BRANDS' ECO Tecnologia aplicada à saúde: prevenir antes de remediar
A conferência Saúde 5G, realizada em maio, abordou a utilização do 5G na medicina. A deteção precoce de doenças através da tecnologia e o consequente prolongamento de vida foram o mote da discussão.
Prolongar a vida com qualidade e prevenir as doenças através da identificação precoce de evidências poderá ser o denominador comum das “demo” de tecnologias aplicadas à saúde, parceiras da NOS, que o ECO foi conhecer à margem da conferência Saúde 5G, realizada em maio, no Palácio de Xabregas.
Os projetos tecnológicos, em diferentes fases de maturidade, recorrem à inteligência artificial ou a tratamentos à distância (telessaúde) e recurso às comunicações 5G, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida das pessoas, de forma a evitar o pior ou a minimizar as consequências do incidente ou dos procedimentos clínicos.
Uma das soluções apresentadas na conferência foi a Hope Care, que é uma tecnologia de telessaúde e monitorização à distância de doentes. Já o Instituto Pedro Nunes (IPN) apresentou a solução ROSE, destinada à realização de ecografias à distância, em fase de validação e certificação em ambiente hospitalar, enquanto a VR4ICU apresentou uma solução de realidade virtual destinado a doentes internados em cuidados intensivos, atualmente em fase de testes clínicos.
Hope Care: maior qualidade de vida para doentes crónicos
A solução Hope Care permite monitorizar os dados de saúde de pessoas com doenças crónicas, para que possam viver autonomamente em casa e para que possam, através de métodos simples de comunicação, ter acesso aos cuidados de saúde. É possível, por exemplo, monitorizar doentes com Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (DPOC), com insuficiência cardíaca, entre outras patologias.
Utilizando estas tecnologias, o utente ganha qualidade de vida em casa e a taxa de sobrevida é superior, como explicou José Paulo Carvalho, CEO da Hope Care.
A empresa de equipamentos médicos Hope Care nasceu de um processo pessoal. “A minha mãe estava doente no Porto e eu já trabalhava em Lisboa. Ela estava sozinha e tivemos de montar um sistema para a acompanhar. Este foi o primeiro conceito”, disse João Paulo Carvalho. “No final desde projeto, montei a empresa como resultado do final do meu executive MBA, na AESE, que resultou no financiamento que permitiu, em 2012, arrancar com o projeto”. A empresa foi criada há 11 anos.
Hoje os sistemas da empresa estão implementados em Portugal – em cerca de 16 hospitais, incluindo o Hospital de São João, Cova da Beira, Amadora-Sintra, USLA –, na Áustria, na Suíça com projetos no terreno. “A nível internacional acompanhámos doentes COVID na cidade de Viena e, atualmente, estamos a começar a integrar doentes crónicos de outra natureza”.
A aplicação está integrada com mais de 30 dispositivos, mas vai agora democratizar-se com a introdução do Bluetooth 5.2 – um padrão que eliminará a necessidade de integração –, passando a ser possível aos equipamentos médicos dialogar automaticamente com as soluções Hope Care.
O objetivo é que os doentes consigam gerir a sua saúde de forma autónoma, utilizando sistematicamente sistemas de monitorização (tensão arterial, glicémia…), enquanto os algoritmos analisam toda essa informação e alertam o sistema nacional de saúde.
Entre os parceiros da Hope Care está a NOS e a sua rede 5G, com quem a empresa está a trabalhar para garantir a conectividade dos equipamentos, em todo o momento.
As principais tecnologias envolvidas estão relacionadas com o algoritmo. O desafio inicial foi a conectividade, o que já está atualmente ultrapassado. “Hoje o desafio é o volume de informação que chega, pelo que criámos algoritmos de triagem que consegue valorizar cada dado, permitindo traçar o perfil do doente e alertar em caso de risco e necessidade de cuidados. O futuro passará por sistemas preditivos para antecipar situações de risco”.
