BRANDS' ECO O novo sistema de patentes europeu – como ficam as empresas?

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  • 11 Abril 2023

Especialistas presentes no evento “O novo sistema de patentes europeu – riscos e ameaças para as empresas portuguesas”, que decorreu hoje, na Abreu Advogados, expuseram os desafios deste novo sistema.

Portugal assinou, em 2015, juntamente 25 Estados-Membros, o acordo respeitante ao Tribunal Unificado de Patentes. No entanto, Espanha, Polónia, Hungria e Croácia, além do Reino Unido, devido ao “Brexit”, já anunciaram que não irão aderir ao sistema, em defesa dos interesses económicos das suas empresas. Então, a questão que se coloca é: que impacto terá este novo sistema nos interesses económicos das empresas portuguesas? Deveria Portugal tomar a mesma atitude que o seu país vizinho e outros?

De acordo com várias associações do setor, este novo sistema de patentes pode representar uma enorme perda de valor para o mercado nacional e para as empresas nacionais, principalmente as PME. As preocupações foram partilhadas, esta manhã, por responsáveis da Abreu Advogados, da ACPI, da AIPPI e da Centromarca, que marcaram presença no evento “O novo sistema de patentes europeu – riscos e ameaças para as empresas portuguesas”, com um debate moderado por Diogo Agostinho, diretor geral adjunto do ECO.

Na conversa, que abordou o papel do Tribunal Unitário de Patentes e o papel de Portugal no mundo das patentes, João Pereira da Cruz, presidente da ACPI, começou logo por expôr aquela que considera ser a razão pela qual ainda não foi possível ter uma patente que abrangesse todos os Estados-Membros: a língua. “A patente tem uma função social, que é de informar acerca das novas invenções. Ora, se a patente não tiver a língua do país, muito dificilmente pode cumprir essa função”.

“Dos aproximadamente 190 mil pedidos de patente europeia que houve em 2022, nós tivemos 312. Portanto, nós temos uma percentagem mínima, de 0,15% ou 0,16% do total de pedidos de patente. Nós não devíamos estar dentro do sistema, nós devíamos tirar aquilo que o sistema tem de bom e não irmos receber os milhares de patentes que vão entrar por aí fora e que vão fechar o estado da técnica aos nossos empresários”, continuou o presidente da ACPI.

Perante estes números, Gonçalo de Sampaio, presidente do Grupo Português da AIPPI, alertou para a “publicidade estatística” que tem vindo a ser feita fruto dos pedidos de patentes, mas que não leva em conta a sua aprovação: “Na semana passada tínhamos 7,6% a mais de patentes. Fomos dos países que mais subimos. Temos é que perceber que isso permitiu subir, perante a realidade total, de 0,15% para 0,16%. São cerca de 312 patentes que foram colhidas no ano passado, sendo que, curiosamente, essa publicidade estatística não olhava para o dado mais importante, que é quantos desses pedidos são concedidos. E, nas concessões, nós tivemos, no ano passado, 67. Portanto, tivemos uma quebra de quase 50% para o ano anterior”.

“É certo que os dados apontam que o número de patentes registadas em Portugal cresceu nos últimos dois anos, relativamente à média europeia, mas estamos ainda num patamar muito baixo“, completou Luís Marques Mendes, consultor da Abreu Advogados.

Mas como funciona o novo sistema de patentes europeu?

Atualmente, uma entidade que queira proteger a patente na Europa tem duas vias – ou vai país a país, ou então vai para o espaço europeu, que é mais do que a União Europeia, são 37 estados, pode pedir uma patente europeia que é estudada centralmente no Instituto Europeu de Patente, sediado na Alemanha. Essa patente é estudada e, se for concedida, é dado um prazo para que o titular escolha onde a quer validar, proteger e onde pretende ter um exclusivo, e, dos 37 estados, ele escolhe. Pode ir só a um e pode ir aos 37″, explicou o presidente da AIPPI.

Depois disso, cada país estipula as regras para que essa patente fique validada nesse estado: “Há países que só exigem um simples requerimento de um pagamento de uma taxa, há outros países, como Portugal, Espanha, Itália, Grécia e outros que, além desse requerimento e da taxa, exigem uma tradução para a língua nacional. Ora, este sistema cria aqui uma grande alteração, isto porque, quando a patente é concedida, fica automaticamente validada em todos os estados”.

