Exclusivo Fundos de pensões perdem 3 mil milhões de euros em 2022

O montante sob gestão dos fundos de pensões caiu 12,5% este ano, é a maior queda anual desde setembro de 2012. Mas as fortes correções dos mercados financeiros não justificam tudo.

Desde o início do ano que as carteiras dos fundos de pensões não param de minguar. Desde janeiro já perderam mais de 3 mil milhões de euros. De acordo com dados da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF), os 240 fundos de pensões ativos em Portugal contabilizavam 21,1 mil milhões de ativos sob gestão no final de setembro, menos 12,5% em relação ao final de 2021.

Há três trimestres consecutivos que o volume de ativos sob gestão está em queda. É preciso recuar a 2018 para se assistir a uma contração trimestral da carteira dos fundos de pensões privados. No entanto, a correção registada este ano ainda está longe da queda de 25% registada entre setembro de 2011 e setembro de 2012.

Carteira dos fundos de pensões está em queda

Fonte: Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões.

As fortes correções nos mercados financeiros ao longo do ano não têm dado tréguas aos fundos de pensões que, segundo a ASF, acumulam perdas de 11,9% desde o dezembro. É o pior desempenho em pelo menos oito anos.

O fundo do Banco BPI, por exemplo, que é o quinto maior fundo de pensões do mercado, registou uma queda de 12% nos ativos sob gestão até setembro, como resultado de um desempenho de -9,7% do fundo nos primeiros nove meses do ano. Mas não deverá ser o pior.

Entre os cinco maiores fundos de pensões, que agregam cerca de 55% do mercado, o fundo de pensões fechado do Novo Banco acumulava uma queda de 19% do volume dos ativos sob gestão e registava um desempenho de -17,5% até junho.

No entanto, ao contrário do BPI, o banco agora liderado por Mark Bourke só apresenta dados referentes ao seu fundo de pensões numa base semestral, tal como sucede com o Millennium bcp e a Caixa, que detêm os dois maiores fundos de pensões no mercado, e que até junho apresentavam uma queda do volume de ativos sob gestão de 6,1% e 5,9%, respetivamente.

Considerando que entre junho e setembro os mercados financeiros agravaram ainda mais as perdas do ano (setembro foi inclusive o segundo pior mês do ano), é expectável que à imagem do que sucedeu com o fundo do BPI, todos os fundos de pensões estivessem no final de setembro numa situação pior do que se encontravam em junho.

Fundos de pensões contam com menos contribuições

Mas não é só pelo mau desempenho do mercado que os fundos de pensões estão a ser penalizados. A ASF adianta que as “contribuições para os fundos de pensões registaram uma diminuição de 41,8% e os benefícios pagos apresentou um crescimento de 5,1%”.

Em agosto, em declarações ao ECO, Nelson Machado, administrador do grupo Ageas Portugal e especialista em Vida e Pensões, revelava que “a descida das contribuições tem muito a ver com a subida das taxas de juro que fazem com que as responsabilidades sejam mais baixas, muitas vezes criando folgas significativas e daí as contribuições poderem descer muito”.

No caso da Ageas Pensões, que é responsável por quase 6 mil milhões de euros através da gestão de 26 fundos de pensões fechados como o fundo do grupo BCP, da EDP e da Navigator, o montante de contribuições nos primeiros nove meses foi de cerca de 121 milhões de euros, menos 38% face a igual período no ano passado.

Sem também conseguir fugir a um “emagrecimento” forçado tem estado o fundo de pensões do Banco de Portugal. Entre dezembro do ano passado e setembro deste ano, o fundo de pensões do banco liderado por Mário Centeno acumula uma correção de 21% do volume dos ativos sob gestão, passando de 2,23 mil milhões para 1,76 mil milhões de euros. E grande parte deste desempenho deve-se ao corte drástico das contribuições para o fundo.

De acordo com dados da ASF, nos primeiros noves meses do ano, o fundo de pensões do Banco de Portugal acumulou cerca de 11,8 milhões de euros em contribuições, menos 66% face ao período homólogo de 2021. É o valor mais baixo registado nos primeiros nove meses do ano desde 2015.

“Durante o ano de 2022, a subida expressiva das taxas de juro originou (i) uma redução igualmente expressiva do valor das responsabilidades por serviços passados do Fundo e, (ii) em menor magnitude, do valor dos ativos sob gestão, tendo (iii) contribuído para uma melhoria assinalável da situação financeira do Fundo”, refere o Banco de Portugal ao ECO.

Sem avançar dados relativos ao desempenho do fundo este ano, o regulador justifica a parte queda das contribuições por o seu fundo estar “fechado a novos participantes pelo que há uma tendência para uma redução do valor dos ativos sob gestão.”

Fundos de pensões privados são mais avessos ao risco que o Estado

A ASF, num relatório divulgado na quarta-feira com os dados trimestrais do mercado, revela que a composição das carteiras dos fundos de pensões em setembro era semelhante à observada no final do ano passada. “Destacam-se, no entanto, a diminuição do peso de obrigações privadas e o aumento à exposição de divida pública”, esclarece a ASF.

De acordo com o documento, em setembro, as carteiras dos fundos de pensões eram constituídas maioritariamente por títulos de dívida (48%) e fundos de investimento (37%). Só depois surgem os ativos imobiliários (9%), os depósitos bancários (4%) e, em último, as ações (4%).

Comparando a estrutura da carteira dos fundos de pensões privados e o fundo de reserva da Segurança Social (o último reduto à disposição do Estado para pagar pensões, subsídios de saúde e subsídios de desemprego) verifica-se que os privados são bem mais avessos ao risco que o Estado.

No final do ano passado, cerca de dois terços da carteira do Fundo de Estabilização da Segurança Social (FEFSS) estava alocada em títulos de dívida soberana, sendo que 51% deste bolo era constituído por títulos de dívida de Portugal. Porém, a exposição a ações ascendia a 22% do capital. E esta exposição ao mercado acionista tem feito toda a diferença.

Entre 2017 e 2021, a parcela do portefólio do FEFSS exposta a obrigações do Tesouro e a outros títulos de dívida nacional foi 3 vezes superior à exposição da carteira acionista, mas enquanto os títulos de dívida pública da República geraram ganhos médios anuais de 3,3%, as ações valorizaram 12,8% por ano.

Ao contrário do FEFSS, os fundos de pensões privados têm ganho muito pouco com o mercado acionista. A reduzida exposição que as suas carteiras apresentam a ações não o permite.

E isso tem-se repercutido numa rendibilidade abaixo daquela que tem sido oferecida pelo FEFSS: enquanto os fundos de pensões fechados (que são a maioria do mercado) registaram uma rendibilidade média anual de 2,54% entre 2015 e 2021, o FEFSS ganhou 3,88% por ano, 1,5 vezes mais que os fundos de pensões privados. Esta diferença de 1,34 pontos percentuais pode parecer pouca, mas num investimento de 100 mil euros a 10 anos traduz-se em quase 18 mil euros.

Fonte: ECO, Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões e Instituto de Gestão de Fundos de Capitalização da Segurança Social. FEFSS: Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social. Os dados de 2022 dos fundos de pensões fechados são referentes aos primeiros nove meses do ano; e os do FEFSS ainda não são conhecidos.

(Texto atualizado às 12h06 com as declarações do Banco de Portugal)

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