Falando de números “reduzimos 50% os internamentos hospitalares, reduzimos 85% os casos de internamento em caso de insuficiência cardíaca. Pode significar uma redução do custo anual por doente de entre 50% a 60% para o sistema nacional de saúde.
O responsável deixa, no entanto, o alerta: “para isso é preciso que o sistema público esteja interessado em sistemas preventivos, em lugar de casos agudos”.
VR4ICU: Acelerar a recuperação dos doentes em Cuidados Intensivos
A solução realidade virtual para cuidados intensivos – VR4ICU é uma iniciativa de um grupo académico, composto por clínicos e engenheiros, dedicado à promoção da inovação na área da saúde, que visa melhorar os resultados globais dos pacientes em cuidados intensivos.
“Cerca de 50 a 75% dos sobreviventes que passam pelos cuidados incentivos acabam por sofrer do síndrome pós-cuidados intensivos” explica João Coimbra, médico no Centro Hospitalar Universitário de São João, onde a solução está a ser testada. Este síndrome compreende um conjunto de disfunções cognitivas e físicas que impede as pessoas voltar a uma vida de qualidade normal “seja trabalhar, seja fazer atividades do dia-a-dia como levantar dinheiro ou telefonar a alguém”, além de limitar a mobilidade, que é afetada pelo período passado em UCI, tendo em conta que as pessoas acabam por ficar em coma induzido e deitados durante bastante tempo.
A solução de realidade virtual imersiva, a primeira em realidade virtual para cuidados intensivos, resulta da adaptação em ambiente de jogo de terapias habitualmente utilizadas em testes e exercícios de fisioterapia, tornando a reabilitação mais interativa e disponível, explicou João Coimbra. Contribui ainda para colmatar a falta de fisioterapeutas.
O ensaio clínico vai começar, no terceiro trimestre deste ano, no Hospital de São João com cerca de 40 a 50 doentes. A equipa vai comparar a experiência de reabilitação com exercícios com o comportamento de placebos (ambientes relaxantes) também em UCI. O responsável acredita que a solução poderá ser adaptada para reabilitação cognitiva fora das UCI.
O projeto nasceu com a identificação de uma necessidade clínica, por parte de profissionais de saúde, que se juntaram a profissionais da área da tecnologia para resolver o problema. “Havia uma lacuna de cuidados de reabilitação em cuidados intensivos. Talvez originada por falta de recursos humanos ou por falta de investimento em recursos humanos nesta área, havendo ainda falta de awareness para este problema”, explicou. Com esta solução, um profissional de fisioterapia pode trabalhar com vários pacientes em simultâneo.
Os doentes internados em UCI, gravemente doentes e acamados muitas semanas, perdem massa corporal, deixando de conseguir realizar tarefas básicas como caminhar. Por outro lado, na vertente cognitiva registam-se perdas associadas ao ambiente ruidoso das UCI e às substâncias utilizadas para induzir o coma. João Coimbra cita estudos internacionais que mostram que as pessoas que passam por UCI têm quebras de rendimento de capacidades de 40 a 50%. Casos há em que não voltam a trabalhar e outros em que voltam a trabalhar em funções abaixo do rendimento anterior. “São perdas enormes para a sociedade no seu todo e um impacto enorme na vida da pessoas”.
A VR4ICU permitirá ajudar a ultrapassar as limitações físicas e cognitivas. Na dimensão física foram criados exercícios especialmente concebidos para estes doentes, ligados a máquinas e entubados com uma grande limitação na amplitude de movimentos. Na parte cognitiva a solução inclui um algoritmo e um teste neuropsicológico. O algoritmo contribuiu para o desenvolvimentos de jogos (de memória, para funções específicas, para o dia-a-dia) que visam prevenir a perda de faculdades básicas, como ir ao multibanco ou preparar algo na cozinha.
