BRANDS' ECO Construção imobiliária: “Falta oferta porque parámos de construir”

  • BRANDS' ECO
  • 29 Setembro 2023

Em entrevista ao ECO, António Carlos Rodrigues, CEO do Grupo Casais, apresenta os maiores desafios que o setor da habitação tem colocado ao negócio da construção e apresenta as soluções do grupo.

O tema da habitação tem vindo a ganhar cada vez mais relevância, principalmente no último ano, devido aos elevados preços das rendas e empréstimos com juros elevados que, consequentemente, têm contribuído para a decisão tardia ou, até, adiada, de comprar ou construir casa.

De forma a responder às necessidades do mercado, o Grupo Casais, com presença em 17 países e um dos maiores no setor da construção em Portugal, tem desenvolvido soluções para este problema, que podem ajudar a implementar medidas que contribuem para um equilíbrio do mercado imobiliário e que apostam na construção sustentável.

Há quase um mês, a empresa de construção apresentou a conclusão da primeira fase de um projeto de habitação a custos controlados, promovido pelo Governo de Gibraltar, onde foram aplicados métodos construtivos e soluções que fazem deste projeto um case study.

Em entrevista ao ECO, António Carlos Rodrigues, CEO do Grupo Casais, revela mais detalhes sobre esse projeto, explica de que forma a crise na habitação tem impactado o setor, e, ainda, apresenta as soluções que o Grupo Casais tem vindo a desenvolver neste âmbito.

Veja, abaixo, a entrevista.

O Grupo Casais atua diretamente na construção e em empreitadas. Apesar da crise na habitação, é comum ouvir-se dizer que a procura por este tipo de serviço é grande e que, muitas vezes, a oferta é escassa. Por que isto acontece?

A lacuna que existe no setor da construção vem de trás. Está relacionada com uma falta de atenção ao setor nos últimos 10 anos, que provocou uma degradação nas instituições, com uma degradação das condições que afastam os profissionais dos organismos públicos; na paragem na melhoria dos normativos técnicos e leis relacionados com a fileira; no impacto nos licenciamentos, que demoraram demasiado tempo; na degradação da capacidade das empresas do setor no período de 2008 a 2017; na degradação da atratividade dos profissionais para este setor (desde a Engenharia Civil até aos profissionais da Construção Civil).

Nunca devemos deixar degradar o funcionamento de um setor, mas quando ele se degrada, é preciso criar antecipadamente condições para repor essa capacidade. Neste momento, falta oferta porque paramos de construir. Constrói-se menos porque o mercado não tem confiança. As regras mudam todos os anos e ninguém quer passar pelas dificuldades da época anterior.

Não podemos esquecer que, durante o período de 2008 – 2014, em que estivemos mergulhados numa crise, foi delapidada a capacidade instalada com o fecho de empresas de construção sem precedentes. As empresas de construção responderam atempadamente ao desafio lançado ao setor e as Agendas Mobilizadoras propostas surgiram como um sinal de esperança para as empresas portuguesas. O objetivo era permitir uma transição eficiente para um mundo cada vez mais digital e sustentável. No entanto, quatro de cinco dessas agendas foram rejeitadas e, com isso, também atrasamos o processo de criação de capacidade e competência nas empresas do setor.

Portugal podia desfrutar ainda dos frutos da União Europeia, com o seu Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), se as nossas empresas de construção e engenharia, pilares da economia nacional, fossem mais valorizadas no seu papel de transformação de capital em ativo que fica para sempre.

Sem transição digital, sem capacitação, não há crescimento. As nossas entidades públicas têm de apoiar o desenvolvimento e a competitividade das empresas portuguesas, não pode haver um desprezo pelo potencial nacional. Se queremos uma economia forte, temos que começar por apostar em casa. Por isso, é imprescindível que as obras do PRR sejam o instrumento de capacitação ao mesmo tempo que, depois de concretizadas, ficam as infraestruturas para servir a sociedade por muitos mais anos.

De que forma o Grupo Casais tem sido afetado pela crise na habitação?