No ano passado foram concedidas 81754 patentes a nível europeu. Destas, apenas 3792 foram protegidas em Portugal, o que demonstra que o estado da técnica português só foi monopolizado em cerca de 4,8%. “Isto é interessante para as nossas empresas porque significa que os custos económicos para as empresas obterem licenciamentos dessas invenções são baixos. Por exemplo, uma empresa chinesa que peça quatro mil patentes por ano, vai ter uma poupança interessante se proteger as patentes na Europa, isto porque, em vez de andar a pagar país a país, fica com o direito concedido e é fácil. O problema é que o sistema está desequilibrado e não é interessante para quem não o usa tanto“.

Por sua vez, Pedro Pimentel, diretor-geral da Centromarca, não hesitou em dizer que “para um país como Portugal, o futuro terá que passar forçosamente pela aquisição de valor”: “No caso da Centromarca e das empresas com quem trabalhamos, logicamente que esse sistema europeu tem vantagens, uma vez que permite fazer com que uma determinada inovação realizada num país tenha este espalhamento em termos de espaço europeu e não careça de proteção país a país. Temos que ver o registo como um investimento. Hoje em dia, o valor das empresas cada vez mais é medido pelo seu património imaterial e não pelo material. E as marcas e as patentes fazem parte deste património”.

Perante esta opinião, Gonçalo de Sampaio explicou: “Nós podemos olhar para esta questão das patentes como um copo meio cheio ou meio vazio, mas ambas as perspetivas permitem-nos entender que o copo precisa de mais água. Portanto, nós precisamos de mais patentes em Portugal. E como vamos ter isso? Não é apostando num sistema que dificulta a entrada no sistema. Este é um sistema que é interessante para quem já lá está, para quem tem muitas patentes, mas o problema para as PME é que este sistema vai proteger quem lá está e dificultar o acesso a quem quer entrar no sistema, que é a nossa posição. E isto vai tornar estes dois pólos ainda mais antagónicos. Isto, para um país como Portugal, não tem interesse”.

Espanha VS Portugal

Gostava que alguém me conseguisse explicar qual é a vantagem de Portugal e Espanha terem posições divergentes. Hoje, as economias dos dois países estão interligadas, há uma espécie de economia ibérica e, numa matéria importante como esta, que faz parte de um novo modelo de desenvolvimento, Portugal ter uma posição oposta da Espanha, pergunta-se: é bom para Portugal ou é bom para Espanha?“, começou por questionar Luís Marques Mendes.

Já Gonçalo de Sampaio afirmou que Espanha conseguiu aproveitar o “melhor dos dois mundos” e que isso pode trazer perda de competitividade para Portugal: “O sistema é aberto, qualquer empresa pode usar o sistema, esteja no país ou não, e Espanha pensou que para as suas empresas, naquele momento, interessa usar o sistema para quem quer usar o sistema, mas não prejudicar as empresas que ainda não conseguem. Portanto, tem o melhor dos dois mundos e está aqui ao lado. E isto vai trazer uma perda de competitividade da economia portuguesa face à espanhola, que vai sentir-se nas mais pequenas coisas porque as coisas vão ficar mais caras em Portugal”.

Ainda neste tema, o consultor da Abreu Advogados alertou, ainda, para o facto de que, caso este modelo seja bom para Espanha e mau para Portugal, isso significa que irá “discriminar negativamente Portugal e as empresas portuguesas”. E, também neste ponto, sugeriu a elaboração de um estudo. “Eu acho que era de elementar bom senso que tivesse sido feito ou que seja feito ainda um estudo quanto ao impacto desta decisão. Não terá sido feito na altura em que Portugal ratificou, mas ainda vale a pena ser feito agora”, disse.

“O importante é que as pessoas entendam que marcas e patentes são importantes, tudo isto tem a ver com inovação, com investigação e com desenvolvimento. É neste caminho que Portugal tem de estar. Este é o caminho do futuro. E, como agora vai haver uma mudança qualitativa grande, que é a entrada em vigor deste acordo de patente unitária, eu julgo que, ao nível do Parlamento, temos de debater a matéria e sensibilizar as entidades públicas para que, finalmente, façam um estudo sobre o impacto desta decisão“, concluiu Luís Marques Mendes.

Veja aqui o debate completo:

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