não contribuirá mais para o prolongamento deste grave e inútil incidente provocado pelo PSD“, acusavam os socialistas num comunicado divulgado esta quinta-feira.

O PSD inicialmente tinha acordado em aceitar todos os votos, mas acabou por voltar à posição que tinha em 2019 e fez uma reclamação, a qual foi aceite na mesa de apuramento do círculo eleitoral da Europa. Já a mesa de apuramento do círculo eleitoral de Fora da Europa não aceitou a reclamação e validou todos os votos, com ou sem identificação, argumentando que os envelopes contêm um código mecanográfico de barras que identifica o eleitor.

A situação já tinha acontecido em 2019, mas num grau menor (34 mil votos anulados) — desta vez, em 2022, a situação ganhou maior dimensão porque, como já tinham sido colocados votos recebidos com e sem identificação nas urnas, todos foram anulados uma vez que não era possível distingui-los, segundo a Comissão Nacional de Eleições. Certo é que desde 2019 que o problema continuou na lei eleitoral e os partidos não o resolveram nestes dois anos. Os socialistas prometem agora apresentar alterações legislativas para “facilitar os processos de exercício do direito de voto dos cidadãos portugueses residentes no estrangeiro”.

PAN considera que atual norma constitui um “risco de quebra do sigilo do voto”

No recurso que enviou ao Tribunal Constitucional, PAN deixa claro porque considera que esta norma é inconstitucional, argumentando com o “risco de quebra do sigilo do voto”.

“A obrigatoriedade de junção de fotocópia do CC ou BI, além de expor dados pessoais dos eleitores, pondo em causa a sua segurança e a segurança dos seus dados, comporta seriamente o risco de quebra do sigilo do voto”, considera o partido liderado por Inês Sousa Real, assinalando que essa obrigação”restringe de forma desnecessária e desproporcionada o direito fundamental dos cidadãos ao sufrágio, o próprio segredo do sufrágio, o direito à segurança e à preservação de dados pessoais”.

“A norma afigura-se ainda inconstitucional por violação do princípio da igualdade na medida em que institui para os cidadãos nacionais residentes no estrangeiro um procedimento mais difícil, oneroso, arriscado e prejudicial, sem que esse tratamento diferenciado obedeça a um racional de necessidade, equilíbrio, adequação e proporcionalidade e à custa da compressão injustificada e inconstitucional de direitos fundamentais”, argumenta ainda o PAN.

Livre e Volt Portugal recorrem para o TC da anulação de votos dos emigrantes

O Livre e o Volt Portugal recorreram hoje junto do Tribunal Constitucional da decisão de anulação de mais de 157 mil votos de emigrantes nas eleições legislativas antecipadas, na sequência de protestos apresentados pelo PSD.

Numa nota enviada à agência Lusa, o Livre justifica que “contra as falhas de um sistema eleitoral que volta a silenciar a comunidade emigrante portuguesa, o Livre decidiu avançar com a impugnação junto do Tribunal Constitucional das decisões que anularam dezenas de milhares de votos de portugueses residentes no estrangeiro”.

“Esta situação constitui um profundo desrespeito pela comunidade emigrante, que respondeu ao seu dever cívico de voto apenas para ver a sua voz silenciada no processo”, vinca o partido, defendendo a “necessidade imperativa de melhorar o acesso ao voto para as comunidades emigrantes portuguesas”.

O Livre refere que “aos problemas com o voto por correspondência, já antes denunciados e repetidos em 2022, como o extravio de boletins de voto, adicionam-se os erros processuais nas mesas de voto que invalidam os votos emigrantes recebidos”.

O partido sustenta que “a questão essencial prende-se com a necessidade de cada boletim de voto ser acompanhado de uma fotocópia do Cartão de Cidadão de cada eleitor, requisito aplicável em 2019 que não foi alterado para 2022”.

O Livre lembra que já em 2019 este requisito levou à anulação de votos nos círculos da emigração, “mas não em todas as mesas de voto, o que coloca em causa a igualdade de tratamento de cada voto”.

“Por entender que a sua ação em nada alteraria o resultado final das eleições, o Tribunal Constitucional não agiu sobre esta situação em 2019”, escrevem.

Este ano, o PSD apresentou protestos após a maioria das mesas ter validado votos que não vinham acompanhados de cópia do cartão de cidadão (CC) do eleitor, como exige a lei, mas o Livre argumenta que, “como é público”, os sociais-democratas concordaram “em não o fazer numa reunião que teve lugar no dia 18 de janeiro de 2022 na Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna”.