A atividade empresarial do Grupo Casais não foi diretamente impactada por esta crise na habitação. No entanto, sentimo-la diariamente. Temos mais de 5500 trabalhadores, dos quais quase 2000 estão em Portugal, onde nascemos há 65 anos. Os nossos colaboradores são parte da nossa sociedade e, por isso, sentem os efeitos desta crise. Além disso, esta realidade é clara e bastante visível. Todos conhecemos histórias de pessoas com rendas muito elevadas ou que se deparam com a falta de oferta de habitação condigna e com a subida das prestações dos créditos à habitação. E não podemos esquecer, enquanto sociedade, que esta crise penaliza, sobretudo, quem menos tem.

António Carlos Rodrigues, CEO do Grupo Casais.
Quais são as soluções que a empresa oferece que podem responder às necessidades do mercado imobiliário?

Apesar do nosso projeto de construção industrial sustentável não ter sido valorizado, nós continuamos a fazer o nosso trabalho e desenvolvemos soluções de habitação sustentável muito mais eficientes em todos os aspetos. O nosso modelo de construção, híbrido, juntando betão e madeiras, permite uma construção sólida, mas mais célere. Portugal atravessa uma crise de habitação e a habitação é uma área muito importante para nós. Acreditamos que, com este modelo, podemos contribuir para minimizar os efeitos desta crise. Para isso, contamos com a sociedade, com as autarquias e com o tecido empresarial para perceberem este modelo – como outros países já fazem – e as suas potencialidades. A mobilização das pessoas e do mercado é o driver que precisamos para continuar o nosso trabalho. O Governo tem é de continuar a criar as condições para isto ser uma realidade.

Há quase 1 mês, concluíram um projeto de habitação a custos controlados, promovido pelo Governo de Gibraltar. Qual foi a necessidade que levou o Grupo Casais a desenvolver este projeto?

Respondemos ao desafio do Governo de Gibraltar depois de já o termos feito num projeto similar de 500 habitações na mesma região. Neste caso, tratava-se de um projeto muito desafiante, com a construção de seis torres, a mais alta com 35 pisos. Um grande desafio em termos de competência e capacidade que, felizmente, foi superado com a entrega da primeira fase com as primeiras 380 habitações de um total de 665.

Em que consiste esta ideia? Pode falar-nos mais sobre ela?

A ideia é simples: o Governo entendeu que faltava habitação em Gibraltar e lançou vários projetos da mesma natureza. Criou condições financeiras e lançou os concursos em conceção-construção. O Grupo Casais recebeu o projeto em Stage 2 (equivalente ao nível de desenvolvimento de um projeto de licenciamento) e deu continuidade ao desenvolvimento do projeto a partir do Stage 3 (equivalente ao projeto de execução) em regime de conceção/construção.

Este processo foi sempre acompanhado pelo consultor ARUP como Cat 3 Checker, uma responsabilidade atribuída a um consultor especialista, que é responsável por verificar o design de elementos complexos ou de alto risco do projeto. O papel de Cat 3 Checker é onde é necessário um exercício considerável de julgamento de engenharia por alguém que não esteve envolvido no design inicial e que tem as qualificações e experiência adequadas para realizar a verificação. Em Portugal, perdemos muito tempo na discussão da possibilidade de usar a conceção-construção na habitação. Se esta já fosse uma prática aceite há mais anos, o mercado estaria de certeza mais capacitado para responder ao desafio agora imposto.

O que espera que aconteça ao mercado imobiliário português no futuro?

A falta de mão-de-obra qualificada vai continuar a provocar uma inflação dos custos de construção. As alterações legislativas nos processos de licenciamento podem trazer benefícios, mas ainda falta a revisão de muitos normativos técnicos, o que demora alguns anos até estar concluído. Os benefícios da conjugação das duas coisas – das alterações de legislação e da revisão dos normativos técnicos – vão demorar algum tempo a produzir efeitos. Por isso, mesmo que não seja para este ciclo, pelo menos é importante que o processo não pare porque a necessidade de habitação vai continuar a existir e as modificações agora em curso são importantes. Ainda que pelo meio existam ineficiências e insuficiências, é importante que não se perca o foco, porque para quem executa existe sempre aprendizagem e os erros que se venham a cometer não podem ser usados para parar o processo, mas antes para o melhorar e aprimorar.

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

Construção imobiliária: “Falta oferta porque parámos de construir”

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião