Pingo Doce avança em tribunal contra associação de consumidores que já entregou 61 ações populares
Empresa da Jerónimo Martins interpõe providência cautelar para travar “atentados ao seu bom nome e reputação” por parte da Citizens’ Voice, que já “condenou” a Vodafone e levou gasolineiras à justiça.
“Em defesa da honra e reputação”, o Pingo Doce apresentou uma providência cautelar contra a associação Citizens’ Voice e contra os seus dirigentes, que têm denunciado “comportamentos ilícitos” e avançado com várias ações populares contra a cadeia do grupo Jerónimo Martins. O objetivo desta ação em tribunal, confirma ao ECO fonte oficial da retalhista, é “pôr termo à acusação que esta associação faz em permanência no seu site, da prática pela empresa de crimes contra os [seus] clientes e consumidores”.
“O Pingo Doce respeita integralmente a liberdade de expressão que a todos assiste numa sociedade democrática, o que não colide com o seu direito de recorrer aos tribunais quando entenda que, sob a capa da liberdade de expressão, se praticam de modo ilícito e injustificado verdadeiros atentados ao seu bom nome e reputação, como é o caso”, reage a empresa, acrescentando que “respeita os tribunais e, porque está convicta de que lhe assiste integral razão, aguarda com serenidade a decisão” que a justiça portuguesa vier a proferir sobre a providência.
Confirmamos ter sido obrigados a propor, em defesa da nossa honra e reputação, uma providência cautelar contra a associação denominada Citizens’ Voice e seus dirigentes. Está em causa pôr termo à acusação que faz em permanência no seu site, da prática pela nossa empresa de crimes contra os nossos clientes e consumidores.
Os conteúdos visados nesta ação são aqueles que a Citizens’ Voice tem colocado na página do Facebook relativamente à marca Pingo Doce, assim como as publicações feitas no portal online desta organização, onde publicita as ações populares que, neste caso, denunciam “discrepâncias gritantes” entre o preço anunciado nas prateleiras e o efetivamente cobrado nas caixas em perto de 100 produtos, sobretudo alimentares.
Já entregou 61 ações coletivas e diz ter outras 22 em preparação. Com base no diferencial que alega ter encontrado em dezenas de lojas, o pedido global de indemnização supera os 200 milhões de euros.
Em declarações ao ECO, Octávio Viana, o presidente desta organização criada em 2021 e que funciona como “satélite” de uma associação de defesa dos investidores (ATM) fundada em 1998, resume que “o Pingo Doce pretende que se esconda a existência dessas ações públicas”.
“As ações populares são publicadas e a citação dos titulares dos interesses em causa, no caso os consumidores lesados, é feita por anúncio nos jornais ou fixação de editais por ordem do tribunal – pois o intuito é os interessados conhecerem os seus direitos e efeitos, nomeadamente do direito de autoexclusão”, ressalva.
Segundo esta entidade sediada em Vila Nova de Gaia, que apresentou a oposição ao procedimento cautelar menos de 24 horas após ser citada e que se queixa de uma “tentativa de silenciamento” e da imposição de “uma Lei da Rolha”, o Pingo Doce alega que as publicações lhe causaram um prejuízo de um milhão de euros e pede que a associação e os seus dirigentes sejam condenados a uma pena pecuniária compulsória de cinco mil euros por dia caso as publicações não sejam retiradas.
Octávio Viana, que se apresenta como consultor financeiro e contabiliza que a Citizens’ Voice tem atualmente 18 colaboradores e “mais de 1.500 associados portugueses”, assinala ainda ao ECO que “se algum dia uma providência deste género fosse concedida, seria o fim da democracia e da liberdade de expressão – cujo recurso teria de ser o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos”.
As informações que o Pingo Doce quer proibir são objetivas, lícitas, verdadeiras e completas sobre ações populares publicadas pela nossa organização. Trata-se de conteúdo puramente informativo com o objetivo de educar os consumidores sobre os seus direitos, especificamente no que se refere a ações coletivas.
“As informações que o Pingo Doce quer proibir são objetivas, lícitas, verdadeiras e completas sobre ações populares publicadas pela nossa organização. Trata-se de conteúdo puramente informativo com o objetivo de educar os consumidores sobre os seus direitos, especificamente no que se refere a ações coletivas. Não existe discurso de ódio, desinformação ou qualquer outro conteúdo que vá contra as melhores diretrizes quanto à liberdade de expressão e informação”, conclui.
A ação popular mais emblemática da Citizens’ Voice envolveu a Vodafone Portugal, com um acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, com data de 2 de fevereiro de 2022, a obrigar a operadora de telecomunicações a restituir aos clientes os pagamentos que lhes tenham sido cobrados na sequência da ativação automática de serviços adicionais não solicitados. A revista Sábado noticiou que uma cliente de Coimbra foi a primeira – e a única, até ao final de julho – a executar a empresa no âmbito deste processo e a ser restituída dos valores exigidos em tribunal: recebeu 3.328,94 euros.
Já este ano, e depois de a ASAE – Autoridade de Segurança Alimentar e Económica ter decidido instaurar processos-crime contra gasolineiras por cobrarem impostos a mais, sete comercializadores de várias zonas do país foram levados a tribunal por alegados crimes de especulação.
Os processos – a decorrer em tribunais cíveis – incluem bombas com insígnias da Prio, Intermarché, Galp, Alves Bandeira e BP, e envolvem situações em que os contadores não começaram no zero, em que o valor do ISP foi adulterado e ainda publicidade enganosa.
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