Neste momento a VR4ICU está em desenvolvimento há seis meses/um ano, tendo já recebido financiamento de investigação. A seguir ao ensaio clínico no Hospital de São João, pretendem entrar num projeto de aceleração com o objetivo de criar uma startup, com fins comerciais, para generalizar a tecnologia.
A solução envolve óculos de realidade virtual com comando e um desktop para controlo de segurança e um dashboard para dar feedback de desempenho. A aplicação corre dentro do sistema do próprio hospital.
Não obstante os benefícios específicos, as vantagens para os utilizadores, serviço nacional de saúde, hospitais têm muito em comum. “Quanto mais cedo reabilitarmos as pessoas e mais eficazmente, mais cedo têm alta e mais rápido voltam às suas atividades produtivas. Tudo o que está relacionado com a reabilitação acaba por ter impacto não só no sistema de saúde, mas também nas áreas de segurança social e de impostos”. João Coimbra assinala ainda as melhorias no funcionamento da reabilitação, permitindo aos profissionais tratar de mais pacientes e com mais eficácia.
ROSE: Ecografias à distância democratizam o acesso ao exame
O ROSE (RObot Sensing for tele-Ecography) foi desenvolvido para o mercado da telemedicina e permitiu, pela primeira vez, a realização de ecografias à distância em ambiente real, através da tecnologia robótica. O sistema está em desenvolvimento há mais de uma década.
O projeto envolve o Instituto Pedro Nunes, a Universidade de Coimbra, a empresa Sensing Future Technologies e a Luz Saúde, no apoio ao processo de validação, testes e implementação em ambiente real. A solução permite aos médicos especializados fazer ecografias à distância assistidos por tecnologia robótica, explicou António Cunha, diretor executivo do Instituto Pedro Nunes.
O diagnóstico por tele-ecografia é um novo paradigma, permitindo a médicos especializados e utentes interagir sem necessidade de proximidade física. As ecografias são exames complexos impossível de automatizar, obrigando sempre à presença de um médico. O sistema é composto por duas estações ergonómicas robotizadas, uma do lado do médico e outra do lado do utente (localizada, por exemplo, num centro de saúde ou num hospital com falta de médicos especialistas em ecografias), possibilitando a transmissão visual, áudio e háptica (um sistema que permite manobrar algo à distância sentido a força que se está a aplicar no outro lado) do exame.
As estações têm um conjunto de sondas ecográficas, um sistema de base de dados de utentes e estruturas de comunicações seguras asseguradas por redes 5G. Por questões de segurança, mecanicamente o robô não tem força para aleijar o paciente.
Além de evitar a deslocação de utentes não urgentes aos hospitais, permite também o acesso a este tipo de diagnósticos em zonas remotas, onde não é possível ter radiologistas em permanência. “Este exame está muito dependente do profissional e há hospitais que não têm estes médicos especializados disponíveis 24 horas por dia, sendo também difíceis de encontrar”, enquadrou.
A tecnologia de tele-ecografia é da responsabilidade do grupo de investigação sobre robótica médica liderado pelo professor Rui Cortesão, no Instituto de Sistemas e Robótica da Universidade de Coimbra (ISR-UC). O grupo de investigação tem vindo a ter acesso a algum tipo de financiamento ao longo do desenvolvimento.
Neste momento, apresentados os resultados da investigação, o instituto Pedro Nunes fez uma avaliação do mercado, uma validação de necessidades e da ideia junto dos especialistas, nasceu o projeto de investigação aplicada ROSE, que está atualmente em processo de validação e certificação para se poder começar a comercialização. Queremos provar que o conceito funcione e esperamos que os primeiros clientes venham a ser instituições privadas.
A tecnologia 5G abre uma nova frente para o desenvolvimento da solução. “Podemos andar numa carrinha móvel para fazer o diagnóstico. Afinal não existe fibra ótica em todo o lado”, concluiu.
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