FMI alerta para subida do risco de crédito de empresas e famílias
O efeito da política monetária restritiva dos bancos centrais não se resume a um controlo da inflação, mas também na subida dos níveis de incumprimento de empresas e famílias, alerta o FMI.
A concertada política monetária promovida por muitos bancos centrais no último ano, marcada pela subida mais repentina e mais forte das taxas de juro em décadas, está a ter resultados. Como era pretendido pelo Banco Central Europeu e pelos seus pares, a taxa de inflação tem vindo a abrandar para níveis longe dos máximos históricos.
Todavia, os efeitos desta política monetária fortemente agressiva e restritiva por parte dos bancos centrais ainda não foram totalmente descontados na economia e tão pouco no bolso das empresas e das famílias, particularmente se as taxas de juro se mantiverem elevadas por mais tempo do que era esperado.
“A maioria das economias está a absorver esta política agressiva de aperto, mostrando resiliência ao longo do último ano, mas a inflação subjacente permanece elevada em várias delas, especialmente nos EUA e em partes da Europa. Por conseguinte, os principais bancos centrais poderão ter de manter as taxas de juro mais elevadas durante mais tempo”, escreve Tobias Adrian, conselheiro financeiro e diretor do departamento de Mercados Monetários e de Capitais do FMI, no relatório “Estabilidade Financeira Global”, publicado esta segunda-feira.
Esta realidade leva a que a instituição liderada por Kristalina Georgieva alerte para o crescente risco de crédito por parte de empresas e particulares nos próximos meses, como resultado do elevado nível das taxas de juro, que pressionará ainda mais a capacidade de empresas e famílias de pagarem as prestações dos seus empréstimos bancários.
“Tornar a dívida mais cara é uma consequência pretendida do endurecimento da política monetária para conter a inflação”, recorda Tobias Adrian, lembrando que este risco é ainda maior no caso dos titulares de créditos que já hoje enfrentam uma situação de aperto financeiro.
O FMI antecipa que novos aumentos das taxas de juro, ou a “mera” manutenção das taxas em níveis elevados por muito tempo, provocarão uma “amplificação das fragilidades” de empresas e particulares atualmente em dificuldades financeiras. Mas não só. Os analistas do FMI alertam para um cenário marcado por um aumento do número de incumprimentos e até de falências na economia global.
O relatório do FMI revela, inclusive, uma percentagem crescente de pequenas e médias empresas, tanto nas economias avançadas como nas economias de mercado emergentes, “que mal têm dinheiro para pagar as suas despesas com juros.”
Além disso, o Fundo destaca também que o nível de incumprimento está a aumentar entre os créditos alavancados. Esta situação é particularmente preocupante por este ser um mercado “onde as empresas financeiramente mais fracas contraem empréstimos”, destaca o FMI.
No entanto, o Fundo refere que “é provável que estes problemas se agravem no próximo ano”, com o vencimento de mais de 5,5 biliões de euros de obrigações e empréstimos por parte das empresas no próximo ano, e mais de nove biliões de euros em 2024 e 2025.
Entre as famílias, o cenário de um agravamento futuro da condição financeira dos agregados familiares é também salientado pelo FMI, como resultado da constante redução dos recursos das famílias nos últimos meses.
“As poupanças das famílias nas economias avançadas têm vindo a diminuir de forma constante desde os níveis máximos registados no início do ano passado, que equivaliam a 4% a 8% do PIB”, refere Tobias Adrian, sublinhando alguns sinais relativos à evolução do aumento do incumprimento no crédito automóvel e na dívida com cartões de crédito.
Além disso, é também notório o efeito da subida das taxas de juro no mercado da habitação — o principal ativo da maioria das famílias –, que tem provocado uma erosão da liquidez do orçamento das famílias, mas também das suas poupanças, para fazer frente à subida do custo do crédito à habitação.
Para o FMI, os países com créditos à habitação predominantemente indexados à taxa variável registaram, em geral, maiores descidas dos preços das casas, “uma vez que taxas de juro mais elevadas se traduzem mais rapidamente em dificuldades de pagamento dos créditos.”
Independentemente desta situação ter tendência a agravar-se no futuro, os dados mais recentes da OCDE mostram que Portugal tem sido uma exceção nesta matéria. Apesar de quase 90% dos créditos à habitação estarem indexados à taxa variável, Portugal é o terceiro país da Zona Euro com a maior subida do preço das casas em 2023, apresentando uma dinâmica totalmente em contraciclo com o resto dos países europeus.
Face a um cenário de forte incerteza e indefinição, o relatório do FMI salienta a necessidade de os bancos centrais manterem-se “determinados em trazer a inflação de volta ao seu objetivo” porque, segundo os analistas do Fundo, só com estabilidade dos preços é possível alcançar crescimento económico sustentado e estabilidade financeira
“Se a estabilidade financeira estiver ameaçada, os decisores políticos devem utilizar prontamente as facilidades de apoio à liquidez e outros instrumentos para mitigar a tensão e restaurar a confiança do mercado”, reforça Tobias Adrian.
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