“Efetivamente, o entendimento de que a junção de cópia do Cartão de Cidadão é apenas um “reforço” das garantias de pessoalidade do voto, constava já de decisões anteriores da Comissão Nacional de Eleições e foi o mesmo entendimento transmitido aos membros das mesas eleitorais, constando do respetivo manual. Por outro lado, a própria Lei Eleitoral da Assembleia da República também não identifica a omissão do envio da cópia do Cartão de Cidadão como uma causa para a nulidade dos votos”, sustenta o partido.

Já o Volt Portugal (VP), também em comunicado, defende que “um país que contém 20% dos seus cidadãos a residir fora do território nacional, deve esforçar-se por proteger os direitos desta população, bem como assegurar a sua participação nos processos democráticos”.

“O Volt Portugal, perante aquela que foi uma afronta à democracia e aos direitos civis dos cidadãos portugueses residentes no estrangeiro, apresentou recurso junto do Tribunal Constitucional para impugnar a decisão tomada pela Mesa da Assembleia de Apuramento Geral do Círculo Eleitoral da Europa”, lê-se na nota. O recurso do partido, aditam, foi apresentado “dentro dos prazos legais, ainda durante o dia de ontem, 10 de Fevereiro”.

“A reclamação feita pelo PSD alegava que os votos deveriam ser anulados por não serem acompanhados de cópia de documento de identificação dos cidadãos respetivos. O Volt apresentou o seu contra-argumento, apontando para a decisão da Comissão Nacional de Eleições de 2019, em que consta que a cópia de tal documento é apenas um reforço da identificação necessária”, argumentam. O partido remete ainda para a reunião do dia 18 de janeiro, também referida pelo Livre.

MNE lamenta “desconsideração objetiva” dos votos dos emigrantes

O ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, criticou hoje a anulação de 80% dos votos do círculo da Europa nas legislativas, considerando que houve “uma desconsideração objetiva” de milhares de portugueses que vivem no estrangeiro.

Do ponto de vista do Ministério dos Negócios Estrangeiros passou-se uma coisa muito positiva que foi mais 100 mil portugueses votaram desta vez em relação a 2019. Como ministro dos Negócios Estrangeiros, não entrando nas questões de ordem partidária, tenho a lamentar que a mesa de apuramento da Europa tenha decidido anular 80% desses votos“, disse Augusto Santos Silva, ministro dos Negócios Estrangeiros, em declarações à Agência Lusa em Paris.

O ministro português está em França desde quinta-feira para participar em diversas reuniões da presidência francesa do Conselho da União Europeia, tendo aliado na sua agenda visitas a diversos consulados. Esta sexta-feira, após uma reunião no Consulado-geral de Portugal em Paris, o governante, também cabeça de lista do PS pelo círculo eleitoral fora da Europa, lamentou a invalidação dos votos dos portugueses no estrangeiro após recurso do PSD junto das mesas de contagem.

“Sei que isso não teve consequências do ponto de vista da representação parlamentar, visto que qualquer que fosse o método de cálculo, daria um deputado para o PS, um deputado para o PSD na Europa e fora da Europa, não há nenhuma consequência que distorça a escolha dos portugueses. Agora há, evidentemente, uma desconsideração objetiva de milhares e milhares de portugueses residentes na Europa que viram invalidado o seu voto“, declarou.

Para Augusto Santos Silva, o método de apuramento já tinha sido previamente acordado entre os partidos, mas houve uma “mudança de ideias” por parte do PSD. “Não houve falta de informação, mas é público e notório que houve um partido político que aceitou um método de apuramento que permitir contar todos os votos e, depois, mudou aparentemente de ideias e apresentou uns protestos, que uma mesa de apuramento eleitoral na Europa considerou válidos e invalidou votos. E uma mesa fora da Europa, não”, explicou.

O governante afirmou ainda que a lei eleitoral para os portugueses que vivem fora do território nacional deve mudar. “A lei eleitoral é uma competência exclusiva da Assembleia da República e já, pelo menos do meu conhecimento, um grupo parlamentar anunciou que vai proceder a esta mudança, porque isto não pode ser. Estamos todos a fazer um enorme esforço para aumentar a participação cívica e eleitoral dos portugueses nos assuntos de Portugal“, indicou.

O ministro Negócios Estrangeiros defendeu ainda que a discussão sobre os métodos de voto “é legítima”, incluindo o voto eletrónico, mas que existem já dois métodos de voto válido, presencial e por correspondência.

(Notícia atualizada às 13h08 com mais informação)

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